John Clayton: Baixista e arranjador de estrelas do jazz vem com seu grupo ao BMW Festival

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Ele fala com a mesma elegância e precisão que exibe há décadas ao dedilhar as cordas de seu baixo acústico. O nome do jazzista, arranjador e compositor americano John Clayton ainda não é reconhecido entre o grande público, mas se você é um apreciador do jazz, provavelmente, já o ouviu, acompanhando estrelas do gênero, como as cantoras Diana Krall, Natalie Cole ou Dee Dee Bridgewater.

Clayton será uma das atrações da segunda edição do BMW Jazz Festival, em junho, em São Paulo e no Rio de Janeiro. Virá ao país com o The Clayton Brothers, quinteto que criou com seu irmão saxofonista, Jeff Clayton, em 1977. “Quem for nos ouvir pode esperar por sons bem excitantes”, afirma o contrabaixista. “Não temos receio de tocar jazz com muito swing e um alto nível de intensidade. Mesmo quando tocamos algo mais romântico, não abrimos mão da intensidade sonora”.

Falando com exclusividade ao "Valor", por telefone, Clayton conta que tem boas lembranças de sua primeira visita ao país, em 2007, quando tocou com a banda da cantora e pianista canadense Diana Krall. “Tanto em São Paulo, como no Rio, pude ouvir música de excelente qualidade. Fiquei impressionado ao perceber como a música é tão importante no cotidiano dos brasileiros. Parece até que todo mundo dança e toca violão no Brasil. Foi uma viagem fantástica”.

Graças às amizades que construiu desde então com músicos brasileiros, como o violonista paulistano Chico Pinheiro ou o cantor e compositor carioca Ivan Lins (com o qual gravou um CD ao vivo, regendo a Metropole Orchestra, em 2009), Clayton vem se aproximando mais da música produzida em nosso país. “A convivência com esses amigos tem contribuído para que eu amplie meus conhecimentos sobre a música do Brasil, não só a música de hoje, mas a do passado também”, diz o jazzista americano. 



Nascido em Venice (Califórnia), Clayton tornou-se aos 16 anos aluno de Ray Brown (1926-2002), um dos maiores contrabaixistas do jazz, que passou a orientar sua formação, além de introduzi-lo no meio profissional. “Por meio dele conheci grandes músicos, como Milt Jackson, Henri Mancini, Monty Alexander e Count Basie. Ray foi como um pai para mim, talvez a figura mais importante do jazz na minha vida”, reconhece. Já na década de 1990 chegou a tocar ao lado de seu mestre no Superbass, grupo que também incluía o baixista Christian McBride.

Depois de viver cinco anos na Holanda, Clayton se radicou em Los Angeles, no final de 1984. Seu talento o levou a se tornar músico de estúdio, na concorrida área de trilhas sonoras para Hollywood. “Com o tempo, fui descobrindo que aquela vida não era ideal para mim”, admite. Na mesma época, criou com seu irmão saxofonista e o baterista Jeff Hamilton, a Clayton-Hamilton Jazz Orchestra. Com ela, passou a gravar e a fazer concertos ao lado de conceituadas cantoras, como Carmen McRae, Nancy Wilson e Gladys Knight.

“Gravar música para cinema era fantástico, mas não permitia que eu pudesse me expressar como músico. É por isso que costumo dizer que o jazz salvou minha vida. Talvez eu também pudesse me expressar em outro gênero, como a música clássica ou a música brasileira, mas para mim o jazz é a forma mais simples que eu tenho de me expressar”, diz o líder e contrabaixista.

Desde então, Clayton seguiu tocando com cantores – diferentemente de alguns de seus colegas mais radicais, nos círculos do jazz, que costumam depreciar a música dos intérpretes vocais. “O que realmente me atrai ao tocar com eles é, não só o som da voz do intérprete, mas também o fato de você poder se aproximar mais do significado de uma canção, por meio dos versos”, afirma. “Além disso, não quero apenas tocar em trio ou com os Clayton Brothers pelo resto da minha vida. Também quero fazer outras coisas”, comenta o arranjador, que se considera um discípulo de “band leaders”, como Duke Ellington, Quincy Jones, Gil Evans e Oliver Nelson.

Quem já teve a oportunidade de ouvir os discos do quinteto The Clayton Brothers, ou assistiu a alguma de suas apresentações, deve ter notado a comunicação quase telepática entre John Clayton e seu irmão Jeff. “Quando tocamos alguma coisa, não preciso dizer a ele o que estou procurando, porque ele já sabe. Se ele toca alguma coisa, é fácil para mim reconhecer a base daquilo, porque frequentamos a mesma escola, a mesma igreja, ouvimos nossa mãe tocando piano junto conosco. Acho que realmente pode existir algo parecido com telepatia entre membros de uma família”, reconhece.

Sobre a cena atual do jazz, Clayton tem uma visão bastante positiva. “Acho que este é um bom momento, com músicos jovens fazendo coisas interessantes, especialmente em termos rítmicos. Na área da performance, os músicos jovens sabem muito mais do que eu quando tinha a mesma idade deles”, compara. “Também acho interessante ouvir diferentes influências, como a do hip hop ou da música da Europa Central, nessa geração. Não pretendo, necessariamente, tocar esse tipo de música, mas gosto de ouvi-la”.

A segunda edição do BMW Jazz Festival será realizada de 8 a 10/6, no Via Funchal (São Paulo) e de 11 a 13/6, no Teatro Oi Casagrande (Rio). A programação destaca músicos de jazz de vários estilos e gerações. Entre os veteranos, o trio formado por Chick Corea (piano), Stanley Clarke (baixo elétrico) e Lenny White (bateria) promete resgatar clássicos da fusion dos anos 70 e 80. O quarteto liderado pelo saxofonista Charles Lloyd, reúne talentos mais jovens, como Jason Moran (piano), Reuben Rogers (baixo) e Eric Harland (bateria).

Revelação recente da cena jazzística de Nova York, o trompetista Ambrose Akinmusire virá com seu quinteto. O compositor e arranjador canadense Darcy James Argue, que trará sua orquestra, também se revelou há pouco. Formado no ano passado, o grupo Ninety Miles reúne músicos jovens e criativos: os americanos Stefon Harris (vibrafone) e Christian Scott (trompete), o porto-riquenho David Sánchez (saxofone) e o cubano Harold López Nussa (piano), que buscam aproximar o jazz da música cubana.

Mais perto da black music e do rock, o multi-instrumentista e vocalista Trombone Shorty é uma das surpresas recentes da cena musical de New Orleans. Já o saxofonista Maceo Parker, o trombonista Fred Wesley e o saxofonista Pee Wee Ellis mantém vivos o funk e o rhythm & blues de James Brown, de cuja banda fizeram parte. Única representante nacional, a dupla de acordeonistas Toninho Ferragutti e Bebê Kramer promete fazer um tributo à moderna sanfona brasileira. Outras informações no site do evento:
www.bmwjazzfestival.com.br

(texto publicado no caderno Eu & Fim de Semana, no jornal "Valor", edição de 25/5/12)

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