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Amaro Freitas: o jazz brasileiro do pianista que já conquistou plateias na Europa

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Para quem ainda não o conhecia, deve ter soado muito excitante e surpreendente a apresentação do trio do pianista Amaro Freitas, ontem (11/01), no teatro do Sesc Pompeia, em São Paulo. Até mesmo para aqueles que se tornaram fãs imediatos desse inventivo músico e compositor pernambucano, ao ouvi-lo em sua primeira aparição na capital paulista, em agosto de 2017 (aliás, no mesmo palco, como atração do festival Jazz na Fábrica), não faltaram surpresas nesse show.

Amaro chegou há pouco de sua primeira turnê pela Europa, finalizada em novembro com duas apresentações no lendário clube de jazz londrino Ronnie Scott’s. Os programas dessas noites já sugeriam que seu prestígio está em franca ascensão na cena mundial. Em ambas o brasileiro dividiu a noite com um grande pianista do jazz: o italiano Stefano Bollani e o cubano Chucho Valdés.

Acompanhado por Jean Elton (contrabaixo) e Hugo Medeiros (bateria), craques de seu trio com o qual toca desde 2015, Amaro está divulgando seu segundo álbum – lançado em CD e vinil pelo selo independente britânico Far Out, ainda sem edição brasileira anunciada. “Rasif” (cujo título remete à palavra árabe que deu origem ao nome de Recife, cidade natal de Amaro) é o sucessor do belo “Sangue Negro” (2016), álbum de estreia que o transformou em grande revelação do jazz.

Amaro abriu o show de ontem, sozinho, ao piano, tocando “Dona Eni”, um alucinado baião de sua autoria com inusitada divisão rítmica. “O baião é marcado em dois, mas eu dividi em oito e tirei uma perninha para ficar em sete”, explicou o compositor, sorrindo. Emendou com a percussiva “Trupé”, composição inspirada no coco ritmado por tamancos de madeira do tradicional grupo Samba de Coco Raízes de Arcoverde, da Zona da Mata pernambucana.

Em algumas músicas do show -- como no frevo “Paço”, cheio de mudanças rítmicas -- o telepático trio de Amaro contou também com a flauta e o sax barítono do talentoso convidado Henrique Albino. Já no jazzístico frevo “Encruzilhada” (do álbum “Sangue Negro”), introduzido com um toque de ironia como “o nosso hit”, o pianista se diverte, citando trechos de temas de Thelonious Monk e Billy Strayhorn durante seus improvisos.

Nesse show de quase duas horas de duração, Amaro e seus parceiros provaram que estão prontos para contagiar plateias de festivais e clubes de jazz de qualquer lugar do mundo. “Essa interação entre músicos e plateia é maravilhosa. Nem vou conseguiu dormir hoje à noite”, agradeceu o pianista, ainda emocionado.

Para alguns que estavam na plateia, como eu, além do prazer de ter ouvido um músico tão original e com um potencial criativo imenso, ficou também uma sensação de orgulho. Em meio à mediocridade reinante, a inovadora música de Amaro Freitas faz pensar que, ao menos no campo cultural, o Brasil ainda tem muito o que o exibir aos olhos e ouvidos do mundo, sem correr o risco de dar mais vexames.













Toninho Ferragutti: acordeonista mistura influências em bela e emotiva trilha sonora

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Se conhecesse algum dos discos gravados pelo acordeonista Toninho Ferragutti, talvez o preconceituoso Joe Bishop, crítico do jornal britânico “The Guardian”, não tivesse afirmado, ao comentar o recente sucesso do cantor Michel Teló (sic), que o acordeom não tem lugar na música popular de hoje.

No álbum “O Sorriso da Manu” (lançamento do selo Borandá), Ferragutti reúne uma pequena orquestra para interpretar composições que escreveu para a trilha sonora de um espetáculo de dança do Grupo Luceros. Contando com o clarinetista Alexandre Ribeiro, com o pianista Paulo Braga e um quarteto de cordas, entre outros músicos, o acordeonista paulista combinou diversas influências e referências, do flamenco à música clássica, passando pelo baião e pelo choro, para compor peças repletas de belezas e emoções. Música sensível, criada para um espetáculo, que ganhou vida própria. 


(resenha publicada no "Guia Folha - Livros, Discos, Filmes", em 15/12/2012)

 

Luiz Gonzaga: tributo em CD triplo mostra atualidade da obra do rei do baião

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Só pelo que fez em favor da música popular do Nordeste, exibindo toda sua diversidade rítmica e melódica ao apresenta-la a ouvintes de outras regiões do Brasil durante as décadas de 1940 e 1950, o influente sanfoneiro, cantor e compositor pernambucano Luiz Gonzaga (1912-1989) mereceria ser homenageado diariamente. Porém, em tempo de vacas magras no mercado fonográfico, não fosse a comemoração pelo centenário de nascimento do popular “rei do baião” dificilmente veríamos gravações como estas chegarem agora às lojas.

Com produção de Thiago Marques Luiz, que já conduziu projetos semelhantes centrados nas obras de Adoniran Barbosa (1910-1982) e Ataulfo Alves (1909-1969), o álbum triplo “100 Anos de Gonzagão” (lançamento do selo Lua Music) reúne 50 itens do repertório do mestre da sanfona, entre clássicos sucessos e temas menos conhecidos pelo grande público, relidos por intérpretes de diversas gerações e vertentes da música popular brasileira.

O produtor paulista tem outra vez a seu lado o violonista Rovilson Pascoal e o baixista André Bedurê, responsáveis pela direção musical e arranjos do álbum. Os dois também tocam em várias faixas, contribuindo assim para uma relativa homogeneidade sonora, algo bem vindo em um projeto que envolve tantos artistas e gravações.

O repertório é organizado de maneira temática. Intitulado “Sertão”, o primeiro dos três CDs reúne 17 canções que remetem ao universo dos boiadeiros, da fauna e da flora sertaneja, dos emigrantes da seca. Os veteranos Dominguinhos (consagrado herdeiro de Gonzagão ao qual o projeto também é dedicado), Geraldo Azevedo, Ednardo e Anastácia abrem o álbum com uma animada versão da toada “Asa Branca”, a obra-prima de Gonzaga e Humberto Teixeira. 


 O tom de reverência predomina em diversas versões, como as de Zezé Motta (“A Vida do Viajante”), Amelinha (“Légua Tirana”), Anastácia e Osvaldinho do Acordeon (“A Feira de Caruaru”). Mas também há releituras bem pessoais, como a de Chico César (na foto ao lado), que dialoga com sua guitarra no baião “Pau de Arara”, ou a do grupo Vanguart, que injeta melancolia na toada “Assum Preto”.

“Xamêgo”, o segundo CD, exibe canções de temática amorosa, algumas abordadas com mais liberdade. A começar pela debochada Maria Alcina, que transforma a faixa homônima em um hilariante carimbó de duplo sentido. O grupo nova-iorquino Forró in the Dark também brinca com a sensualidade de “O Cheiro da Carolina”, num arranjo que combina sopros e ruídos eletrônicos. Agrupadas ao final desse volume, as cantoras Vânia Bastos, Célia e Maria Creuza aproximam a marcha “Olha Pro Céu”, o baião “Roendo Unha” e a valsa “Dúvida”, respectivamente, do universo mais sofisticado da MPB. 


É no CD “Baião” que estão as releituras mais livres, ou mesmo mais irreverentes, do álbum. O clássico “Respeita Januário” soa como um blues eletrificado, na descontraída versão de Zeca Baleiro (na foto ao lado). Recriado por Márcia Castro, o baião “Paraíba” ganha batida e sonoridades de rock. Já o coco “Siri Jogando Bola” remete ao som retrô da Jovem Guarda, na releitura de China. Mas a maior surpresa vem em “Baião de Dois”, com a bossa novista Claudette Soares revivendo a época em que foi chamada de “Princesinha do Baião”, em saboroso arranjo do B3 Organ Trio.

O álbum termina com o dançante “Madame Baião”, gravado em Nova York pela banda Nation Beat, num original arranjo que mistura clarinete, rabeca e guitarra. Mais uma prova de que, décadas depois de conquistar o Brasil, o baião de Gonzagão continua a ser cultuado até na terra de Tio Sam.


(resenha publicada no "Guia Folha - Livros, Discos, Filmes", em 28/09/2012)

Eli Joory e Maria Teresa Madeira: a facilidade de transitar entre o clássico e o popular

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                                                                                                  Foto de Bruno Veiga/Divulgação

A formação erudita do compositor e saxofonista Eli Joory, conhecido na cena da música instrumental brasileira, chama atenção em "Tomara que Chova" (lançamento Delira), álbum que reúne nove de suas peças para piano solo ou duos de música de câmara. Quem as interpreta é a pianista Maria Teresa Madeira (na foto acima, com Joory), presente em todas as faixas, além de alguns instrumentistas convidados.

Em “Cirandas”, que abre o disco, a cantiga folclórica “Atirei o Pau no Gato” serve de tema para uma criativa fantasia, na qual a popular melodia surge em diversas variações, que a pianista conduz com elegância. Em “Gonzagueando”, peça marcada pelo ritmo do baião, a flauta e o sax soprano de Carlos Malta são os protagonistas, costurando as melodias de sucessos associados a Luiz Gonzaga (“Asa Branca”, “Assum Preto” e “Maria Bonita”). Ao transitar com facilidade entre a tradição clássica e a música popular, Joory sugere que quem mais ganha com isso é seu ouvinte.

(resenha publicada no "Guia Folha - Livros, Discos e Filmes", em 29/7/2011)

Marku Ribas: um artista carismático que merece um maior reconhecimento

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Só mesmo a injusta dinâmica do mercado pode explicar porque o talento musical do mineiro Marku Ribas ainda só é apreciado por um círculo restrito de fãs. Um dos pioneiros da música negra com sotaque brasileiro, aos 63 anos, este carismático cantor, compositor, violonista e ator de cinema (“Batismo de Sangue”, “Chega de Saudade”) lança agora “4 Loas” (+Brasil/Tratore), álbum que surpreende tanto pela fulminante energia de suas performances, como pela profusão de referências reveladas em suas canções.

Do gingado de “Aurora da Revolução” ao romantismo de “Ce Pas Pour Ça”, Marku mistura seu samba com diversos ritmos e influências, como o jazz (“Altas Horas”, “Doce Vida”), o rock (“A Embaixatriz”) e o baião (“Sambatema”), além de criar saborosas incursões pelo funk (“O Mar Não Tem Cabelo”) e pelo reggae (“Querobem Querubim”). Para isso conta com alguns dos melhores instrumentistas de Minas Gerais, com destaque para o baterista Neném e o baixista Ezequiel Lima. Quem sabe com este disco a música de Marku alcançará enfim o reconhecimento que merece. 

 (resenha publicada no "Guia Folha - Livros, Discos, Filmes", em 17/12/2010)


Carlos Malta Quarteto: entre o jazz e a diversidade da música popular brasileira

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Depois de integrar por 12 anos o grupo de Hermeto Pascoal, seu mentor musical, o multi-instrumentista de sopros e compositor Carlos Malta vem desenvolvendo desde 1993 uma bem sucedida carreira de solista. Em “Tudo Azul” (lançamento independente), seu décimo álbum, ele adota o formato do quarteto, já clássico no universo do jazz, sem abrir mão de sonoridades e ritmos mais típicos da música popular brasileira, como a bossa nova, o baião e o partido alto.

Com o apoio seguro de Daniel Grajew (piano), Guy Sasso (baixo acústico) e Richard Montano (bateria), Malta improvisa sobre composições próprias e de seus parceiros, alargando as sonoridades do grupo ao se desdobrar nos saxofones soprano e barítono, no clarone e em várias flautas. O álbum conta também com participações eventuais das vocalistas Misty e Lorena Lobato (nas jazzísticas “Soul Sin/Sou Sim” e “Pat”) e de outros instrumentistas. Música improvisada de alta qualidade, que pode ser conferida no clipe abaixo. 

(texto publicado originalmente no "Guia da Folha de Livros, Discos e Filmes", em 24/9/2010)


Bissamblazz: big band paulista lança 'Nativ', seu quarto CD, com gravação ao vivo

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Criada em 1993, a big band paulista Bissamblazz segue como veículo para as refinadas composições de seu criador, o percussionista e líder Magno Bissoli. “Nativ” (selo Axis), seu quarto CD, foi gravado ao vivo em 2008, no Teatro Paulo Autran do Sesc Pinheiros, em São Paulo. As cinco faixas desse álbum compõem uma espécie de suíte, que combina influências do jazz e da música contemporânea.

Com levada de samba, a vibrante “But I Am Not Hamlet” é inspirada em poema do dinamarquês Peter Poulsen. “Safari” remete a ritmos afros e destaca um expressivo solo do sax tenor Victor Alcântara. A tensão inicial de “Correndo na Frente”, que encerra o álbum, desemboca em um baião. No engenhoso encarte, as observações musicais de Bissoli, que também é doutor em História pela Universidade de São Paulo, emprestam sabor especial à audição. Venda pelo e-mail
axis@bissamblazz.org

Yamandu Costa e Dominguinhos: saboroso encontro de gerações da música instrumental

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Anos atrás, uma parceria como esta pareceria improvável. Como imaginar que o jovem violonista gaúcho Yamandu Costa, conhecido na cena da música instrumental por seus improvisos exuberantes e repletos de notas, poderia se unir ao veterano pernambucano Dominguinhos, mestre da sanfona e discreto herdeiro de Luiz Gonzaga?

O próprio Yamandu relembra, em depoimento incluído neste DVD (lançamento Biscoito Fino), como ficou impressionado ao ouvir um solo sentimental e minimalista do sanfoneiro, evento que contribuiu para a formação da dupla, anos mais tarde.

Gravado no Auditório Ibirapuera, em 2007, este show reúne clássicos de diversos gêneros da música popular brasileira, do baião “Asa Branca” (Gonzaga e Humberto Teixeira) à bossa “Wave” (Tom Jobim), passando por choros (“Doce de Coco”, de Jacob do Bandolim; “Pedacinhos do Céu”, de Waldir Azevedo), valsas e canções sulistas de várias épocas (como a folclórica “Prenda Minha”). O humor de Yamandu e Dominguinhos, exibido entre alguns dos números musicais, só aumenta o prazer do espectador ao saborear este encontro.


(resenha parcialmente publicada no “Guia da Folha – Livros, Discos & Filmes”, em 28/08/2009)

Ivo Perelman: o free jazz descobre a rítmica brasileira, em "Ibeji Sessions"

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Caso raro no universo do jazz de vanguarda, o saxofonista paulistano Ivo Perelman desenvolveu ao longo de duas décadas, nos EUA, uma obra extensa (já lançou 32 álbuns próprios), na qual a alta intensidade sonora e a cacofonia características desse estilo convivem com algumas doses de lirismo.

O CD duplo “The Complete Ibeji Sessions” (lançado no Brasil pelo selo Editio Princeps) reúne seus álbuns “Soccer Land” (1994) e “Tapeba Songs” (1995). Nessa fase, Perelman ainda tentava encontrar uma síntese entre a linguagem do free jazz (a influência de Albert Ayler é evidente na sonoridade rouca de seu sax tenor) e a rítmica brasileira, improvisando sobre sambas, baiões, cantigas de roda e outras manifestações de nosso folclore. Zé Eduardo Nazário (bateria e percussão), Lelo Nazário (teclados) e Paulo Bellinati (violão) estão entre os convidados que participaram dessas gravações.

(resenha publicada no “Guia da Folha – Livros, Discos & Filmes”, em 29/05/2009)



Rogério Rochlitz: música instrumental com pinceladas de humor

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Tecladista da banda Farufyno e do Trio Mocotó, o compositor e arranjador paulista Rogério Rochlitz encara a música instrumental com leveza e pinceladas de humor. “Cores” (selo Pôr do Sol), seu terceiro CD, exibe um repertório bem diversificado: do gingado samba “Simbora!” à erudita “Filarmônica da Chipônia”; do sofisticado baião “De Casa pra Rua” à jazzística balada “Pra Ela”.

E, talvez para dar um pequeno susto no ouvinte, o tecladista ainda comete uma divertida versão de “Crazy Pop Rock” (Gilberto Gil), contando com o vozeirão de Marcelo Pretto (integrantes dos grupos A Barca e Barbatuques). Rochlitz sugere que a música instrumental não precisa ser pretensiosa, muito menos ortodoxa. Pode até provocar sorrisos.

(resenha publicada na “Folha de S. Paulo”, em 18/03/2009)



 

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