A morte do contrabaixista norte-americano Charlie Haden, aos 76 anos, em julho deste ano, imprimiu um sentido melancólico ao título do álbum "Last Dance" (selo ECM, com distribuição no Brasil pela Borandá), lançado algumas semanas antes no mercado internacional. Será que Haden e o pianista Keith Jarrett, seu antigo parceiro, pressentiram no estúdio que se tratava de um derradeiro encontro de despedida?
As nove faixas que compõem esse disco foram registradas, de fato, em 2007. Das mesmas sessões de gravação já havia sido extraído o álbum “Jasmine” (lançado em 2010), que marcara o reencontro desses inventivos jazzistas, depois de tocarem juntos durante os anos 1970, no quarteto e no quinteto liderados por Jarrett.
Como em “Jasmine”, há algo de nostálgico na escolha do repertório, que reúne “standards” e clássicos do jazz. Temas evocativos, como “My Old Flame” (de Johnston e Coslow) ou “My Ship” (Kurt Weill e Ira Gershwin), permitem aos velhos amigos entabular um "bate-papo" musical sobre o passado comum.
“Round Midnight”, obra-prima do pianista Thelonious Monk, começa com um improviso de Jarrett, como se a "conversa" fosse flagrada já em curso. Mas, para a satisfação do ouvinte, o pianista se curva à beleza da melodia original e encerra a gravação de maneira reverente.
Composição de Gordon Jenkins que já fazia parte do disco anterior da dupla, a tristonha “Goodbye” encerra o álbum, em uma gravação alternativa, logo após a serena releitura de “Every Time We Say Goodbye” (de Cole Porter).
“Quero afastar as pessoas da feiura e da tristeza que nos cerca diariamente e trazer música profunda e bela para o maior número possível de pessoas”, declarou Haden, em 2013, ao receber um prêmio Grammy, já afastado dos palcos e estúdios, vítima de poliomielite. Este seu testamento musical não poderia ser mais fiel à sua vontade.
(Resenha publicada no "Guia Folha - Livros, Discos, Filmes", em 25/10/2014)
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