Jaques Morelenbaum: trio faz viagem sentimental pelo passado do samba

|


Muitos trios instrumentais brilharam na história da bossa nova e do samba-jazz, mas nenhum com a singular formação do CelloSambaTrio. Criado em 2004 pelo violoncelista e arranjador Jaques Morelenbaum, esse grupo, que destaca também o violão de Lula Galvão e a percussão de Rafael Barata, parece já ter nascido clássico.

No esperado álbum de estreia do trio, "Saudade do Futuro, Futuro da Saudade" (lançamento Mirante), 
o violoncelista carioca e seus parceiros fazem uma viagem sentimental pelo passado do samba: do gingado choro de Jacob do Bandolim, “Receita de Samba”, ao sestroso “Eu Vim da Bahia” (de Gilberto Gil), em versão calcada na gravação de João Gilberto, cujo “álbum branco” (lançado em 1973) inspirou a criação do próprio CelloSambaTrio.

Faixas autorais, como a lírica “Maracatuesday” (de Morelenbaum) ou o samba “Abaporu” (do violonista Lula Galvão), indicam que esse trio tem um futuro promissor à sua frente. 

(resenha publicada no "Guia Folha - Livros, Discos, Filmes", edição de 25/10/2014)





Mauro Senise: saxofonista ensaia parceria com a coreógrafa Deborah Colker

|

O vigésimo projeto autoral do saxofonista e flautista carioca Mauro Senise é, talvez, o mais ambicioso de sua carreira. Além de contar com composições e arranjos de músicos com os quais já se associou em outras épocas, como os pianistas Antonio Adolfo, Jota Moraes e Gilson Peranzzetta (seu parceiro mais constante), agora Senise ensaia também uma parceria de outro gênero: com a dança.

No DVD que acompanha o CD "Danças" (lançamento Biscoito Fino), três composições – a valsa “Garoto de POA” (de Jota Moraes), o sentimental “Choro dos Mestres” (Cristóvão Bastos) e a contemplativa “Harmonia das Esferas” (do pianista Gabriel Geszti) – foram coreografadas por Deborah Colker, que as dança em duo com o ator Chico Diaz. Evanescentes, as belas imagens em preto e branco têm a assinatura do cineasta Walter Carvalho. Uma experiência criativa que merece ser retomada.


(Resenha publicada no "Guia Folha - Livros, Discos, Filmes", edição de 25/10/2015)




Keith Jarrett e Charlie Haden: belezas e melancolia num encontro de despedida

|

                                                         O contrabaixista Charlie Haden e o pianista Keith Jarrett

A morte do contrabaixista norte-americano Charlie Haden, aos 76 anos, em julho deste ano, imprimiu um sentido melancólico ao título do álbum "Last Dance" (selo ECM, com distribuição no Brasil pela Borandá), lançado algumas semanas antes no mercado internacional. Será que Haden e o pianista Keith Jarrett, seu antigo parceiro, pressentiram no estúdio que se tratava de um derradeiro encontro de despedida?  
 
As nove faixas que compõem esse disco foram registradas, de fato, em 2007. Das mesmas sessões de gravação já havia sido extraído o álbum “Jasmine” (lançado em 2010), que marcara o reencontro desses inventivos jazzistas, depois de tocarem juntos durante os anos 1970, no quarteto e no quinteto liderados por Jarrett. 

 
Como em “Jasmine”, há algo de nostálgico na escolha do repertório, que reúne “standards” e clássicos do jazz. Temas evocativos, como “My Old Flame” (de Johnston e Coslow) ou “My Ship” (Kurt Weill e Ira Gershwin), permitem aos velhos amigos entabular um "bate-papo" musical sobre o passado comum.  

 
“Round Midnight”, obra-prima do pianista Thelonious Monk, começa com um improviso de Jarrett, como se a "conversa" fosse flagrada já em curso. Mas, para a satisfação do ouvinte, o pianista se curva à beleza da melodia original e encerra a gravação de maneira reverente.  

 
Composição de Gordon Jenkins que já fazia parte do disco anterior da dupla, a tristonha “Goodbye” encerra o álbum, em uma gravação alternativa, logo após a serena releitura de “Every Time We Say Goodbye” (de Cole Porter).  

 
“Quero afastar as pessoas da feiura e da tristeza que nos cerca diariamente e trazer música profunda e bela para o maior número possível de pessoas”, declarou Haden, em 2013, ao receber um prêmio Grammy, já afastado dos palcos e estúdios, vítima de poliomielite. Este seu testamento musical não poderia ser mais fiel à sua vontade. 


(Resenha publicada no "Guia Folha - Livros, Discos, Filmes", em 25/10/2014) 

 

©2009 Música de Alma Negra | Template Blue by TNB