Música instrumental brasileira: site Músicos do Brasil constrói enciclopédia do gênero

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Mesmo sendo considerada uma das mais criativas e diversificadas do mundo, comparável apenas à música cubana ou ao jazz norte-americano, a música instrumental brasileira não é incentivada como merece pela indústria do disco, que nas últimas décadas optou por investir apenas em vertentes de consumo fácil, até descartáveis.

“Ainda temos que aguentar, de vez em quando, um desses poderosos chefões de gravadora dizer que a culpa é da falta de criatividade dos músicos brasileiros”, rebate a pesquisadora Maria Luiza Kfouri, que criou e desenvolveu com Fernando Ximenes o site Músicos do Brasil: Uma Enciclopédia Instrumental (www.musicosdobrasil.com.br), na rede desde fevereiro.

O perfil enciclopédico não impediu que o projeto desse site, patrocinado pela Petrobrás, fosse desde o início pensado para a internet. “Sabíamos que um projeto desta magnitude não estaria ‘pronto’ nunca e, por isso, a internet seria seu meio ideal, para que possamos acrescentar aquilo que vai, sempre, estar faltando”, diz a pesquisadora.

O site já reúne cerca de 700 verbetes com muitos dos principais instrumentistas do país, que traçaram nos palcos e estúdios de gravação a história desta corrente musical: do flautista Pixinguinha (1897-1973; no centro da foto acima) ou do violonista Garoto (1915-1955), chegando a talentos da cena atual, como o bandolinista Hamilton de Holanda ou o pianista André Mehmari.

Recenseamento
Para iniciar a pesquisa, em meados de 2006, Kfouri e Ximenes criaram uma espécie de recenseamento, um minucioso questionário, que foi enviado por e-mail a centenas de instrumentistas. Além de levantar o currículo de cada um, a pesquisa também colheu dados sobre a formação e o “pensamento” desses músicos, mapeando assim seus mestres, influências e parceiros.

Os critérios para definir quais músicos devem estar representados nos verbetes do site resumem-se a apenas um: só entram os que gravaram ou participaram de gravações de pelo menos um disco exclusivamente instrumental.

“Não há outro critério, nem de estilo, nem de gênero”, explica Kfouri. “Tivemos que criar essa regra, um tanto draconiana, pois se não teríamos que ter outras vidas para poder cobrir todos os instrumentistas brasileiros. São milhares aqueles que acompanham cantores e que nunca participaram de uma gravação instrumental”.

As respostas vieram em grande volume, mas músicos pouco afeitos ao e-mail, como o flautista Altamiro Carrilho ou o pianista Amilton Godoy, pediram para gravar seus depoimentos. Já o pianista Francis Hime, curiosamente, preferiu responder o questionário à mão e o reenviou por sedex. “Ainda não conseguimos chegar a alguns músicos, como João Donato, Paulinho da Viola e Edu Lobo, mas estamos insistindo”, conta Kfouri.

Driblando dificuldades
Dificuldades não faltam num projeto tão abrangente. No caso de instrumentistas já mortos, por exemplo, a pesquisa fica mais restrita a consultas a familiares, a poucas obras de referência ou a sites que nem sempre trazem dados corretos.

Mesmo assim, Kfouri observa que a situação na área da pesquisa cultural, no Brasil, tem melhorado. “A biblioteca musical cresceu consideravelmente e a internet tem sido uma ferramenta e tanto, embora muitas vezes ainda se tenha que tomar muito cuidado com as informações que se encontram em determinados sites”.

Além dos verbetes, o site oferece também dissertações universitárias e ensaios sobre instrumentos, estilos, grupos musicais ou discos mais significativos, escritos por especialistas. Entre os músicos que assinam ensaios estão Henrique Cazes (“O Cavaquinho”), Maurício Carrilho (“O Violão de Sete Cordas”) e Benjamim Taubkin (“Piano Brasileiro”).

(Reportagem publicada na "Folha de S. Paulo", em 3/03/2009)


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