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C6 Fest: primeira noite em São Paulo destacou tributo a Zuza e craques do jazz atual

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                                    O gaitista Gabriel Grossi, na abertura do C6 Fest, em São Paulo - Foto/Divulgação  


Herdeiro do Free Jazz e do Tim Festival, dois dos mais influentes festivais de música em nosso país, o eclético C6 Fest abriu sua primeira noite de jazz em São Paulo (19/5), com uma merecida homenagem a Zuza Homem de Mello (1933-2020). Os precursores deste novo festival devem muito ao saudoso jornalista e pesquisador musical.

No palco do Auditório Ibirapuera, emocionados, a produtora cultural Monique Gardenberg e o saxofonista Zé Nogueira lembraram que trabalharam ao lado de Zuza e do produtor musical Paulinho Albuquerque (1942-2006) desde a primeira edição do Free Jazz, em 1985.

Ao introduzir a homenagem, Monique recordou que Zuza tinha o costume de elogiar coisas boas com a antiga expressão “é do peru”. “É o que chamamos hoje ‘do cacete’. Para o Zuza, música e prazer estavam sempre juntos”, comentou a produtora. Já o saxofonista observou que a noite também era dedicada a Moacir Santos (1926-2006), grande compositor e arranjador pernambucano, que foi homenageado na longínqua estreia do festival Free Jazz.

Comandada por Nogueira e pelo violonista Mário Adnet, a Orquestra Ouro Negro consagrou-se por meio de seus discos e concertos como intérprete e propagadora da originalíssima obra de Moacir. Se, anteontem, havia no Auditório Ibirapuera alguém que ainda não conhecia belezas musicais como “Bluishmen”, “April Child” ou “Oduduá”, deve ter saído encantado dali.

Além de outros grandes instrumentistas sentados nas estantes da Ouro Negro, como Ricardo Silveira (guitarra), Teco Cardoso (sax barítono), Andrea Ernest Dias (flautas) ou Jorge Helder (contrabaixo), o tributo de gala incluiu ainda três convidados muito especiais. Primeiro, o gaitista Gabriel Grossi improvisou à frente da orquestra. Depois, as cantoras Fabiana Cozza e Monica Salmaso demonstraram que suas vozes também podem soar como sofisticados instrumentos musicais.

O repertório da Ouro Negro trouxe ainda uma saborosa surpresa. Lembrando que Zuza era fã e íntimo conhecedor da obra do compositor e jazzista Duke Ellington, Adnet anunciou um arranjo especial de “Caravan” (clássico da big band do norte-americano), escrito ao estilo de Moacir Santos.

A noite prosseguiu com três atrações que esboçaram um painel da diversidade do jazz contemporâneo. A começar pelo quarteto da saxofonista inglesa Nubya Garcia, que exibe no repertório fortes marcas de sua ascendência caribenha. Não à toa, os ritmos do reggae e do dub jamaicano perpassam alguns dos sacolejantes temas de sua autoria.

Em seguida, entrou em cena o sensacional trio do guitarrista californiano Julian Lage, que destaca o baixista peruano Jorge Roeder (já esteve no Brasil com o pianista israelense Shai Maestro) e o baterista Dave King (da cultuada banda norte-americana The Bad Plus). Em alguns momentos, era possível sentir como o contagiante prazer que os três demonstram ao improvisarem juntos é capaz de excitar a plateia.

(Infelizmente, fui obrigado a abrir mão do show do inspirador trio do pianista armênio Tigran Hamasyan, em sua primeira aparição no Brasil. Ele só entraria no palco após a meia-noite e eu tinha que trabalhar cedo, no dia seguinte. Lamento, Tigran, fica para o próximo festival).

Em sua primeira noite de jazz em São Paulo, marcada pela qualidade de suas atrações, o novo festival de Monique Gardenberg e sua experiente equipe mostrou que está à altura dos importantes festivais que o antecederam décadas atrás. Longa vida ao C6 Fest!


Guinga: 70 anos do compositor e violonista serão festejados em lives gratuitas

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                                                         Leila Pinheiro e Guinga / Foto de Renato Mangolin/Divulgação 

A estreia chegou a acontecer, em março, no palco do CCBB Rio de Janeiro, mas o projeto foi interrompido pela quarentena. Nada mais justo que a série de shows planejada para comemorar os 70 anos de Guinga – um dos grandes compositores da moderna canção brasileira, além de brilhante craque do violão – seja retomada, no formato de lives gratuitas. 

A série Guinga e as Vozes Femininas, que começa hoje (quinta, 8/10), às 20h, será composta por nove shows. Com seu inseparável violão, Guinga recebe em cada apresentação uma cantora e um instrumentista. O repertório, extraído da preciosa obra musical desse compositor carioca, também varia a cada noite.

Hoje, na nova estreia da série, Guinga recebe a cantora Leila Pinheiro e o violonista Marcus Tardelli. Na sequência, ele vai dividir o palco com: Cíntia Graton e Tardelli (15/10); Simone Guimarães e o violonista Jean Charnaux (22/10); Anna Paes e o clarinetista Pedro Paes (25/10); Bruna Moraes e Charneux (29/10); Ana Carolina e Charneux (1/11); Ilessi e Charneux (5/11); Luísa Lacerda e o saxofonista Zé Nogueira (8/11); e, novamente, Leila Pinheiro e Tardelli (12/11).

O projeto inclui também um ciclo de palestras ministradas pela cantora e violonista Anna Paes, que já pesquisa a obra do compositor há duas décadas. Serão três palestras: “Guinga e Paulo César Pinheiro” (em 24/10, às 20h); “Guinga, Memória, História e Identidade” (31/10) e “Viva Aldir! A parceria entre Guinga e Aldir Blanc” (7/11). Finalmente, o próprio Guinga oferece uma masterclass intitulada “A influência de Villa-Lobos e Tom Jobim na obra do compositor” (10/10, às 20h).

Para assistir: youtube.com/bancodobrasil

Mastercard Jazz: festival gratuito e ao ar livre traz jazzistas jovens a São Paulo

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                                 O trompetista Christian Scott, atração na noite de estreia do Mastercard Jazz  

Ao ver o programa da primeira edição do Mastercard Jazz, festival que pretende apresentar a um público jovem novos talentos da cena jazzística, um desavisado dificilmente imaginará que a seleção desses artistas foi feita por curadores que trabalham juntos há décadas. O novo evento oferece oito shows gratuitos, neste sábado (31/8) e domingo (dia 1/9), na área externa do Auditório Ibirapuera, em São Paulo.

Entre as realizações dessa veterana equipe de curadores estão alguns dos principais festivais do gênero em nosso país: Free Jazz (1985-2001), Tim Festival (2003-2008), BMW Jazz (2011-2014) e BrasilJazzFest (2015-2016).

“O Mastercard Jazz é um festival pequeno e voltado para uma faixa etária específica, mas nós o consideramos uma continuação do velho Free Jazz. Os festivais trocam de patrocinadores e mudam de nome, mas nós somos os mesmos”, afirma o instrumentista e produtor musical Zé Nogueira, que participou em 1985 da criação do hoje lendário Free Jazz Festival, ao lado do produtor musical Paulinho Albuquerque e das empresárias (e irmãs) Monique e Sylvia Gardenberg, da Dueto Produções.

Logo se uniu a esse time o jornalista e radialista Zuza Homem de Mello, que trazia a experiência de ter atuado como programador (o termo curador não era usado ainda) das duas edições do pioneiro Festival Internacional de Jazz de São Paulo, em 1978 e 1980. “Foi um evento que deixou todo mundo de queixo caído”, relembra Zuza. Realizado em parceria com o influente festival suíço Montreux Jazz, esse evento reuniu dezenas de músicos do primeiro time do jazz internacional, além de astros do blues, do reggae, até do tango – algo inédito até então no país.

“Muitos jovens acabaram se tornando músicos por causa daqueles festivais de São Paulo”, orgulha-se Zuza. Vale lembrar que as duas edições do evento repercutiram por todo o país graças à transmissão ao vivo dos shows pela TV Cultura e emissoras afiliadas – o diretor de TV Antonio Carlos “Pipoca” Rebesco foi premiado pela alta qualidade das imagens. “Hoje, nenhuma emissora se atreveria a transmitir durante quatro ou cinco horas um espetáculo musical como aquele”, compara Zuza (na foto abaixo, entre os curadores Pedro Albuquerque e Zé Nogueira). 

Sucessor do pioneiro festival paulista, o Free Jazz não deixou por menos. Ao longo de 16 edições, esse evento formou plateias para um gênero musical ainda considerado elitista. Durante sua existência só houve um hiato em 1990, em função das devastadoras medidas econômicas do governo Collor. “Conseguimos fazer um festival que trouxe um elenco espetacular do jazz mundial. Muita gente aprendeu a escutar essa música indo ao Free Jazz. Ele se compara aos grandes festivais do mundo”, considera Nogueira. 
                                                               
Segundo Zuza, ao escolher os artistas do elenco de um festival é necessário ter equilíbrio. “Você precisa balancear as atrações de tal forma que o festival não fique voltado apenas para algum tipo de manifestação peculiar. É preciso pensar sempre que o festival é feito para um público. Você pode até escolher algo que não gostaria de ouvir em sua casa. O importante é que funcione no evento”, observa o curador.

“É inevitável que o gosto pessoal de cada curador pese nas indicações, mas a gente tenta se preocupar mais com o que está acontecendo na cena musical”, diz o produtor musical Pedro Albuquerque, que ingressou nessa equipe em 2007 (durante a preparação da penúltima edição do Tim Festival), meses depois da morte de Paulinho, seu pai. “Quando entrei nessa história, o Zé, o Zuza e meu pai tinham uma dinâmica própria. Talvez eu tenha contribuído, humildemente, no sentido de se buscar músicos mais jovens”.

Essa foi a intenção do trio de curadores ao escolher o elenco da primeira edição do Mastercard Jazz, que oferece oito shows gratuitos, neste sábado e domingo (31/8 e 1.º/9), na área externa do Auditório Ibirapuera, em São Paulo. “Decidimos apostar em nomes mais novos, que nos parecem combinar com o interesse da juventude de hoje”, resume Zuza. Segundo ele, as dificuldades econômicas que o país atravessa levaram a produção do evento a descartar grandes nomes do gênero para essa edição, pois isso implicaria em um orçamento bem maior para se contratar apenas um ou dois artistas.

“Para pensar em um festival com um elenco mais novo, que possa atrair uma plateia jovem, fomos pesquisar o que está acontecendo nessa esfera, no mundo do jazz. É um barato ver essa garotada fazer uma espécie de retorno à África ou essa coisa de juntar jazz com hip hop”, diz Nogueira, observando que a opção por um festival ao ar livre impõe restrições na hora de definir o elenco. “Certos tipos de música não funcionam ao ar livre. Para um festival com esse formato, a música tem que ter mais pegada”.  

Zuza concorda com essa opção. “Quando se trata de um festival ao ar livre, o artista precisa se preparar para fazer um show diferente do que faria em um ambiente fechado”, diz. “Ele tem que conquistar um público que pode estar comendo pipoca, pode estar conversando, pode estar namorando. Para atrair a concentração desse público, você não pode colocar no palco um artista que faça uma apresentação muito intimista”. 

Foi com essa preocupação em mente que a equipe de curadoria escolheu as três atrações brasileiras do novo festival. Além de destacar a qualidade dos vocais e a beleza de Xênia França, Zuza elogia o trabalho do guitarrista e compositor paulista Lourenço Rebetez, que vai dividir o palco com essa cantora baiana radicada em São Paulo. Já a banda Bixiga 70 é a mais experiente entre as atrações nacionais. “É impressionante como esses garotos conseguiram penetrar no mercado internacional, de uma forma mais bem-sucedida até do que no Brasil”, surpreende-se Zuza.

Pedro Albuquerque chama atenção para o jovem quarteto Dinosaur, com destaque na cena jazzística britânica e que tem como líder a talentosa trompetista e compositora Laura Jurd. “O som do Dinosaur me lembra um pouco da fase elétrica do Miles Davis”, comenta o curador. Outra instrumentista no elenco é a nova-iorquina Lakecia Benjamin, saxofonista que virá acompanhada pela banda Soul Squad. “Lakecia não é uma virtuose do sax, mas tem uma pegada jovem, bem funky”, analisa Pedro.

Também inédito em palcos brasileiros é o show do saxofonista, tecladista e produtor californiano Terrrace Martin (na foto acima), que tem no currículo parcerias com figurões do hip hop e do R&B. Para Zé Nogueira, o fato de Martin ter tocado ultimamente com Herbie Hancock, um dos grandes astros do jazz contemporâneo, é algo natural. “Terrace e outros caras de sua geração dão continuidade ao que Hancock já fez no passado”, afirma.

Outra novidade para a plateia paulistana será o guitarrista, compositor e cantor americano Robert Randolph. Ele vem acompanhado pela Family Band e deve chamar a atenção da plateia com sua “pedal steel guitar”, tocada sobre uma bancada, em posição horizontal. “Acho que ele pode fazer um tremendo show ao ar livre”, aposta Pedro, referindo-se à dançante mistura de blues, soul, funk e rock praticada por Randolph.

Mais conhecidos entre os paulistanos, o pianista Aaron Parks e o trompetista Christian Scott já se apresentaram em outros festivais, com diferentes projetos. “Gostamos muito da música do Aaron, que embora seja jovem já está na estrada há um bom tempo. Ele esteve aqui no BMW Jazz, em 2013, com o quarteto James Farm. Já o Christian é um trompetista fantástico, que está sempre se reinventando”, considera Pedro.

Depois de trabalharem juntos por tantos anos, além dos grandes shows que presenciaram, os três curadores também guardam na memória saborosas histórias de bastidores. Como os pitis de Little Richard, o veterano cantor e pioneiro do rock & roll, que ficou furioso ao desembarcar em São Paulo para o Free Jazz de 1993, porque não encontrou uma limusine para levá-lo ao hotel.

“Monique ligou logo para mim. Pediu que eu corresse para o hotel Maksoud Plaza e preparasse uma recepção de gala para acalmar o Little Richard. Quando ele chegou, muito irritado ainda, eu me desmanchei em elogios a ele”, conta Zuza, rindo. Não bastasse esse incidente, na hora do show Richard voltou a criar problema: não queria entrar no palco antes de Chuck Berry, outro pioneiro do rock & roll escalado para fechar a mesma noite. “Foi um perereco, mas a Monique conseguiu resolver”, diverte-se o curador.

Zé Nogueira lembra de ter tido a chance de conviver por alguns dias com o trompetista Chet Baker (1929-1988), no primeiro Free Jazz, em 1985. “Até tocamos juntos, em uma canja no clube Jazzmania, aqui no Rio. Ele era uma pessoa de poucas palavras, mas muito doce”, conta o saxofonista. “Foi um sufoco mantê-lo aqui, porque ele era viciado em heroína e usava metadona para substituir a droga. Tive até que chamar um médico amigo meu, que gostava de música e aceitou acompanhá-lo durante os dias do festival”, conta Nogueira. Mas Baker enganou o médico e tomou de uma vez toda a metadona reservada para os dias que passaria no país. “Ele sobreviveu por um triz. Por pouco não morreu durante o Free Jazz”, confirma Zuza.

Já Pedro relembra a tumultuada vinda de Wayne Shorter ao BMW Jazz, em 2011. Por causa da repentina erupção do vulcão chileno Puyehue, que espalhou cinzas até a Argentina, onde o saxofonista havia tocado na noite anterior, todos os voos regulares foram cancelados. Shorter e seu grupo tiveram que viajar de ônibus até Uruguaiana (RS), onde embarcaram para São Paulo em um jatinho fretado pela produção. Chegaram cansados, pouco antes do horário de entrada no palco do Auditório Ibirapuera.

“O show foi fantástico”, comenta Pedro, que encontrou o contrabaixista John Patitucci, no dia seguinte. “Ele me disse que nem conseguiram dormir direito naquela noite. Agradeci por terem se esforçado tanto. Wayne (na época com 78 anos) poderia ter desistido, mas fez questão de fazer aquele show, demonstrando o grande respeito que tem por seu público. Essa história foi muito marcante para mim”.

Programação

Sábado (31/8), a partir das 17h30:
Aaron Parks & Little Big; Lourenço Rebetez & Xênia França, Terrace Martin e Christian Scott

Domingo (1/9), a partir das 17h30:
Bixiga 70, Dinosaur, Lakecia Benjamin & Soul Squad e Robert Randolph & The Family Band

Projeto Coisa Fina: uma promissora homenagem ao maestro Moacir Santos

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Não é à toa que os nomes dos músicos Mario Adnet e Zé Nogueira encabeçam a lista de agradecimentos de “Homenagem ao Maestro Moacir Santos” (lançamento Movimento Elefantes/Tratore) o promissor álbum de estréia da banda paulista Projeto Coisa Fina. Em “Ouro Negro” (2001), um dos discos mais importantes da música brasileira na última década, Adnet e Nogueira revelaram às novas gerações a preciosa e ainda pouco conhecida obra de Moacir Santos (1926-2006).

Foi “Ouro Negro” que estimulou os músicos do Projeto Coisa Fina a garimpar e gravar outras jóias do maestro e originalíssimo compositor pernambucano, como a percussiva “Maracatucutê” (confira o video abaixo), a sofisticada “Stanats” (dedicada por ele ao saxofonista norte-americano Stan Getz) ou a jazzística “Coisa nº 2”.

A homenagem da banda paulista ganha um sentido especial com a inclusão de composições de seus integrantes, claramente inspiradas pelas sonoridades e pela original concepção rítmica de Moacir Santos. Onde quer que esteja agora, o grande maestro tem motivos de sobra para ficar orgulhoso desses frutos de sua música.


(resenha publicada originalmente no "Guia da Folha de Livros, Discos e Filmes", em 24/9/2010)




Mario Adnet: de volta à composição, com vários parceiros, em "O Samba Vai"

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Mais conhecido nesta década como arranjador, violonista e produtor, graças aos elogiados discos que dedicou às obras de Moacir Santos (“Ouro Negro” e “Choros & Alegrias”, ambos com Zé Nogueira), Baden Powell (“Afrosambajazz”, com Phillipe Baden Powell) e Tom Jobim (“Jobim Jazz” e “Jobim Sinfônico”), o músico carioca Mario Adnet volta a gravar um álbum autoral.

No CD “O Samba Vai” (lançamento Biscoito Fino), ele retoma parcerias com Joyce, Paulo César Pinheiro, Bernardo Vilhena e Chico Adnet, além de exibir duas recentes canções que fez com João Donato. Nos vocais participam também Mônica Salmaso, Joyce, Pedro Miranda, Muiza Adnet e Antonia Adnet.

A seguir Mario Adnet comenta detalhes desse álbum, fala sobre seus parceiros e relembra a recepção calorosa que o projeto “Ouro Negro” obteve em Nova York, meses atrás, em concerto no conceituado Lincoln Center.

Pergunta - Nos últimos anos você se dedicou a projetos centrados nas obras de Moacir Santos, Baden Powell, Tom Jobim e Villa-Lobos. Como lida com o fato de sua obra autoral ficar em segundo plano?

Mario Adnet - Eu me sinto muito bem por ter seguido esse caminho, que só enriqueceu minha música. Esses projetos foram muito importantes para mim, como um resgate de mim mesmo. Se eu não tivesse as músicas desses compositores à minha volta, minha música não teria razão de existir.

Qual foi sua intenção ao planejar esse disco? 

Adnet - Eu tinha o desejo de fazer um trabalho cantado. Esse disco tem canções divertidas, outras mais sérias, mas foi uma alegria fazê-lo. Eu já tinha parcerias com o Paulo César Pinheiro, como a “Valsa Exaltação e “Dois Orfeus”, compostas há mais de 15 anos. Achei que “Fazer Samba pra Você” era parecida com a Joyce, parceira e amiga de mais de 30 anos. Mostrei a ela e dois dias depois recebi o e-mail com a letra. Com o João Donato também foi engraçado. Liguei pra ele e no mesmo dia fizemos duas músicas: “Um Samba na Madrugada”, que eu já tinha iniciado, e “Domingo de Verão”, que ele começou a compor na hora. Fiquei de botar as letras nas duas, mas depois decidi chamar o Bernardo Vilhena, outro antigo parceiro. Ele acertou a mão na leveza dos versos.

A bem-humorada “Fred Astaire do Samba”, parceria com seu irmão Chico (pai do comediante Marcelo Adnet), é uma faixa que logo se destaca no disco. Vocês têm outras canções? 

Adnet - Fizemos poucas coisas, na época em que ainda éramos garotos. Depois o Chico enveredou pela publicidade e pelas trilhas sonoras. Ele tem esse viés engraçado que o Marcelo herdou. Creio que “Fred Astaire do Samba” será o início de um trabalho maior que já estamos planejando (veja o video abaixo).

Você também gravou “Céu e Mar”, uma das obras-primas de Johnny Alf, que morreu em março. Foi uma homenagem póstuma?  

Adnet - Eu sempre quis gravar Johnny Alf, tinha até ensaiado um projeto só com a música dele. O arranjo de “Céu e Mar” já estava pronto quando ele morreu, mas não deixa de ser uma homenagem. As músicas do Johnny são muito ricas. Tom Jobim foi influenciado por ele. Ao ouvir “Rapaz de Bem”, do Johnny, penso que o “Desafinado” saiu dali.

Você imaginou que “Ouro Negro” (2001), o álbum duplo que você e Zé Nogueira dedicaram à obra de Moacir Santos, se tornaria uma referência inclusive no exterior?

Adnet – Não imaginava isso, mas hoje sinto que vamos continuar fazendo esse trabalho “ad eternum”. Aliás, tocamos o “Ouro Negro” em Nova York, no Lincoln Center, em maio deste ano. O público estava muito quente e aplaudiu de pé. Eu olhava para as primeiras filas da platéia e via o pessoal ouvindo de olhos fechados. Isso dá um gás enorme para que a gente possa acreditar mais no que fazemos e prosseguir, porque o Brasil é uma terra injusta.

O preconceito e a ignorância frente à música instrumental têm diminuído no Brasil?

Adnet – Sim, o interesse do público é cada vez maior. Sinto que hoje você precisa fazer um show muito bem produzido, com músicos de primeira linha, porque isso faz toda a diferença. As pessoas percebem isso, por mais leigas que sejam. Esse é um jeito de voltar a valorizar a música brasileira, que foi muito desvalorizada pela indústria fonográfica nas últimas décadas.

entrevista publicada originalmente no “Guia da Folha – Livros, Discos e Filmes”, em 24/9/2010)



 

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