Dianne Reeves e Romero Lubambo: uma preciosa parceria musical de quase 20 anos

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                                                                      A cantora norte-americana Dianne Reeves 

Voz privilegiada, repertório eclético, elegância e uma grande habilidade para recriar canções ou improvisar. Essas são algumas das qualidades da cantora norte-americana Dianne Reeves, que figura desde a década de 1990 entre os principais interpretes vocais do universo do jazz. Os 16 álbuns lançados por ela, assim como os cinco prêmios Grammy que recebeu, dão uma ideia da amplitude de sua obra e do prestígio que desfruta nos meios musicais.

Nome familiar entre as plateias brasileiras, Dianne virá novamente ao país, desta vez para apresentações como convidada de Romero Lubambo –- conceituado violonista, guitarrista, compositor e arranjador carioca, que vive nos Estados Unidos desde os anos 1980. Eles vão se apresentar em duo, em São Paulo (dia 17/5, no clube Bourbon Street) e em Paraty, no litoral fluminense (dia 20/5, no Bourbon Festival).

“Romero e eu nos conhecemos quase 20 anos atrás e desde então não paramos mais de trabalhar juntos”, diz Dianne ao "Valor", falando por telefone de Denver, onde vive. “Hoje eu o chamo de meu irmão com outra mãe”, diverte-se, lembrando que o primeiro encontro com Lubambo se deu por ocasião de um concerto com César Camargo Mariano e Ivan Lins –- produzido pelo festival Heineken Concerts, em São Paulo, em 1997.

Antes desse show, Dianne já havia se apresentado em outro importante festival brasileiro do gênero: o Free Jazz, em 1992. “Lembro de ter ficado bastante impressionada com a receptividade das plateias, que nos aplaudiram de maneira muito calorosa”, comenta a norte-americana, que estreou em palcos de São Paulo e do Rio, acompanhada pela lendária Duke Ellington Orchestra.

Cantar no Brasil tinha um significado especial para ela, que já mantinha um namoro com a música brasileira desde o início da década de 1980, época em que fez parte do grupo de Sergio Mendes. Esse pianista e arranjador fluminense, que se radicou nos Estados Unidos em meio ao sucesso da bossa nova, nos anos 1960, desenvolve até hoje uma carreira internacional.

“Trabalhar com Sergio foi uma experiência muito enriquecedora”, relembra a cantora. “Quando fiz parte de seu grupo, ele não se preocupava apenas com o que iríamos tocar. Também fazia questão de me apresentar muita música brasileira, e essa era uma das coisas que eu mais gostava durante aquele período. Sergio sempre compartilhava seu conhecimento musical comigo. Graças a ele também vim a conhecer Dori Caymmi, com o qual já fiz vários trabalhos”.

Se você perguntar a Dianne se, ao escolher uma canção para seu repertório, valoriza mais a melodia ou a letra, verá que ela não vai pensar nem por um instante. “Gosto de uma boa melodia, mas as letras das canções têm um valor especial para mim. Como cantora, você tem a possibilidade de contar histórias. E eu gosto especialmente de letras que têm a ver comigo, que refletem o meu jeito de ser”, afirma.

Além dessa relação bem pessoal que mantém com o conteúdo das canções que interpreta, ela também costuma contar divertidos causos entre um número e outro de seus shows. “Venho de uma família cheia de contadores de histórias. Cresci ouvindo meus familiares narrarem muitos causos, isso também faz parte de minha maneira de ser”, diz a cantora, que tem parentesco com outros músicos de prestígio, como o tecladista George Duke (1946-2013), seu primo, ou o contrabaixista Charles Burrell, seu tio.

Entre as grandes cantoras de jazz que a influenciaram, como Ella Fitzgerald (1917-1996) e Billie Holiday (1915-1959), Dianne sempre teve uma favorita: a sofisticada Sarah Vaughan (1924-1990), grande intérprete à qual dedicou um álbum-tributo, “The Calling”, lançado em 2001. Mesmo assim, mais do que destacar a influência recebida de um ou outro artista em particular, ela aponta o eclético espírito dos anos 1970 como essencial para sua formação musical.

“Ninguém falava em ‘gênero’ naquela época. Tudo era simplesmente chamado de música, sem delimitações de fronteiras. Cresci ouvindo e amando vários tipos de música”, diz ela, referindo-se ao primo George Duke –- músico versátil que tocava jazz, funk, rock, música clássica, até música brasileira –- como o responsável por lhe dar a “licença” para experimentar tudo o que quisesse na música. “Ele me disse: ‘Se você gosta de cantar coisas diferentes, vá em frente. Isso é o que você é’ ”.

Dianne encontrou essa mesma abertura musical nas obras de outros expoentes do jazz dos anos 1970. “Muito antes que termos como ‘world music’ ou ‘sociedade global’ surgissem, Sarah Vaughan e Wayne Shorter foram conhecer a música do Brasil, assim como Dizzy Gillespie foi para Cuba ou John McLaughlin viajou para a Índia. A capacidade que alguns músicos têm de integrar suas sensibilidades à sensibilidade de outras culturas é uma das coisas que mais me atraem no universo do jazz”.  


Sobre os shows que fará com Dianne Reeves no Brasil, o violonista Romero Lubambo (na foto ao lado) comenta que, depois de quase duas décadas de parceria, o repertório da dupla é bastante amplo. “Eu e ela gostamos muito de sentir a energia do local, para então decidir o que vamos fazer. A plateia do Bourbon Street certamente será bem diferente do público do festival em Paraty”, compara.

Ainda assim, Romero revela alguns itens desse repertório, com grandes chances de entrarem nos shows: pérolas da canção norte-americana que muitos jazzistas já interpretaram, como “Love for Sale” (de Cole Porter) e “Love Is Here to Stay” (George & Ira Gershwin); ou ainda clássicos do jazz moderno, caso de “All Blues” (Miles Davis) e “Afro Blue” (Mongo Santamaria) –- todos eles em arranjos do próprio violonista.

Referindo-se ao parceiro como “um músico impecável”, Dianne justifica porque desde a gravação de seu álbum “Bridges”, lançado em 1999, convidou Romero para participar de todos seus discos posteriores. “Ele é extremamente intuitivo e tem muita facilidade para criar no calor da hora, o que eu também adoro fazer. Todas as vezes que tocamos juntos criamos algo diferente. Adoro trabalhar com Romero porque ele tem um espírito tão aberto quanto sua música”. 


(Texto publicado no caderno "Eu & Fim de Semana", do jornal "Valor", em 13/05/2016)

 

1 Comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

Não conhecia nem ela,nem ele.Muito bom.

 

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