Núcleo Contemporâneo: gravadora e produtora festeja 18 anos de autonomia

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Houve quem estranhasse o fato de a gravadora e produtora Núcleo Contemporâneo ter festejado seus 18 anos de realizações, em um grande show no Auditório Ibirapuera, em São Paulo, neste final de semana. O senso comum aconselharia esperar os 20 anos (uma data “redonda”), para se realizar uma comemoração como essa.

Para quem, como eu, acompanha desde o início a trajetória do Núcleo Contemporâneo, fica mais fácil compreender o simbolismo dessa festa. Em 1997, ao fundar esse selo fonográfico, os músicos Benjamim Taubkin, Teco Cardoso, Mané Silveira e Toninho Ferragutti estavam decididos a gravar e distribuir seus discos, sem depender da aprovação de uma grande gravadora, nem de benesses do Estado. Dezoito anos de atividades só confirmam a precoce “maioridade” do Núcleo, assim como o sucesso de sua opção pela autonomia, pela independência artística.

Vale lembrar que o cenário musical dos anos 1990, em nosso país, era bem pouco favorável a quatro músicos jovens que se identificavam, em maior ou menor medida, com a música instrumental brasileira e com o jazz. As grandes gravadoras não perceberam que a estratégia comercial de investir pesado na hegemonia do sertanejo ou do pagode só poderia resultar em tiros nos próprios pés – basta ouvir a música que circula hoje, com poucas exceções, em rádios, TVs e casas noturnas. E a adesão deslumbrada de grande parte de nossa mídia aos modismos da música pop só fez piorar essa situação.

Por isso, cada vez que recebia um novo suplemento de discos produzidos pelo Núcleo, eu me sentia mais estimulado. O cuidado na escolha de repertório e nas gravações; o requinte das capas, afinadas com cada projeto; a qualidade da produção dos shows de lançamento dos álbuns; tudo isso sinalizava que ainda existia vida inteligente no medíocre mercado musical brasileiro do final dos anos 1990.

Hoje, quando já se tornou comum falar em empreendedorismo, é provável que muitas pessoas, especialmente das gerações mais jovens, nem imaginem o quanto era difícil para um músico se arriscar pelo caminho da autonomia, como fizeram os fundadores do Núcleo Contemporâneo. Por isso eu admiro mais ainda a garra e a perseverança de Benjamim Taubkin, hoje o único remanescente do grupo original.

Nesses anos todos, ele soube enfrentar as dificuldades econômicas e a descrença nos meios musicais, assim como o preconceito de parte da mídia contra a música instrumental. Conseguiu manter atuante essa pequena gravadora, que já lançou 45 discos de alta qualidade musical, além de ter distribuído outros tantos de artistas como Naná Vasconcelos, Marco Pereira, Hamilton de Holanda ou Ná Ozzetti, que dispensam apresentações.

Também é preciso muita coragem, disposição e amor pela música, para viabilizar um projeto como o da Casa do Núcleo – pequeno centro cultural, com uma compacta sala de espetáculos, que Taubkin e sua dedicada equipe de colaboradores vêm gerindo desde 2011, sem contar com patrocinadores. Qualquer espectador que já tenha acompanhado um show, oficina, debate ou leitura de poesias, na Casa, certamente vai concordar com o slogan “small is beautiful” (pequeno é bonito), que o próprio Taubkin (na foto abaixo) justifica tão bem:

"A ideia de crescimento ilimitado nos parece um desses grandes enganos do nosso tempo. Há que buscar ser sustentável e, ao mesmo tempo, manter-se pequeno. Há que dar espaço aos processos artesanais, trabalhar com números possíveis, entender o sucesso de uma outra forma”.

Por essas e outras, durante o belo show da última sexta-feira, fiquei imaginando como alguém que estivesse ali, sem conhecer a história do Núcleo ou seus discos, reagiria ao ver e ouvir aqueles 23 artistas, entre instrumentistas, cantores e poetas, agrupados em diversos projetos que abrangem música regional, canções e improvisos instrumentais. Provavelmente, o desavisado se encantaria com aquelas músicas tão diferentes das que circulam hoje por aí.

Difícil não se emocionar ao ouvir o introspectivo solo de piano de Taubkin, que abriu a noite, seguido pelos vocais e tambores do grupo Clareira. Vários improvisos marcaram as apresentações seguintes: do quarteto Fronteiras Imaginárias, que destaca o sax soprano do colombiano Antonio Arnedo, ao projeto Sons de Sobrevivência, com a percussão de Guilherme Kastrup, até o diálogo entre poesia e música do projeto Landscapes, com as intervenções dos poetas Natália Barros, Fábio Malavoglia e Marcelo Montenegro.

Envolvente também foi a apresentação dos músicos do coletivo Roda Gigante, que tocaram uma bela versão de “Drão” (Gilberto Gil), sucedida pelo encontro dos 23 músicos em um improviso coletivo, para encerrar a noite. Tomara que a alegria e as emoções dessa festa emprestem novas energias a Taubkin e à equipe do Núcleo para seguir produzindo outros eventos, shows e discos. Nossos ouvidos precisam muito dessas belezas musicais.

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