Quem poderia imaginar que, meio século após sua eclosão como uma variante instrumental da bossa nova, o samba-jazz voltaria a ser cultivado por novas gerações de músicos e apreciadores? No quarto volume da série “Speed Samba Jazz” (lançamento do selo Delira), o trio do pianista paulista Hamleto Stamato, com o baixista Ney Conceição e o baterista Erivelton Silva, segue a linha dos álbuns anteriores, combinando releituras de clássicos da bossa nova e da canção norte-americana.
Ao ouvir a agitada versão de “Softly as in a Morning Sunrise” (de Romberg e Hammerstein), quem não conhece essa canção, já recriada no passado por diversos jazzistas, pode até pensar que ela tenha nascido com batida de samba. Já as releituras de “Seascape” (Johnny Mandel) e “The Look of Love” (Burt Bacharach) são tingidas por Stamato com a típica melancolia do samba-canção. Entre as composições próprias do pianista, “Na Lapa” revive o sabor característico dos jazzificados sambas da década de 1960.
Hamleto Stamato Trio: o carisma do samba-jazz em novo CD do pianista paulista
Marcadores: Brazil, burt bacharach, erivelton silva, hamleto stamato, instrumental, johnny mandel, ney conceição, samba-jazz | author: Carlos CaladoDionne Warwick e Gal Costa: o esboço de um show em duo
Marcadores: burt bacharach, dione warwick, gal costa, música popular brasileira | author: Carlos Calado
O projeto de um show em duo já existe há mais de uma década, mas as carreiras de ambas o impediram de acontecer. Ainda não foi desta vez, mas, ao convidar Gal Costa para fazer uma participação especial em sua turnê por quatro capitais do país, a cantora Dionne Warwick, 68, esboça a parceria.
“Gal tem uma voz maravilhosa. Canta de uma maneira doce e simples, fácil de ouvir”, diz a norte-americana, lembrando que, mesmo depois de conhecer algumas gravações da brasileira, ficou impressionada ao ouvi-la pela primeira vez, ao vivo, em um concerto de Tom Jobim, em Los Angeles (EUA), no final dos anos 1980.
Reconhecida como a maior intérprete das canções de Burt Bacharach e Hal David, Warwick emplacou dezenas de sucessos nas paradas internacionais ao longo da década de 1960, como “Alfie”, “I’ll Never Fall in Love Again” e “The Girl’s in Love With You”, entre outras assinadas pela dupla.
Fã da música brasileira, já chegou a morar no Rio, na década passada. Em 1994, gravou o CD “Aquarela do Brasil”, que destaca canções de Ary Barroso e Tom Jobim. Em 2007, contou com Jorge Ben Jor, Ivan Lins, Milton Nascimento e Gilberto Gil, no show “Dionne Warwick & Amigos”, cuja gravação rendeu material para um DVD, que deve chegar ao mercado até o final do ano.
Como Gal não pôde participar daquele show, Warwick ainda planeja incluir no DVD algum dos números que vai fazer com ela nesta turnê. Mas não adianta perguntar o que vão cantar juntas, nem mesmo qual é o repertório deste show.
“Prefiro que seja surpresa”, diz a norte-americana, esquivando-se. Obviamente, não vão faltar canções de Burt Bacharach, certo? “Sim, vou cantar algumas”, confirma, rindo. Gal respeita a vontade da amiga e mantém o mistério, mas revela que entre as três canções que vai interpretar, na companhia do pianista Cristovão Bastos, há pelo menos uma de Tom Jobim.
Já quando se pergunta a miss Warwick (atual embaixadora de alimentos e agricultura mundial da ONU) o que a desagrada no Brasil, ela vai direto ao ponto. “A pobreza e a desigualdade social, mas esse não é um problema só do Brasil. Isso existe em quase o mundo todo”, afirma a cantora norte-americana.
(publicada na "Folha de S. Paulo", em 9/05/2009)
Burt Bacharach: de volta ao Brasil, aos 80 anos
Marcadores: burt bacharach, hal david | author: Carlos Calado
Quase uma unanimidade no mundo musical há mais de meio século, ele tem deixado sua marca nos discos e shows de artistas bem diversos, como a diva do soul Aretha Franklin, a dupla pop The Carpenters, o jazzista McCoy Tyner, a cantora e atriz Marlene Dietrich, o pianista da bossa nova Sérgio Mendes, o cantor e guitarrista de rock Elvis Costello, até os Beatles.
O autor dessa façanha é o compositor, pianista, arranjador, produtor e eventual cantor Burt Bacharach, 80, que toca hoje e amanhã, em São Paulo, no HSBC Brasil, depois de dez anos sem apresentar no país. No sábado (dia 18), ele encerra a turnê, tocando para o público carioca, no Vivo Rio.
Embora não tenha lotado o teatro do Sesi, em Porto Alegre, anteontem, o show do músico norte-americano levou às lagrimas parte da platéia, ao relembrar canções que freqüentaram as rádios e telas do cinema nas décadas de 60 e 70, como “Close to You”, “I Say a Little Prayer”, “What the World Needs Now Is Love” e “Alfie”.
Poucos compositores podem ostentar o título de hitmaker como ele. Setenta de suas canções entraram nas paradas de sucessos dos Estados Unidos entre as 40 mais tocadas nas rádios. Na Inglaterra, mais de 50 canções de Bacharach também conseguiram esse feito.
Com tantos hits no repertório, para não decepcionar os fãs que esperam ouvi-los nos shows, Bacharach costuma reuni-los em medleys, como fez em “Live at the Sydney Opera House” (Universal, 2008), seu CD mais recente, já lançado aqui.
O mais curioso é que, diferentemente do que se vê hoje no mercado musical, o autor de “Walk on By” e “The Look of Love” não tentava repetir o sucesso fazendo cópias disfarçadas de suas composições anteriores, nem seguia fórmulas estabelecidas por outros autores.
“Quando estávamos escrevendo, Burt e eu sempre tentávamos achar algo original. Não víamos graça em ser como os outros”, disse Hal David, seu letrista mais constante, à revista “Mojo”, em 1996. Quem já prestou atenção nas melodias assobiáveis, nas mudanças rítmicas e nas orquestrações criativas de Bacharach sabe que seu parceiro não estava dourando as pérolas que criaram.
(publicada na "Folha de S. Paulo", em 15/04/2009)
Diana Krall: sussurrando e derrapando no português, em "Quiet Nights"
Marcadores: bossa nova, burt bacharach, claus ogerman, diana krall, elvis costello, jazz, stacey kent, tom jobim | author: Carlos CaladoDiana Krall e outros cantores estrangeiros, que têm insistido em gravar em português, precisam conversar urgentemente com a cuidadosa Stacey Kent. Também uma fã assumida da música brasileira, essa norte-americana declarou, quando se apresentou aqui, no ano passado, que só pretende cantar em português depois de estudar a sério nossa língua e dominar sua pronúncia.
Por mais que sejam boas as intenções de Diana, sua suposta homenagem à música brasileira quase se transforma em piada, ao se ouvir tantas derrapadas na pronúncia dos versos da canção “Este Seu Olhar” (faixa do novo CD "Quiet Nights"). Suas tentativas de decalcar o sotaque carioca chegam a ser hilariantes. Tom Jobim, autor dessa canção, não merece. Nem mesmo os fãs brasileiros da cantora merecem ouvir algo assim.
Esse não é o único senão de “Quiet Nights”, que, de maneira geral, soa como uma seqüela pouco inspirada do álbum “The Look of Love” (2001). A começar pelo repertório um tanto óbvio, que inclui um costumeiro Burt Bacharach (“Walk on By”) e standards da canção norte-americana que já foram gravados centenas de vezes, inclusive de maneira mais criativa, por outros intérpretes do jazz.
Naturalmente, os arranjos do experiente Claus Ogerman ajudam a criar uma aura de consistência sonora, mas será que Diana pensou que só por ter transformado “Garota de Ipanema” em “The Boy from Ipanema” já conseguiu imprimir algo de novo a uma canção tão desgastada por décadas de redundância?
Outro aspecto que incomoda é a maneira como ela canta nessas gravações, quase sussurrando, com a voz mais grave do que em outros álbuns. A intenção da cantora é, obviamente, soar mais sensual, mas o resultado não convence, soa meio falso. Será que Elvis Costello levou a sério essa “carta de amor”?
(publicada na “Folha de S. Paulo”, em 8/04/2009)