Nailor Proveta: três álbuns preciosos de um virtuose da música instrumental brasileira
Marcadores: choro, edson josé alves, instrumental, jazz, k-ximbinho, lea freire, Mauricio Carrilho, nailor proveta, pedro paes, pixinguinha, Teco Cardoso | author: Carlos CaladoO apelido Proveta, que virou nome artístico, surgiu durante a adolescência de Nailor Azevedo, nos anos 1970. O então precoce clarinetista e saxofonista, paulista da interiorana Leme, era chamado de “bebê de proveta” pelos colegas da capital, que já o consideravam um prodígio.
Diferentemente de tantos jovens talentos que se perdem pelo caminho, Proveta superou as melhores expectativas. Muito requisitado nos meios da música instrumental e da MPB, tornou-se compositor, arranjador e líder da conceituada Banda Mantiqueira. Eclético, também transita com facilidade pelo jazz e pela música clássica.
Quem conhece seu belíssimo álbum “Tocando para o Interior”, de 2007, vai logo notar que, em “Coreto no Leme” (lançamento independente), ele rebobina novamente imagens e sons de sua infância, resgatando a atmosfera dos coretos interioranos.
A sonoridade do Quarteto de Cordas Ensemble SP, presente na maioria das faixas desse disco, é essencial para traduzir a eclética concepção musical que Proveta exercita há décadas, em sua carreira. Para ele, a plenitude da música só pode ser apreciada quando se supera a limitadora divisão em gêneros, que separa o clássico do popular.
O repertório, quase todo composto pelo clarinetista, soa como uma coleção de emoções e sentimentos: a alegria da “Polca de Coreto”; a nostalgia do choro-habanera “De Manhã, Lembranças”; o romantismo da valsa “Ypê do Cerrado” (composição de Edson José Alves); a admiração revelada pela “Suíte Encontros”, na qual o clarinetista dialoga com as influências de Debussy, Pixinguinha, Ernesto Nazareth e Chiquinha Gonzaga, entre outras.
A concisa discografia solo de Proveta acaba de ganhar mais dois títulos. O álbum “Velhos Companheiros de K-Ximbinho” (lançamento Maritaca) exibe inovadoras releituras de composições do cultuado clarinetista e saxofonista potiguar Sebastião “K-Ximbinho” de Barros (1917-1980).
Contando com participações de alguns craques da cena instrumental, com destaque para os flautistas Teco Cardoso (que assina a direção musical) e Lea Freire (responsável pela produção), esse trabalho deixa Proveta à vontade para exibir todo seu virtuosismo como solista.
Choros com contagiante sabor de gafieira, como “Velhos Companheiros” e “Sempre”, chamam atenção no repertório desse álbum, mas é em choros mais emotivos, de andamento lento, que Proveta se supera nos improvisos. Tratadas como baladas jazzísticas, as releituras de “Eu Quero É Sossego” e “Ternura” são simplesmente de arrepiar.
Já em “Brasileiro Saxofone - vol 2” (lançamento Acari), Proveta leva adiante a proposta do álbum lançado em 2009, no qual esboçou a trajetória do sax na música brasileira do século 20. Desta vez o repertório é mais contemporâneo ainda: o próprio Proveta e o saxofonista Pedro Paes – autor do belo choro “Mensageiro”, que abre o disco – compuseram a maioria das faixas.
Num projeto como este, dedicado ao saxofone, a trilogia composta por Proveta com o violonista Mauricio Carrilho, seu frequente parceiro, ganha um significado especial. Os choros “Meu Sax Sumiu”, “Meu Sax Voltou” e “Meu Sax Sorriu” nasceram a partir do verídico episódio do roubo e do resgate do instrumento favorito de Proveta. Um incidente triste que gerou choros radiantes.
(Resenha publicada no "Guia Folha - Livros, Discos, Filmes, edição de 30/4/2016)
Notas para turistas: voos da Copa Airlines permitem chegar a New Orleans via Panamá
Marcadores: Copa Airlines, jazz fest, louis armstrong, new orleans, New Orleans Convention and Visitors Bureau | author: Carlos Calado
Estátua de Louis Armstrong e mural, no aeroporto de New Orleans - Photo: Wally Gobetz
Já estive muitas vezes na cidade de New Orleans, na Louisiana, quase sempre para acompanhar o Jazz & Heritage Festival –- um dos melhores e maiores eventos musicais do mundo, que a população local chama apenas de Jazz Fest. Para chegar lá, já viajei por diversas companhias aéreas brasileiras ou norte-americanas, sempre fazendo conexão em alguma cidade dos estados da Flórida ou do Texas, já que não existe um voo direto de São Paulo para New Orleans.
Encarar as longas filas do setor de emigração, especialmente quando se desembarca em Dallas ou Houston, é um dos raros momentos desagradáveis, às vezes tensos, dessa viagem. Pela atitude de alguns oficiais um tanto mal humorados, já cheguei a pensar que eles prefeririam que ninguém entrasse em seu país, nem mesmo os turistas que estavam ali apenas para ouvir música e se divertirem, como eu.
Minha chegada nos Estados Unidos foi diferente, neste ano. Pela primeira vez passei pelo setor de imigração do próprio Aeroporto Internacional Louis Armstrong, em New Orleans. “Ah, você é do Brasil? De onde? São Paulo?”, foi logo perguntando o oficial. Depois de conferir meu passaporte e de mais algumas perguntas, ele disse que eu era bem vindo e desejou que eu me divertisse no Jazz Fest. Nada mais agradável para alguém chegando aos EUA do que ser recebido com a simpatia típica dos moradores de New Orleans.
Essa mudança de rotina se deve ao fato de eu ter viajado pela Copa Airlines, pela primeira vez. Desde o ano passado essa companhia panamenha está oferecendo voos para New Orleans -– partindo de várias cidades brasileiras, como São Paulo, Rio, Brasília, Belo Horizonte e Porto Alegre –- com escala na Cidade do Panamá. Outro detalhe interessante a considerar: os preços dos bilhetes da Copa Airlines costumam sair mais em conta do que os das companhias norte-americanas.
(Viagem realizada a convite do New Orleans Convention and Visitors Bureau, da Copa Airlines e do Bourbon Street Music Club)
Já estive muitas vezes na cidade de New Orleans, na Louisiana, quase sempre para acompanhar o Jazz & Heritage Festival –- um dos melhores e maiores eventos musicais do mundo, que a população local chama apenas de Jazz Fest. Para chegar lá, já viajei por diversas companhias aéreas brasileiras ou norte-americanas, sempre fazendo conexão em alguma cidade dos estados da Flórida ou do Texas, já que não existe um voo direto de São Paulo para New Orleans.
Encarar as longas filas do setor de emigração, especialmente quando se desembarca em Dallas ou Houston, é um dos raros momentos desagradáveis, às vezes tensos, dessa viagem. Pela atitude de alguns oficiais um tanto mal humorados, já cheguei a pensar que eles prefeririam que ninguém entrasse em seu país, nem mesmo os turistas que estavam ali apenas para ouvir música e se divertirem, como eu.
Minha chegada nos Estados Unidos foi diferente, neste ano. Pela primeira vez passei pelo setor de imigração do próprio Aeroporto Internacional Louis Armstrong, em New Orleans. “Ah, você é do Brasil? De onde? São Paulo?”, foi logo perguntando o oficial. Depois de conferir meu passaporte e de mais algumas perguntas, ele disse que eu era bem vindo e desejou que eu me divertisse no Jazz Fest. Nada mais agradável para alguém chegando aos EUA do que ser recebido com a simpatia típica dos moradores de New Orleans.
Essa mudança de rotina se deve ao fato de eu ter viajado pela Copa Airlines, pela primeira vez. Desde o ano passado essa companhia panamenha está oferecendo voos para New Orleans -– partindo de várias cidades brasileiras, como São Paulo, Rio, Brasília, Belo Horizonte e Porto Alegre –- com escala na Cidade do Panamá. Outro detalhe interessante a considerar: os preços dos bilhetes da Copa Airlines costumam sair mais em conta do que os das companhias norte-americanas.
(Viagem realizada a convite do New Orleans Convention and Visitors Bureau, da Copa Airlines e do Bourbon Street Music Club)
Notas para turistas: em New Orleans, Ace Hotel oferece violão e pickup nos quartos
Marcadores: Ace Hotel, blues, dicas de turismo, jazz, jazz fest, Josephine Estelle, new orleans, onde se hospedar em Nova Orleans, Three Keys, viagem, Warehouse District | author: Carlos Calado
Interior de um quarto do Ace Hotel, em New Orleans - Photo: Simon Watson
Já imaginou entrar em um quarto de hotel e encontrar um violão Martin novinho, esperando ser afinado e tocado? Ou então se deparar com um pick-up Music Hall (também conhecido como toca-discos ou vitrola, dependendo da sua faixa etária -- na foto abaixo), sobre um rack recheado de discos de vinil de jazz e blues?
Essas foram algumas das boas surpresas ao me hospedar no recém-inaugurado Ace Hotel, em New Orleans, durante o primeiro final de semana do Jazz & Heritage Festival 2016. A agitação constante no hall de entrada e a afluência de público para a programação de estreia do Three Keys (um espaço no hotel planejado para apresentações de música ao vivo) mostraram que o Ace já caiu no gosto de seus frequentadores.
Instalado em um edifício art decó de nove andares construído em 1928 e agora totalmente reformado, onde funcionava uma importadora de móveis, o Ace Hotel fica na descolada área central de Warehouse District. Oferece 234 quartos decorados em estilo vintage, em tons de abacate, cinza e berinjela, além de bar, restaurante e uma piscina na cobertura, com uma bela vista para a cidade.
Com preços razoáveis, o restaurante Josephine Estelle, que também serve o café da manhã (não incluído nas diárias do hotel), combina pratos da culinária italiana com toques da cozinha do sul dos Estados Unidos, assinados pelos chefs Andy Ticer e Michael Hudman.
Para quem se hospeda no Ace Hotel durante o New Orleans Jazz Fest, as vantagens de se ficar fora da disputada área turística do French Quarter são várias: preços de diárias mais em conta, menos barulho nas redondezas e maior facilidade para acessar outras área da cidade, já que as ruas do French Quarter costumam ficar bem congestionadas durante os dias do festival.
(Viagem realizada a convite do New Orleans Convention and Visitors Bureau, da Copa Airlines e do Bourbon Street Music Club)
Já imaginou entrar em um quarto de hotel e encontrar um violão Martin novinho, esperando ser afinado e tocado? Ou então se deparar com um pick-up Music Hall (também conhecido como toca-discos ou vitrola, dependendo da sua faixa etária -- na foto abaixo), sobre um rack recheado de discos de vinil de jazz e blues?
Essas foram algumas das boas surpresas ao me hospedar no recém-inaugurado Ace Hotel, em New Orleans, durante o primeiro final de semana do Jazz & Heritage Festival 2016. A agitação constante no hall de entrada e a afluência de público para a programação de estreia do Three Keys (um espaço no hotel planejado para apresentações de música ao vivo) mostraram que o Ace já caiu no gosto de seus frequentadores.
Instalado em um edifício art decó de nove andares construído em 1928 e agora totalmente reformado, onde funcionava uma importadora de móveis, o Ace Hotel fica na descolada área central de Warehouse District. Oferece 234 quartos decorados em estilo vintage, em tons de abacate, cinza e berinjela, além de bar, restaurante e uma piscina na cobertura, com uma bela vista para a cidade.
Com preços razoáveis, o restaurante Josephine Estelle, que também serve o café da manhã (não incluído nas diárias do hotel), combina pratos da culinária italiana com toques da cozinha do sul dos Estados Unidos, assinados pelos chefs Andy Ticer e Michael Hudman.
Para quem se hospeda no Ace Hotel durante o New Orleans Jazz Fest, as vantagens de se ficar fora da disputada área turística do French Quarter são várias: preços de diárias mais em conta, menos barulho nas redondezas e maior facilidade para acessar outras área da cidade, já que as ruas do French Quarter costumam ficar bem congestionadas durante os dias do festival.
(Viagem realizada a convite do New Orleans Convention and Visitors Bureau, da Copa Airlines e do Bourbon Street Music Club)
New Orleans Jazz & Heritage Festival 2016: Walter Wolfman toca no Brasil em maio
Marcadores: b.b. king, blues, Bourbon Festival Paraty, funk, joe krown, roadmasters, russell batiste, soul, walter wolfman washington | author: Carlos Calado
O cantor e guitarrista Walter Wolfman Washington
Um dos artistas que melhor representam a eclética cena musical de Nova Orleans virá ao Brasil em maio. O guitarrista e cantor Walter “Wolfman” Washington, 72, vai se apresentar em São Paulo (dia 19, no clube Bourbon Street), além de ser uma das atrações do Bourbon Festival Paraty (dia 21, no litoral fluminense).
Não foi à toa que, alguns anos atrás, a prefeitura de Nova Orleans instituiu o Dia Walter Wolfman Washington, que é comemorado em 30 de abril. Ele toca há décadas, regularmente, no alternativo Maple Leaf Bar, sempre aplaudido por plateias bem jovens. Em seus shows e discos exibe uma irresistível mistura de blues, funk e soul.
Foi o que se viu e ouviu também na apresentação de Washington, no New Orleans Jazz & Heritage Festival, no último final de semana. Ao lado de outros dois craques com os quais toca habitualmente, o organista Joe Krown e o baterista Russell Batiste, ele excitou a plateia da tenda de blues com seus vocais e improvisos carregados de suingue.
Também fez jus a seu codinome “Wolfman” (homem-lobo). Já quase ao final do show, Washington ergueu a guitarra e a tocou com os dentes, para o delírio dos fãs, como se estivesse destroçando o instrumento.
Em entrevista à Folha, o guitarrista diz que sua facilidade para transitar por vários gêneros da música negra tem tudo a ver com o ambiente de sua cidade natal. Se não tivesse nascido e crescido em Nova Orleans, provavelmente, sua música não seria a mesma.
“Já estive em muitos lugares do mundo e sei que Nova Orleans tem um ambiente, um espírito musical diferente. Aqui os músicos se comunicam de uma maneira mais intensa, até porque quase todos se conhecem”, comenta Washington.
Citando o “rei do blues” B.B. King (1925-2015), como músico que adotou como modelo durante sua formação musical, Washington diz que o blues se confunde com sua própria vida.
“O blues reflete as atribulações que enfrentamos. Para ser um músico de blues, você precisa encontrar uma maneira própria de explicar como se sente frente às dificuldades da vida”, comenta. “Dizem por aí que eu toco rhythm & blues [uma derivação mais pop e dançante desse gênero musical], mas eu me considero, antes de tudo, um músico de blues”.
Washington avisa que trará sua banda, The Roadmasters, que também o acompanhou ao Brasil em 2014, quando se apresentaram no Bourbon Street Fest, em São Paulo. “É sempre muito confortável estar com eles. Já tocamos juntos há mais de 20 anos”, conclui o guitarrista.
(Viagem realizada a convite do New Orleans Convention and Visitors Bureau, da Copa Airlines e do Bourbon Street Music Club. Texto publicado na "Folha de S.Paulo", em 27.04.2016)
Não foi à toa que, alguns anos atrás, a prefeitura de Nova Orleans instituiu o Dia Walter Wolfman Washington, que é comemorado em 30 de abril. Ele toca há décadas, regularmente, no alternativo Maple Leaf Bar, sempre aplaudido por plateias bem jovens. Em seus shows e discos exibe uma irresistível mistura de blues, funk e soul.
Foi o que se viu e ouviu também na apresentação de Washington, no New Orleans Jazz & Heritage Festival, no último final de semana. Ao lado de outros dois craques com os quais toca habitualmente, o organista Joe Krown e o baterista Russell Batiste, ele excitou a plateia da tenda de blues com seus vocais e improvisos carregados de suingue.
Também fez jus a seu codinome “Wolfman” (homem-lobo). Já quase ao final do show, Washington ergueu a guitarra e a tocou com os dentes, para o delírio dos fãs, como se estivesse destroçando o instrumento.
Em entrevista à Folha, o guitarrista diz que sua facilidade para transitar por vários gêneros da música negra tem tudo a ver com o ambiente de sua cidade natal. Se não tivesse nascido e crescido em Nova Orleans, provavelmente, sua música não seria a mesma.
“Já estive em muitos lugares do mundo e sei que Nova Orleans tem um ambiente, um espírito musical diferente. Aqui os músicos se comunicam de uma maneira mais intensa, até porque quase todos se conhecem”, comenta Washington.
Citando o “rei do blues” B.B. King (1925-2015), como músico que adotou como modelo durante sua formação musical, Washington diz que o blues se confunde com sua própria vida.
“O blues reflete as atribulações que enfrentamos. Para ser um músico de blues, você precisa encontrar uma maneira própria de explicar como se sente frente às dificuldades da vida”, comenta. “Dizem por aí que eu toco rhythm & blues [uma derivação mais pop e dançante desse gênero musical], mas eu me considero, antes de tudo, um músico de blues”.
Washington avisa que trará sua banda, The Roadmasters, que também o acompanhou ao Brasil em 2014, quando se apresentaram no Bourbon Street Fest, em São Paulo. “É sempre muito confortável estar com eles. Já tocamos juntos há mais de 20 anos”, conclui o guitarrista.
(Viagem realizada a convite do New Orleans Convention and Visitors Bureau, da Copa Airlines e do Bourbon Street Music Club. Texto publicado na "Folha de S.Paulo", em 27.04.2016)
New Orleans Jazz & Heritage Festival 2016: artistas homenagearam Prince
Marcadores: geri allen, Herbie Hancock, jack dejohnnette, Janelle Monáe, jazz, john mayall, Kermit Ruffins, Prince, ravi coltrane, Russell Malone, sharon jones, steely dan, wayne shorter | author: Carlos CaladoA repercussão da morte do cantor Prince marcou o primeiro final de semana do 47.º Jazz & Heritage Festival, em Nova Orleans. Bem ao estilo dessa cosmopolita cidade norte-americana, conhecida pelos funerais animados por bandas de rua, fãs homenagearam seu ídolo sem lágrimas, dançando e cantando sua música.
Foi assim na tarde do último sábado, durante os minutos que antecederam a apresentação do soulman Maxwell, no palco dedicado a atrações da black music. Um DJ tocou sucessos de Prince, como “Kiss” e “When Doves Cry”, festejados por boa parte da plateia.
Sharon Jones e Janelle Monáe, cantoras que chegaram a trabalhar com Prince, também o homenagearam durante seus shows no festival. Até mesmo músicos locais de outros gêneros, como o trompetista Kermit Ruffins e a banda de rock Gov`t Mule, renderam tributos ao cantor.
Diferentemente do ano passado, quando temporais alagaram o hipódromo onde é realizado o Jazz Fest, o sol brilhou durante todo o final de semana – tempo perfeito para um evento ao ar livre, com shows simultâneos em 12 palcos, que chegam a receber até 100 mil pessoas por dia.
Atração principal da sexta-feira no palco dedicado à música pop, a veterana banda Steely Dan conquistou uma multidão de fãs de várias gerações com uma seleção de hits, como “Aja”, “Pretzel Logic” e “Black Friday”, todos com arranjos sofisticados e pinceladas jazzísticas.
Mas nem esses clássicos da dupla Donald Fagen & Walter Becker, nem os dançantes covers de James Brown e Jackson Five interpretados por Janelle Monáe, chegaram perto do impacto causado pelo show da carismática Sharon Jones, na Tenda Blues.
Lutando contra um câncer desde 2013, ela fez uma apresentação furiosa, cantando e dançando como se estivesse fazendo o último show de sua vida. Já ao se despedir, demonstrou confiança: “Tchau, Nova Orleans. Daqui a alguns anos a gente se vê de novo”.
Mais uma vez com uma programação repetitiva, a Tenda Jazz apresentou ao menos um ótimo concerto por dia. Na sexta, a pianista Geri Allen releu composições de Errol Garner, com o brilhante guitarrista Russell Malone a seu lado
No sábado, o baterista Jack DeJohnnette (na foto acima) exibiu seu novo trio com o saxofonista Ravi Coltrane e o baixista Matt Garrison, filhos de lendários jazzistas. Finalmente, o pianista Herbie Hancock e o saxofonista Wayne Shorter hipnotizaram a superlotada plateia com seus solos viajandões, no domingo.
Anunciado só na véspera para encerrar os shows de domingo, na Tenda Blues, o britânico John Mayall (na foto à direita) surpreendeu muitos que ainda não o conheciam. Aos 82 anos, esse influente blueseiro ainda canta e toca guitarra, gaita e piano com uma vitalidade impressionante.
(Viajei a convite do New Orleans Convention and Visitors Bureau, da Copa Airlines e do Bourbon Street Music Club)
Atração principal da sexta-feira no palco dedicado à música pop, a veterana banda Steely Dan conquistou uma multidão de fãs de várias gerações com uma seleção de hits, como “Aja”, “Pretzel Logic” e “Black Friday”, todos com arranjos sofisticados e pinceladas jazzísticas.
Mas nem esses clássicos da dupla Donald Fagen & Walter Becker, nem os dançantes covers de James Brown e Jackson Five interpretados por Janelle Monáe, chegaram perto do impacto causado pelo show da carismática Sharon Jones, na Tenda Blues.
Lutando contra um câncer desde 2013, ela fez uma apresentação furiosa, cantando e dançando como se estivesse fazendo o último show de sua vida. Já ao se despedir, demonstrou confiança: “Tchau, Nova Orleans. Daqui a alguns anos a gente se vê de novo”.
Mais uma vez com uma programação repetitiva, a Tenda Jazz apresentou ao menos um ótimo concerto por dia. Na sexta, a pianista Geri Allen releu composições de Errol Garner, com o brilhante guitarrista Russell Malone a seu lado
No sábado, o baterista Jack DeJohnnette (na foto acima) exibiu seu novo trio com o saxofonista Ravi Coltrane e o baixista Matt Garrison, filhos de lendários jazzistas. Finalmente, o pianista Herbie Hancock e o saxofonista Wayne Shorter hipnotizaram a superlotada plateia com seus solos viajandões, no domingo.
Anunciado só na véspera para encerrar os shows de domingo, na Tenda Blues, o britânico John Mayall (na foto à direita) surpreendeu muitos que ainda não o conheciam. Aos 82 anos, esse influente blueseiro ainda canta e toca guitarra, gaita e piano com uma vitalidade impressionante.
(Viajei a convite do New Orleans Convention and Visitors Bureau, da Copa Airlines e do Bourbon Street Music Club)
Sonora Brasil: projeto do Sesc leva música do Brasil profundo a 114 cidades
Marcadores: Aboiadores de Valente, aboios, Ailton Aboiador, Ailton Jr., canções de trabalho, Cantadeiras do Sisal, Fernando Deghi, Guerra Peixe, ivan vilela, Marcus Ferrer, sesc, Sonora Brasil, violas brasileiras | author: Carlos Calado
As Cantadeiras do Sisal e os Aboiadores de Valente, no projeto Sonora Brasil
Você sairia de casa para ver uma apresentação de violeiros e cantadores de cidadezinhas do interior sobre os quais jamais ouviu falar? Se você não for fã de música sertaneja ou folclórica, é provável que a resposta seja negativa, assim como a de muita gente. Em geral, as pessoas costumam ir a shows de artistas que já conhecem, esperando ouvir canções de sucesso.
Esse hábito adquirido tem muito a ver com o funcionamento e a estratégia comercial do mercado da música. Apenas alguns artistas são “eleitos” pelas gravadoras, rádios e TVs. À margem desse grande esquema comercial resta uma infinidade de manifestações musicais, especialmente aquelas que não se enquadram nos padrões e modismos definidos pela indústria e veiculados pela mídia.
Na contramão dessa rotina limitadora e injusta do mercado musical, o Sesc (Serviço Social do Comércio) realiza há 18 anos, por meio de seu Departamento Nacional, o Sonora Brasil. Maior projeto de circulação musical pelo país, esse evento vai atingir 114 cidades de todas as regiões brasileiras, num total de 418 apresentações durante este ano.
A intenção maior é formar plateias para manifestações musicais que sobrevivem à margem do mercado. Desde 1998, o projeto já realizou cerca de 4.900 apresentações por todo o país, em cidades de médio porte, atingindo mais de 520 mil espectadores.
Diferentemente do que se vê na indústria musical, o Sonora Brasil não encara a música como produto comercial ou mero entretenimento. Dois temas são trabalhados por um período de dois anos –- Cantos de Trabalho e Violas Brasileiras foram os temas escolhidos para a atual edição –- no sentido de criar uma relação mais profunda entre o público e as obras dos artistas e grupos escolhidos para circularem pelo país.
Com essa intenção, é distribuído à plateia um livreto que vai além da função de programa dos concertos. Ele traz um texto analítico de um especialista, para que o espectador possa se aprofundar naquele universo musical. Por sinal, esses livretos são muito bem editados e impressos, com o alto padrão de qualidade que já se espera dos projetos do Sesc.
Revelando o Brasil profundo
Pelas reações da plateia durante a noite de abertura da nova temporada do Sonora Brasil – anteontem, no Teatro Margarida Schivasappa, em Belém (PA) – já se pode antecipar que os concertos deste ano devem emocionar muita gente pelo país.
Os violeiros Fernando Deghi (paulista de Santo André) e o carioca Marcus Ferrer abriram a noite demonstrando, por meio de obras de Guerra Peixe e Ivan Vilela, além de algumas composições próprias, que a viola caipira já conquistou seu merecido espaço nas salas de concerto, antes reservadas apenas à chamada música erudita.
Em seguida, Ailton Aboiador e seu filho Ailton Jr. (ambos da região de Valente, no nordeste da Bahia) divertiram o público com suas toadas e aboios (cantos que ajudam a conduzir o gado), como “Não Quis Estudar”, que aborda o cotidiano de um boiadeiro. Também arrancaram gargalhadas ao se lançarem em um desafio improvisado.
Da mesma região do nordeste baiano, as seis artesãs do grupo Cantadeiras do Sisal encantaram a plateia, antes de tudo, pela simplicidade de suas danças e cantigas, criadas espontaneamente para acompanhar seu artesanato, como “O Tanquinho É Bom” e “Trabalhava no Motor”.
Aliás, a simplicidade desse concerto –- sem cenário ou adereços -– contribuiu para que a plateia se concentrasse nas belas melodias dos violeiros e nos versos emotivos dos aboiadores e cantadeiras. Não à toa os concertos do projeto Sonora Brasil são essencialmente acústicos: não há microfones, nem caixas acústicas no palco. Sem mediações tecnológicas, as vozes e os instrumentos desses representantes do Brasil profundo soam ainda mais verdadeiras e reveladoras.
Mais informações no portal do Sesc: http://www.sesc.com.br/portal/cultura/musica/sonora_brasil/
(Viajei a Belém, para a estreia da nova temporada do Sonora Brasil, a convite do Sesc)
Você sairia de casa para ver uma apresentação de violeiros e cantadores de cidadezinhas do interior sobre os quais jamais ouviu falar? Se você não for fã de música sertaneja ou folclórica, é provável que a resposta seja negativa, assim como a de muita gente. Em geral, as pessoas costumam ir a shows de artistas que já conhecem, esperando ouvir canções de sucesso.
Esse hábito adquirido tem muito a ver com o funcionamento e a estratégia comercial do mercado da música. Apenas alguns artistas são “eleitos” pelas gravadoras, rádios e TVs. À margem desse grande esquema comercial resta uma infinidade de manifestações musicais, especialmente aquelas que não se enquadram nos padrões e modismos definidos pela indústria e veiculados pela mídia.
Na contramão dessa rotina limitadora e injusta do mercado musical, o Sesc (Serviço Social do Comércio) realiza há 18 anos, por meio de seu Departamento Nacional, o Sonora Brasil. Maior projeto de circulação musical pelo país, esse evento vai atingir 114 cidades de todas as regiões brasileiras, num total de 418 apresentações durante este ano.
A intenção maior é formar plateias para manifestações musicais que sobrevivem à margem do mercado. Desde 1998, o projeto já realizou cerca de 4.900 apresentações por todo o país, em cidades de médio porte, atingindo mais de 520 mil espectadores.
Diferentemente do que se vê na indústria musical, o Sonora Brasil não encara a música como produto comercial ou mero entretenimento. Dois temas são trabalhados por um período de dois anos –- Cantos de Trabalho e Violas Brasileiras foram os temas escolhidos para a atual edição –- no sentido de criar uma relação mais profunda entre o público e as obras dos artistas e grupos escolhidos para circularem pelo país.
Com essa intenção, é distribuído à plateia um livreto que vai além da função de programa dos concertos. Ele traz um texto analítico de um especialista, para que o espectador possa se aprofundar naquele universo musical. Por sinal, esses livretos são muito bem editados e impressos, com o alto padrão de qualidade que já se espera dos projetos do Sesc.
Revelando o Brasil profundo
Pelas reações da plateia durante a noite de abertura da nova temporada do Sonora Brasil – anteontem, no Teatro Margarida Schivasappa, em Belém (PA) – já se pode antecipar que os concertos deste ano devem emocionar muita gente pelo país.
Os violeiros Fernando Deghi (paulista de Santo André) e o carioca Marcus Ferrer abriram a noite demonstrando, por meio de obras de Guerra Peixe e Ivan Vilela, além de algumas composições próprias, que a viola caipira já conquistou seu merecido espaço nas salas de concerto, antes reservadas apenas à chamada música erudita.
Em seguida, Ailton Aboiador e seu filho Ailton Jr. (ambos da região de Valente, no nordeste da Bahia) divertiram o público com suas toadas e aboios (cantos que ajudam a conduzir o gado), como “Não Quis Estudar”, que aborda o cotidiano de um boiadeiro. Também arrancaram gargalhadas ao se lançarem em um desafio improvisado.
Da mesma região do nordeste baiano, as seis artesãs do grupo Cantadeiras do Sisal encantaram a plateia, antes de tudo, pela simplicidade de suas danças e cantigas, criadas espontaneamente para acompanhar seu artesanato, como “O Tanquinho É Bom” e “Trabalhava no Motor”.
Aliás, a simplicidade desse concerto –- sem cenário ou adereços -– contribuiu para que a plateia se concentrasse nas belas melodias dos violeiros e nos versos emotivos dos aboiadores e cantadeiras. Não à toa os concertos do projeto Sonora Brasil são essencialmente acústicos: não há microfones, nem caixas acústicas no palco. Sem mediações tecnológicas, as vozes e os instrumentos desses representantes do Brasil profundo soam ainda mais verdadeiras e reveladoras.
Mais informações no portal do Sesc: http://www.sesc.com.br/portal/cultura/musica/sonora_brasil/
(Viajei a Belém, para a estreia da nova temporada do Sonora Brasil, a convite do Sesc)
Luiz Tatit: compositor revela novas musas e personagens em 'Palavras e Sonhos'
Marcadores: dante ozzetti, jonas tatit, juçara marçal, lenna bahule, luiz tatit, marcelo jeneci, ná ozzetti, rumo, vanessa bumagny, vanguarda paulista, zé miguel wisnik | author: Carlos CaladoSó um compositor diverso dos padrões convencionais concluiria seu disco contando como cria as canções. É o que faz Luiz Tatit em “Palavras e Sonhos” (lançamento Dabliú), a canção que empresta o título a seu novo álbum, o sexto individual. “Uso palavras picadas no som /Palavras magoadas de tantas paixões /Palavras idiotas e alguns palavrões”, entoa o cancionista paulistano, detalhando nos versos essa receita pessoal, com o humor e a simplicidade que o identificam.
Trata-se de um tema recorrente na obra desse músico incomum. Líder do grupo Rumo, expoente da chamada vanguarda paulista, na virada dos anos 1970 para os 1980, Tatit revelou por meio de suas canções o conceito do “canto falado”. Além das aulas que ministra na Universidade de São Paulo, paralelamente à carreira artística, ele continua a desenvolver pesquisas na área da semiótica da canção, que já renderam vários livros.
A temática da criação também está presente em “Mais Útil”, canção em troteado ritmo country que abre o disco. Como em outras de suas composições, Tatit inventou personagens pitorescas para tratar da inspiração: a negativa Palmira (“Quando sofre é de mentira / Mas adora suspirar”) e a entusiasmada Elvira (“Quando sofre ela se vira /Seu costume é se inspirar”).
Outros saborosos perfis femininos são delineados em canções do álbum. Em “Diva Silva Reis” (“Muito positiva /Mas só quando quer /Viva Diva Silva /Que mulher!”), num divertido flerte com o brega, o arranjo de sopros cria uma passarela sonora para que a diva idealizada por Tatit possa desfilar pelos versos.
Em “Das Flores e das Dores” (parceria com Emerson Leal), não é apenas uma, mas dez as divas retratadas nos versos sintéticos – quase todas com nomes de flores. Já na sentimental “Estrela Cruel” (“Vem vendaval /Vem cascavel /Faz desse mal /Fonte de mel”), o cantor e pianista Marcelo Jeneci, outro parceiro de Tatit, divide com ele os vocais.
Ainda que seja cantada no masculino pelo próprio Tatit, a letra da canção “Do Meu Jeito” (parceria com Vanessa Bumagny) parece discorrer sobre inseguranças e contradições típicas das mulheres. Mas não falta nesse álbum ao menos um mítico personagem masculino: no descontraído foxtrote “Matusalém” (parceria com Arthur Nestrovski), Tatit imagina como é viver após os cem anos.
Outras canções retomam o tema da inspiração. Já gravada por Ná Ozzetti, a dançante “Musa da Música” (parceria de Tatit com Dante Ozzetti) conta com vocais de Juçara Marçal e da moçambicana Lenna Bahule. A queixosa “Musa Cruza” (“Cruza as coxas e aproveita /Minha musa é musa /Nunca satisfeita”) destaca o arranjo de cordas de Fabio Tagliaferri.
Intérprete essencial para a obra de Tatit desde os tempos do Rumo, Ná assume os vocais em “Planeta e Borboleta”, canção sensível sobre as angústias do cantar. O arranjo de Jonas Tatit (filho do compositor), que também assina a produção musical do álbum, combina violões, guitarra e efeitos eletrônicos.
Também já gravada antes pelo parceiro Zé Miguel Wisnik, “Tristeza do Zé” surge agora com a letra completa, com Tatit dividindo os vocais com Juçara Marçal. Melancolia e beleza, numa canção que envereda pelo universo caipira.
Ao ler o título de “Feitiço da Fila”, os fãs da primeira fase do grupo Rumo podem até imaginar uma resposta ao clássico samba “Feitiço da Vila”, de Noel Rosa. Não, o que se ouve é outra daquelas canções agridoces e reflexivas bem ao estilo de Tatit (“E eu entro na fila outra vez /Só por você /Que deixou o mundo /Melhor do que era /Vivo na fila de espera”). Para um paulistano, é irresistível a ironia desse trocadilho.
(Resenha publicada no "Guia Folha - Livros, Discos, Filmes", em 26/3/2016)
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