O guitarrista Leo Nocentelli (à esq.) e o baixista Bill Dickens
Uma multidão atraída pelos shows de encerramento do Bourbon Street Fest, ontem, no Parque Ibirapuera, em São Paulo, presenciou um curioso fenômeno musical. Nada contra o rock, mas ficou parecendo que a presença da Honey Island Swamp Band, primeira banda do gênero nas 11 edições desse festival, “contaminou” o programa.
Em sua primeira apresentação por aqui, a banda de New Orleans – formada em 2006, na Califórnia, por músicos refugiados do furacão Katrina – fez um show com uma forte pegada de rock, na abertura da programação de ontem. Com direito até a um ventilador estrategicamente posicionado para levantar os cabelos longos do guitarrista Chris Mule (na foto abaixo).
Tocando canções próprias, com um leve tempero de ritmos típicos da Louisiana, Mule, o baixista Sam Price e o violonista Aaron Wilkinson logo conquistaram a plateia. Os três se divertiram: Price tirou os sapatos e fez fotos da plateia com seu celular durante o show; Mule e Wilkinson tocaram até deitados no palco.
Atração seguinte, o veterano guitarrista Leo Nocentelli – um dos criadores da The Meters, banda de New Orleans que entrou para a história como uma das pioneiras do funk da década de 1970 – não deixou a plateia esfriar. Oriundo da competitiva cena musical de sua cidade, comandou um show mais pesado e calcado no rock do que costuma fazer, contando com a colaboração do também conceituado baixista Bill “The Buddha” Dickens.
“Então vocês gostam de rock”, disse Nocentelli, provocando a plateia, pouco antes de anunciar “Cissy Strut”, um dos hits dos Meters, que ganhou uma releitura bem pesada, incluindo solos de guitarra e baixo. Não faltaram também a clássica “Fire on the Bayou” e a percussiva “Say Na Hey”, um dos hinos espontâneos do Mardi Gras, o carnaval de New Orleans.
A 11º edição do Bourbon Street Fest terminou com a The Soul Rebels (na foto ao lado), banda de metais em ascensão na cena mundial, que a cada ano tem mostrado em seus arranjos estar se aproximando mais e mais do funk e do hip hop. Oriundos de uma cidade com uma cultura musical tão rica e diversificada, como New Orleans, seus integrantes sabem que não podem se acomodar no cultivo da tradição. A música popular urbana precisa se transformar todos os dias, ao menos na superfície, mesmo que seja para manter sua essência.
11º Bourbon Street Fest: funk e rock de New Orleans disputam a plateia, no encerramento
Marcadores: bill dickens, blues, Bourbon Street Fest, honey island swamp band, jazz, leo nocentelli, soul, soul rebels, the meters | author: Carlos CaladoLeila Pinheiro e Nelson Faria: cantora e guitarrista em atmosfera intimista
Marcadores: billie holiday, chico buarque, djavan, guinga, jazz, johnny alf, Leila Pinheiro, marcos valle, MPB, nelson faria, tom jobim | author: Carlos CaladoUma das pérolas musicais de Johnny Alf (1929-2010), a bossa “Céu e Mar” empresta seu título a este elegante encontro da cantora Leila Pinheiro com o guitarrista Nelson Faria. Lançado pelo selo inglês Far Out Recordings, em 2012, o álbum chega só agora ao mercado brasileiro por meio da gravadora Biscoito Fino.
Duos de voz e guitarra que já se tornaram clássicos no universo do jazz, como o de Ella Fitzgerald & Joe Pass, inspiraram o projeto. Mesmo que o repertório do álbum seja essencialmente brasileiro, Leila e Faria assumem a influência jazzística, na descontraída versão de “That Old Devil Called Love”, do repertório de Billie Holiday.
A temática da separação amorosa está presente em quase todas as canções, assinadas por Tom Jobim, Chico Buarque, Guinga, Marcos Valle, Djavan e outros craques da MPB. A atmosfera intimista e os arranjos sintéticos permitem ao ouvinte mergulhar com mais intensidade nas imagens dos versos. Um disco que ilustra bem a máxima “menos é mais”.
(resenha publicada originalmente no "Guia Folha - Livros, Discos, Filmes", em 27/7/2013)
Cau Karam e à Deriva: violonista gaúcho e quarteto paulista em "conversas" criativas
Marcadores: À Deriva, cau karam, choro, instrumental, jazz, samba | author: Carlos Calado
Anos atrás, este encontro musical pareceria um tanto improvável. O que Cau Karam (ao centro, na foto), talentoso violonista e compositor gaúcho conhecido por sua intimidade com o choro e o samba, teria em comum com o À Deriva, inventivo quarteto instrumental paulista, que aposta na criação musical com o máximo de liberdade e sem se prender a gêneros definidos?
O fato é que a aproximação aconteceu, com a necessária abertura de ambos os lados, gerando assim uma criativa parceria musical e o álbum "De Senhores, Baronesas, Botos, Urubus, Cabritos e Ovelhas" (lançamento do selo à Deriva). Autor de seis das dez faixas do álbum, Karam gosta de batizá-las com títulos insólitos, como o do choro “O Hábito Estraga ‘Um Monte’” ou o do quebrado samba “Nem o Freud, Nem o Roberto Carlos”. “Bom Cabrito Não Berra” é, talvez, a faixa que melhor espelha o diálogo entre as diferentes concepções musicais de Karam e do À Deriva: a lírica melodia da flauta evolui para um ruidoso solo de sax tenor, como numa inusitada conversa entre Radamés Gnattali e Ornette Coleman.
(resenha publicada no "Guia Folha - Livros, Discos, Filmes", edição de 27/7/2013)
O fato é que a aproximação aconteceu, com a necessária abertura de ambos os lados, gerando assim uma criativa parceria musical e o álbum "De Senhores, Baronesas, Botos, Urubus, Cabritos e Ovelhas" (lançamento do selo à Deriva). Autor de seis das dez faixas do álbum, Karam gosta de batizá-las com títulos insólitos, como o do choro “O Hábito Estraga ‘Um Monte’” ou o do quebrado samba “Nem o Freud, Nem o Roberto Carlos”. “Bom Cabrito Não Berra” é, talvez, a faixa que melhor espelha o diálogo entre as diferentes concepções musicais de Karam e do À Deriva: a lírica melodia da flauta evolui para um ruidoso solo de sax tenor, como numa inusitada conversa entre Radamés Gnattali e Ornette Coleman.
(resenha publicada no "Guia Folha - Livros, Discos, Filmes", edição de 27/7/2013)
Vento em Madeira: quinteto paulistano voa mais alto, nas composições do CD "Brasiliana"
Marcadores: brasiliana, Edu Ribeiro, fernando de marco, instrumental, jazz, Léa Freire, Teco Cardoso, Tiago Costa, Vento em Madeira | author: Carlos Calado
É significativo ver um quinteto instrumental dedicado à
música brasileira, como o paulistano Vento em Madeira, lançar seu segundo álbum em apenas três
anos de existência. Claro que isso tem a ver com a boa repercussão do disco anterior
e com o fato de que o público para essa vertente musical rejuvenesceu e
cresceu. É também um sinal de que Edu Ribeiro (bateria), Fernando de Marco
(contrabaixo), Léa Freire (flautas), Teco Cardoso (saxofones e flautas) e Tiago
Costa (piano) têm muito prazer no que estão fazendo.
Como
as coloridas pipas que ilustram a capa e o encarte do álbum "Brasiliana" (lançamento do selo Maritaca), o quinteto está
voando mais e mais alto, nas composições e nas performances. A beleza e a
simplicidade de melodias como a de “Brasiliana” ou a da valsa “Angulosa”
convivem, nesse novo repertório do Vento em Madeira, com formas incomuns e desafios
rítmicos assumidos em inventivas composições, como “Felipe na Área”,
“Labirinto” ou “A Coisa Ficou Russa”. Música esvoaçante brasileira. (resenha publicada originalmente no "Guia Folha - Livros, Discos, Filmes", em 27/7/2013)
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