Música instrumental brasileira: gênero vem se aproximando mais do formato da canção

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Com uma produção bastante fértil e diversificada, que hoje se destaca tanto pela alta qualidade como pela quantidade de solistas e grupos revelados durante a última década, a música instrumental brasileira parece ter encontrado novo fôlego para superar as dificuldades e preconceitos que enfrentou nos anos 1990, quando foi esnobada pelas grandes gravadoras e quase deixou de ser veiculada pelas rádios do país.

Lançamentos recentes dessa vertente musical, produzidos em quatro Estados brasileiros, sugerem que, assim como o idioma que falamos, diferentes sotaques e referências sonoras marcam a música instrumental de cada região do país. Outro aspecto que se tornou mais frequente nesse gênero: os instrumentistas estão aderindo com mais frequência ao formato da canção.

Basta ouvir uma ou duas faixas de "Música para Ouvir Sentado" (lançamento independente), o quinto CD de Arthur de Faria & Seu Conjunto - na foto acima - para se notar que esse irreverente pianista e compositor, assim como sua banda de formação incomum (com sax, fagote, trombone e acordeom), são de Porto Alegre (RS). Como bem define o líder, trata-se de um “trabalho de fronteira”, tanto por transitar entre a música popular, o erudito e o jazz, como pelas influências argentinas e uruguaias. Faixas como “Solostrágicos”, que funde tango, bolero e marcha carnavalesca, ou “Contrabandeada Milonga”, quase um rock, escancaram o fino humor do grupo.

Desde os anos 1980 os teclados e arranjos do mineiro Túlio Mourão (na foto abaixo) já estiveram a serviço de astros da MPB, como Milton Nascimento e Chico Buarque, assim como de seus projetos instrumentais. Agora ele aproxima essas duas vertentes, no CD “Em Oferta” (lançamento independente), gravando canções de sua autoria, algumas em parceria com letristas do Clube da Esquina, como Fernando Brant e Márcio Borges. Chega a cantar três delas, sem abrir mão dos eficazes arranjos e solos.


Adepto das fusões jazzísticas, o carioca Arthur Maia é conhecido por sua intimidade com ritmos dançantes, como o funk e o reggae. Em “O Tempo e a Música” (lançamento Biscoito Fino), seu quinto álbum, surpreende ao usar seu baixo elétrico para interpretar alguns clássicos da música brasileira, como a valsa “Abismo de Rosas” (Canhoto) e o choro “Brejeiro” (Ernesto Nazareth). E no samba “Minha Palhoça” (J. Cascata) ainda divide os vocais com a cantora Mart’nália.

O pianista Michel Freidenson despontou na cena instrumental de São Paulo, ainda  na década de 1980, integrando a banda Zonazul. Em “Notas no Ar" (lançamento Azul), ele também utiliza sua bagagem jazzística para reler com liberdade e personalidade algumas pérolas da canção brasileira, como “Roda” (Gilberto Gil), “Samba de Verão” (Marcos Valle) e “Viola Violar” (Milton Nascimento), além de exibir composições próprias.

Se você ainda é um daqueles que torciam o nariz para as melodias pouco assobiáveis da música instrumental, está na hora de dar a ela uma nova chance.

(resenha publicada no "Guia Folha - Livros, Discos, Filmes", em 28/10/2011) 

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