Eliane Elias: em tributo a Chet Baker, pianista e cantora aproxima-o da bossa nova

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Depois de gravar um álbum mais focado na música pop (“Light My Fire”, de 2012), a pianista e cantora Eliane Elias retorna ao universo do jazz, onde começou a construir sua carreira, ainda nos anos 1980. No CD “I Thought About You - A Tribute to Chet Baker” (lançamento da gravadora Universal), a paulista radicada nos EUA visita o repertório do cultuado trompetista, cantor e expoente do cool jazz.
 
Difícil não comparar este projeto ao de Luciana Souza, paulistana radicada nos EUA, que também lançou um tributo a Baker, no ano passado. Diferentemente de Luciana, que recriou com personalidade a atmosfera melancólica das gravações de Chet em seus últimos anos, Eliane parece ter se inspirado mais na fase inicial desse jazzista.

Suas versões para “Just Friends” e “That Old Feeling” soam leves, quase solares. A releitura de “This Can’t Be Love” resulta em jazz dançante à moda de Nat King Cole. Eliane ainda toma a liberdade de interpretar “There Will Never Be Another You” e “Let’s Get Lost” em ritmo de bossa nova. A “brazilianista” Diana Krall que se cuide.

(resenha publicada no "Guia Folha - Livros, Discos, Filmes", em 29/06/2013)

Vitor Ramil: a beleza e a atualidade das canções do compositor gaúcho, em novas versões

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O título deste álbum duplo de Vitor Ramil vem de uma inspirada canção já gravada por ele, treze anos atrás. Com versos que fundem a noção de passado e futuro, “Foi no Mês que Vem” (lançamento do selo Satolep) sintetiza bem a atemporalidade desta coleção de 32 canções compostas pelo cantor e violonista gaúcho desde os anos 1980.

Quem ainda desconhece a discografia de Ramil - lembre-se que “Ramilonga” (1997) e “Tambong” (2000), especialmente, são itens essenciais em qualquer antologia da melhor MPB contemporânea – encontrará aqui uma irresistível introdução à sua obra. Mais ainda: não se trata de uma compilação de antigas gravações, mas sim de novas versões, várias delas em formato voz e violão, incluindo participações especiais de Milton Nascimento, Jorge Drexler, Fito Paez e Pedro Aznar, entre outros.

“O tempo das canções não é necessariamente o nosso”, comenta Ramil, com toda razão, ao referir-se a este projeto. Suas canções – algumas próximas dos vinte anos de idade, como “Não É Céu”, “Grama Verde” e “À Beça” – soam hoje tão atuais como, provavelmente, soarão daqui a décadas. 

(resenha publicada no "Guia Folha - Livros, Discos, Filmes", em 29/06/2013)

Etta James: grande intérprete do R&B, no festival de Montreux, em alta definição

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Impulsiva e desbocada, Etta James (1938-2012) foi uma das grandes intérpretes de rhythm & blues. Nas décadas de 1970 e 1980, seu vozeirão tonitruante e suas performances libidinosas faziam alguns cantores de rock parecerem tímidos seminaristas, mesmo no palco.

Registrado em alta definição, este show no Montreux Jazz Festival, em 1993, mostra Etta ainda em grande forma, cantando alguns de seus sucessos, como o atrevido blues “Come to Mama” e a pungente balada “I’d Rather Go Blind”. Porém, nem a inferior resolução de imagem impede que o material extra deste blu-ray roube a cena, com trechos de cinco apresentações anteriores da cantora, no mesmo festival.
 
Versões de dois clássicos do soul, “Drown in My Tears” (de Ray Charles) e “Respect Yourself” (dos Staple Singers), trazem Etta ainda com cara de menina travessa, em 1975, à frente de uma banda recheada de sopros. Já o pesado blues “Take to the Limit”, em 1978, é praticamente um slogan dessa cantora, em formato musical. Na vida e no palco, Etta James não aceitava limites

(resenha publicada no "Guia Folha - Livros, Discos, Filmes", em 29/6/2013)


3º BMW Jazz Festival: Pat Metheny traz banda de feras, mas ainda insiste nos robôs

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                         Pat Metheny, Chris Potter e Antônio Sanchez, no show do BMW Jazz Festival

Os fãs de Pat Metheny, que se assustaram ou até se decepcionaram ao ouvi-lo tocar com uma orquestra de instrumentos robotizados, no insólito álbum “The Orchestrion Project”, já podem ficar mais tranquilos. Na abertura do 3º BMW Jazz Festival, ontem, em São Paulo, o guitarrista norte-americano demonstrou que não enlouqueceu: voltou a tocar com músicos de verdade.

São eles Chris Potter (saxofones e clarone), Antonio Sanchez (bateria) e Ben Williams (baixo acústico). Aliás, excelentes instrumentistas e conceituadas feras do jazz, que Metheny apresentou à plateia do HSBC Brasil, enfaticamente, como “três dos melhores músicos do planeta”. Seria um disfarçado “mea culpa”?

Metheny abriu o show sozinho, na penumbra, extraindo da guitarra sintetizada timbres de cítara e harpa. Assim introduziu sua composição “Come and See”, cujo arranjo destaca a rara e grave sonoridade do clarone de Chris Potter, que, pouco depois, também fez seu sax soprano soar quase como um oboé.

Para tocar a bela “New Year”, Metheny trocou a guitarra pelo violão. Ao ouvi-la, quem se lembrou do lirismo e das sofisticadas harmonias do violonista e compositor mineiro Toninho Horta, um dos expoentes do Clube da Esquina, sabe que não se trata de mera coincidência – foi influência direta mesmo.

Relativamente generoso, entre um e outro de seus longos improvisos, o líder da Unity Band abriu espaço para solos de Potter, um assertivo e sanguíneo improvisador, ou de Sanchez, músico capaz de desenvolver criativos solos de bateria, recheados de nuances rítmicas e dinâmicas.

Porém, depois de cerca de 1h15 de música, veio a surpresa: o palco se iluminou, revelando alguns dos instrumentos robotizados que Metheny utilizou em suas gravações com a orquestra mecânica. Felizmente, a “ego trip” do norte-americano durou menos nesse show: apenas alguns minutos, incluindo a participação ativa de seus parceiros de carne e osso.

Não faltou também uma previsível homenagem à música brasileira, por meio de “Insensatez” (Tom Jobim e Vinicius de Moraes), em uma releitura bem livre e jazzística, sem, no entanto, a leveza que caracteriza a bossa nova.

Um bom show, que deixa uma dúvida: será que Metheny vai insistir e também levar seus gélidos robôs aos shows deste sábado, no clube Bourbon Street, ou domingo, no parque do Ibirapuera? Ou ele vai enfim perceber que lugar de robô é em filme de ficção científica?



(crítica publicada na versão eletrônica da "Folha de S. Paulo", em 7/06/2013)



Brad Mehldau: pianista toca com seu trio no 3º BMW Jazz Festival

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São raros os músicos que podem, como ele, combinar Cole Porter, Nirvana e Chico Buarque com influências clássicas de Mahler e Brahms, no repertório de seus concertos e discos. Destaque no 3º BMW Jazz Festival, que começa hoje, o pianista Brad Mehldau toca neste sábado, em São Paulo, e domingo, no Rio.

Em entrevista à "Folha de S. Paulo", ele diz que tocar com o baixista Larry Grenadier e o baterista Jeff Ballard – talentosos parceiros de seu trio, que já o acompanham por cerca de uma década – é “confortável como um velho suéter”.

“Mas sempre há desafios, e um dos maiores é conseguir manter algum frescor quando tocamos juntos. Para isso é preciso fazer um exercício mental e espiritual. É bom pensar que vamos tocar juntos pela primeira vez, recomeçar sob essa perspectiva”, comenta.

Outro antigo parceiro com o qual Mehldau voltou a tocar com frequência é o saxofonista Joshua Redman, que também vai se apresentar no BMW Festival (amanhã, em São Paulo, e sábado, no Rio) com o coletivo James Farm.

“É realmente um prazer trabalhar com Joshua”, diz Mehldau, que produziu “Walking Shadows”, o recém-lançado CD do saxofonista. “Ele queria gravar um álbum de baladas e eu o ajudei, fazendo dois arranjos de acordas e achando arranjadores para outras faixas”.

Mesmo tendo apreciado a experiência de produzir o disco de alguém que admira, Mehldau não vê aí uma futura vertente em sua carreira. “Gosto, embora seja um trabalho intenso. Talvez eu faça isso de novo, mas não imagino que possa me transformar no ‘Sr. Produtor’. É mais fácil fazer meus próprios discos”, diverte-se.

E como ele encara o futuro do disco? “Pouca gente com menos de 40 anos ainda compra discos – os mais jovens até acham estranha essa ideia. De quem é a culpa por essa situação, eu não sei. Mesmo assim, ainda há belos discos sendo feitos e oportunidades para músicos criativos”.

Fã assumido da música brasileira, Mehldau incluiu em seu álbum “Where Do You Start” (Nonesush, 2012), releituras de “Samba e Amor” (de Chico Buarque) e “Aquelas Coisas Todas” (Toninho Horta). Quando pode não perde a chance de conhecer outros compositores e intérpretes da chamada MPB.


“Ouvi Gal Costa, em Nova York, semanas atrás, e foi realmente especial. Ela cantou alguns de seus sucessos, alguns clássicos, e até tocou violão. Fantástica”, elogia o jazzista norte-americano.

(texto publicado na "Folha de S. Paulo", em 6/06/2013)


Festivais de jazz e blues: um circuito em expansão que incentiva o turismo no Brasil

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                       O guitarrista Lucky Peterson, no 11º Rio das Ostras Jazz & Blues Festival

Até a década de 1990, os brasileiros interessados em shows de jazz ou gêneros musicais afins, como blues, soul ou o r&b, tinham poucas opções. Se não pudessem viajar para os Estados Unidos ou para a Europa, onde centenas de festivais de música agitam o período do verão, tinham que se contentar com os raros eventos de jazz e blues realizados por aqui somente no eixo São Paulo-Rio.

Hoje, o cenário é bem diferente. A temporada de festivais desse gênero no país se estende por todo o ano, praticamente, e cobre quase todas as regiões brasileiras. Nos próximos meses, esse circuito destaca shows de músicos de renome na cena internacional, como Pat Metheny, Brad Mehldau, Cassandra Wilson, Esperanza Spalding, Trombone Shorty, Buddy Guy, James Cotton, Bob Mintzer, Stanley Jordan e Egberto Gismonti, entre outros.

“Os festivais de jazz estão proliferando pelo Brasil – alguns são mais ortodoxos, outros mais abertos. Não temos ainda um festival com o prestígio de um Montreux, de um North Sea ou do New Orleans Jazz Fest, mas estamos a caminho”, compara o produtor Edgard Radesca, que acaba de realizar a 5ª edição do Bourbon Festival Paraty. Com recorde de público nas três noites, o evento atraiu mais de 30 mil pessoas à cidade histórica do litoral fluminense. “Sem falsa modéstia, Paraty oferece todas as condições para um festival de prestígio internacional. Música de qualidade, num local paradisíaco, é uma combinação muito forte”.

Radesca já trabalha na preparação do 11º Bourbon Street Fest, com shows gratuitos em São Paulo, Brasília e no Rio, em agosto. “Recebemos solicitações para estendê-lo também a Salvador e Florianópolis, neste ano. Vamos aumentar as atrações dirigidas a plateias mais jovens, já que esta tem sido a tendência do nosso publico”, revela o produtor. No elenco, segundo ele, está confirmada a presença de Trombone Shorty, revelação da eclética cena musical de New Orleans (EUA), que hoje circula pelos principais festivais do mundo, assim como a banda Soul Rebels, que mistura funk, soul, r&b e rock.



                            A banda Soul Rebels, atração do 11º Bourbon Street Fest, em agosto

Outro festival que acaba de realizar sua 11ª edição, o Rio das Ostras Jazz & Blues, também no litoral fluminense, ofereceu cinco palcos, entrada franca e um elenco que não devia nada a festivais similares nos EUA, que destacou o baixista Stanley Clarke, o trompetista Christian Scott e os guitarristas Lucky Peterson, Vernon Reid e Scott Henderson, entre outros. “Muitos já admiram nosso festival lá fora. Confirmo isso pelos convites que recebo para palestras na Europa e nos EUA, e também pelos e-mails de empresários e músicos”, comenta o produtor Stenio Mattos, ressaltando que o evento tem crescido ano a ano.

“O mais importante é que o festival trouxe uma mudança de paradigma cultural: desenvolvimento turístico, novas escolas de música para a cidade, até em nível superior, e o envolvimento da população de Rio das Ostras com o projeto”, considera o produtor. Entre as novidades na estrutura da última edição, além de telões de última geração e um piso para evitar a lama provocada por chuvas eventuais, o evento contou com tendas que ofereciam aluguel de bicicletas para facilitar a locomoção entre os palcos espalhados pela cidade.

Até o final de julho, outros oito festivais serão realizados nas regiões Sudeste, Norte e Nordeste do país. O maior deles é o 3º BMW Jazz Festival, com shows em São Paulo (de 6 a 9/6) e Rio (de 8 a 10/6). Curador do evento, Zuza Homem de Mello destaca no elenco o trio do pianista Brad Mehldau e a big band da baixista e vocalista Esperanza Spalding, bem conhecidos entre os fãs do gênero no país, além do recém-criado quarteto James Farm, que inclui o saxofonista Joshua Redman.

“A atração para quem quer saber o que há de novo no jazz é o quinteto do baterista Jonathan Blake, que tem como surpresa o sax alto de Jaleel Shaw. Possivelmente será o grupo comentado pelos que estão atrás dos futuros ídolos do jazz”, observa Homem de Mello. Já o guitarrista Pat Metheny, artista de maior visibilidade nessa edição, receberá tratamento inédito em dezenas de festivais realizados pela Dueto Produções desde os anos 1980: noites exclusivas, cujos ingressos já estão esgotados. Para consolo dos que ficaram de fora, Metheny também fará um show gratuito ao ar livre, no dia 9/6 (domingo), às 17h, no parque do Ibirapuera, em São Paulo, além de outro pago, no Bourbon Street Music Club, na noite de 8/6 (sábado).


                          A cantora e baixista Esperanza Spalding, atração do BMW Jazz Festival, em junho

Pioneira na produção de festivais do gênero, Monique Gardenberg confirma a boa imagem do Brasil nessa área. “Acho que carregamos esse prestígio desde 1985, quando criamos com muita seriedade o Free Jazz Festival, para a Souza Cruz. Demos continuidade, em 2003, com a Tim, e agora, com a BMW, produzimos um festival dedicado exclusivamente ao jazz. Ao longo desses quase 30 anos estabelecemos uma relação de confiança com agentes de artistas do mundo inteiro”.

Logo após o BMW Jazz será realizada, em São Paulo, de 10 a 13/6, a primeira edição do Best of Blues Festival. O nome soa pretensioso, mas a programação desse evento inclui shows de quatro conceituados veteranos do gênero: os guitarristas norte-americanos Buddy Guy e Taj Mahal, o pianista e cantor Dr. John (de New Orleans), ou ainda o guitarrista e cantor britânico John Mayall. Outro destaque do evento é a primeira apresentação no país de Shemekia Copeland, ótima cantora de blues.

Com apenas um ano, o paulista Santos Jazz Festival (de 18 a 23/6) já revela crescimento na estrutura de sua segunda edição. “Teremos sete palcos contra três da edição anterior; seis dias de shows contra os quatro do ano passado”, compara Denise Borges, diretora executiva do evento, cujo programa destaca Egberto Gismonti, Banda Mantiqueira, o violonista Romero Lubambo, a cantora Leny Andrade e o trombonista Stafford Hunter.

Eventos já consagrados em várias edições, o 8º Festival Amazonas Jazz (de 23 a 28/7, em Manaus) e o 11º Savassi Festival (de 10 a 21/7, em Belo Horizonte) têm mais em comum do que o fato de estarem agendados para o mês de julho. Promovem atividades para aprimorar a formação dos músicos locais e privilegiam músicos conceituados que não aparecem com frequência em eventos do gênero. O festival amazonense contará neste ano com os saxofonistas americanos Bennie Maupin e Bob Mintzer, com o pianista português Mário Laginha e com o saxofonista cubano Felipe Lamoglia, entre outros.



Bruno Golgher, produtor do Savassi Festival, que prepara para setembro uma edição especial do evento em Nova York, considera que hoje os festivais brasileiros já recebem o mesmo tratamento que seus similares pelo mundo. “É impressionante como a música brasileira é respeitada, amada e tocada por músicos estrangeiros”, diz. Para efetivar essa primeira edição nova-iorquina, Golgher fechou parcerias com duas universidades locais, a Columbia e a New York. E já no próximo ano pretende trabalhar também com o Berklee College of Music.

“Hoje o Savassi Festival possui uma concepção artística ampla: partimos do jazz, tradicional ou não, e da música instrumental brasileira, mas trabalhamos nas interfaces com a música orquestral, com a música eletrônica, com o rock, o hip-hop, o choro e, a partir deste ano, com o folk”, explica o produtor, observando que, ao crescer, o festival viu seu cânone artístico se transformar. Entre os artistas já definidos para a próxima edição, destacam-se dois guitarristas dinamarqueses – Jacob Bro e Mikkel Ploug – escalados para colaborar com os músicos mineiros Anderson Noise e Pedro Durães.

A programação do 3º Jazz na Fábrica – festival produzido pelo Sesc Pompéia, em São Paulo – ainda não esta fechada, mas, segundo sua assessoria de imprensa, a próxima edição focalizará o jazz africano e o latino. Com um perfil musical que reflete a globalização desse gênero musical, o evento tem trazido atrações de diversos países e se estende por um mês – agosto, neste ano. As negociações para trazer a cantora norte-americana Cassandra Wilson, o pianista porto-riquenho Edsel Gomez e o trompetista franco-libanês Ibrahim Maalouf já estão em estágio avançado.


                      O trompetista Terence Blanchard, atração do Choro Jazz Festival, em dezembro

Com quatro edições realizadas na bela praia de Jericoacoara e em Fortaleza (CE), o Choro Jazz Festival também tem crescido, sem abrir mão de sua essência. “A educação musical está acima de tudo. É o que priorizo, cada vez mais, com oficinas ministradas por grandes mestres da música”, afirma o produtor Antonio Capucho, que criou a Escola Choro e Jazz Jericoacoara, em 2012. “Ela funciona durante todo o ano e é sustentada em parte pela produção do festival e pela boa vontade da comunidade”, explica. No elenco deste ano, já estão confirmados o saxofonista Terence Blanchard (na foto acima), o cantor João Bosco e a cavaquinhista Luciana Rabello.

Lançado na semana passada, com show do baixista Stanley Clarke, em Belo Horizonte, o 6º Vijazz & Blues Festival, que nasceu em Viçosa (MG), é sintomático do crescimento do circuito de festivais de jazz pelo país. “Esta edição será a maior de todas, com nossa expansão para as cidades de Ponte Nova, Juiz de Fora e Araxá. Também já temos convites para levar o circuito a outras cidades de Minas Gerais e dos estados de São Paulo e Rio”, comemora o produtor Sergio Lopes.


Programe-se com um roteiro dos principais festivais de jazz e blues, que serão realizados pelo país, nos próximos meses:
http://www.carloscalado.com.br/2013/01/festivais-em-2013-prepare-se-para.html

(versão integral da reportagem publicada no jornal “Valor Econômico”, em 5/06/2013)

11º Rio das Ostras Jazz & Blues Festival: Lucky Peterson fez plateia dançar e se divertir

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                                                                           O organista e bluesman Lucky Peterson

Diferentemente do ano passado, quando as chuvas prejudicaram grande parte dos shows do Rio das Ostras Jazz & Blues Festival,  o tempo colaborou.
Para saber que a 11ª edição desse evento (encerrada no último domingo) foi um sucesso, bastou ver a plateia ocupando as instalações da chamada Cidade do Jazz, em Costazul, com um grau de densidade jamais visto nos anos anteriores. Segundo a produção do evento, a média de público por noite teria chegado a 30 mil pessoas, no final de semana.

A noite mais longa e festiva foi a de sábado, encerrada já perto das 4h da madrugada, com a frenética apresentação de Lucky Peterson. Caricato, fazendo graça até com sua imensa barriga, o organista e guitarrista levou a plateia a dançar durante todo o show, especialmente quando recriou clássicos do rock’n’roll, do R&B e do funk, como “Johnny B. Goode” (de Chuck Berry), “Proud Mary” (de John Fogerty) e “It’s Your Thing” (dos Isley Brothers).

O ensandecido bluesman não deixou por menos: exigindo participação total da plateia, fez questão até de descer do palco, arrancando sorrisos e gritos com seus improvisos de guitarra, no meio do público. Quando já parecia prestes a sair de cena, entrou sua mulher, a simpática cantora Tamara Peterson, que o ajudou a conduzir o show-baile ainda por mais de uma hora.

Divertida também foi a apresentação da Victor Wooten Band (foto acima), que precedeu a de Peterson. Recebido como ídolo pela plateia de Rio das Ostras, que já conhecia seu virtuosismo, o baixista e compositor chegou a contar com outros três baixos em sua banda (numa edição do festival, vale ressaltar, que reuniu outros grandes contrabaixistas). Sua canção “My Life”, quase um blues, é uma pérola de humor e suíngue que mereceria ser gravada por outros intérpretes.


Pena que Wooten tenha reservado uma boa parte de seu set às caras e bocas de Krystal Peterson, cantora de ascendência pop que não timbra muito bem com sua música. Depois de fazer covers de Stevie Wonder (“Overjoyed”) e Michael Jackson (“I’ll Be There”), a lourinha – sabe-se lá por que razão – quase comprometeu o show ao interpretar a dramática “Somewhere”, canção do musical “West Side Story”.

Duas outras atrações do sábado não envolveram a totalidade da plateia. Virtuose da guitarra jazzística, com marcante influência do rock, Scott Henderson (na foto acima) abriu sua apresentação com uma versão bem roqueira de “All Blues” (de Miles Davis). Parecendo tocar apenas para si próprio, mesmo ao interpretar a sensível balada “Peace”, não abriu mão de sua pegada de rock, na linha de mestres dos anos 1960 e 1970, como Jimi Hendrix e Jimmy Page. Para os fanáticos por guitarra, no entanto, a performance de Henderson certamente soou como o clímax da noite.

Quem abriu o programa de sábado foi o Will Calhoun Ensemble, quarteto do ex-baterista da banda Living Colour, que tem a seu lado conceituados músicos do jazz contemporâneo: o saxofonista Donald Harrison, o pianista Marc Cary (ambos na foto acima) e o contrabaixista Charnet Moffett. Com momentos quase experimentais, a música de Calhoun mistura longos improvisos, muita percussão e timbres eletrônicos. Num elenco mais calcado no blues, como foi o desta edição, Calhoun e seus parceiros ganharam os aplausos mais eufóricos dos apreciadores do jazz.

(continua) 

Joshua Redman: músico retorna ao BMW Jazz Fest no coletivo James Farm

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             Joshua Redman, em show na recente edição do New Orleans Jazz & Heritage Fest, nos EUA

Dois anos atrás, o saxofonista e compositor norte-americano Joshua Redman protagonizou um shows mais aplaudidos da primeira edição do BMW Jazz Festival. Nesta semana, ele voltará a tocar nesse evento (dia 7, em São Paulo; dia 8, no Rio), desta vez como membro do quarteto James Farm.

“Toda experiência musical já é por si só diferente, mas James Farm é, sem dúvida, uma das bandas mais inspiradoras da qual já fiz parte”, disse o jazzista à "Folha de S. Paulo", por telefone dos EUA, destacando o fato de esse quarteto, que também destaca os talentosos Aaron Parks (piano), Matt Penman (baixo) e Eric Harland (bateria), funcionar como um coletivo – sem líder.


Segundo Redman, o caráter desse quarteto já era evidente quando estreou, em 2009. “Cada um dos integrantes dessa banda tem uma visão musical muito pessoal, assim como uma voz bem distinta como compositor, o que é muito importante. Por isso ela já nasceu como um coletivo”, argumenta.


“A música que tocamos com o James Farm é bem diversa da música que costumo tocar com meus outros grupos. Não se trata de dizer que ela seja melhor ou pior. É apenas diferente”, reflete, referindo-se ao fato de a estética musical do quarteto exibir marcantes influências das fusões do jazz com o rock, na década de 1970, ou do rock alternativo mais recente.


Redman aponta como um “estranho paradoxo no universo do jazz” o fato de muitos grupos ainda serem liderados por um determinado músico. “O jazz já nasceu como música de essência cooperativa. Sua natureza é mais democrática e coletiva. Talvez tenha sido o mundo dos negócios que criou a figura do músico líder e seus acompanhantes”. 


“Na história do jazz há grupos notáveis, como o Modern Jazz Quartet ou o Weather Report, que funcionavam como coletivos. Hoje, por exemplo, também há o Bad Plus, grupo que se organiza de modo coletivo há uns 10 anos”, aponta, mencionando o trio com o qual também tem se apresentado, eventualmente.


Já como solista, Redman lançou, em maio, o álbum “Walking Shadows” (selo Nonesuch), ainda inédito no Brasil. No repertório há baladas conhecidas pelos fãs do jazz e do pop, como “Stardust” (de Carmichael e Parish), “Lush Life” (Billy Strayhorn), “Let it Be” (Lennon e McCartney) e “Tears in Heaven” (Eric Clapton).


Para produzir esse álbum, que inclui arranjos de cordas em algumas faixas, Redman convidou o pianista Brad Mehldau, seu parceiro desde a década de 1990, que também vai se apresentar no BMW Jazz Festival.


“Nos últimos três anos, eu e Brad temos tocado bastante em duo. O álbum ‘Walking Shadows’ representa, de certo modo, a finalização desse período. Acho o máximo ter a chance de voltarmos a tocar juntos e não posso imaginar como seria fazer esse álbum sem ele. Brad foi uma voz muito importante no processo de realização desse disco”, reconhece o saxofonista. 


Agora uma péssima notícia para quem quer ouvir Joshua Redman e o James Farm, no BMW Jazz Festival, mas ainda não garantiu seus ingressos: já estão esgotados. 

(texto publicado originalmente na "Folha de S. Paulo", em 1/06/2013)




 

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