Nos últimos dois anos, ele se viu privado de um de seus maiores prazeres. Algo que Johnny Alf fazia quase todas as noites desde a década de 50: tocar piano e cantar suas sofisticadas composições, nos melhores palcos e casas noturnas do país.
Refeito da batalha contra um tumor de próstata, o músico e precursor da bossa nova se apresenta hoje e amanhã, no Sesc Vila Mariana, em São Paulo. A seu lado terá três convidados: o saxofonista Idriss Boudrioua e as cantoras Leny Andrade e Alaíde Costa, que interpretam suas canções há décadas.
“Quero continuar minha carreira e voltar a compor”, diz Alf, prestes a completar 80 anos.
Quem sabe de seu pioneirismo na música brasileira achou injusto que você tenha aparecido tão pouco nas comemorações do cinqüentenário da bossa nova. O que pensa sobre isso?
Johnny Alf - Como eu estava meio acamado, não tive a possibilidade de sair muito para tocar. O que pude fazer, eu fiz. Foi legal.
Como foi ficar longe dos palcos?
Alf - Foi difícil, um desespero, mas como era uma questão de saúde, tive de aceitar. Compreendi que era necessário me afastar para poder me recuperar.
Você até se desfez de sua discoteca. Chegou a ficar desiludido com a música?
Alf - Fiz isso porque cansei de ouvir música. Eu era tão viciado em ouvir música que isso até me prejudicava, porque eu até me atrasava para fazer outras coisas. E quando precisava mudar de casa, os discos viravam um problema. Mas ainda tenho tudo que ouvi em minha cabeça.
João Donato disse, no ano passado, que não agüentava mais falar em bossa nova, que gosta mesmo é de jazz. Sua ligação com o jazz também foi forte, não?
Alf - Sempre toquei no meu estilo. O jazz eu usava de vez em quando, mas meu forte mesmo é a música brasileira. Cresci ouvindo rádio, então fui determinado pela música de Custódio Mesquita, Ary Barroso, Caymmi e outros. O jazz eu adquiri porque, quando era jovem, via aqueles filmes americanos que me impregnaram bastante. Tive a idéia de juntar a música brasileira com o jazz. Tento juntar todas [influências] para conseguir um resultado agradável.
Acha que a história da criação da bossa nova está bem contada?
Alf - Eu sempre fiquei à parte. As pessoas estavam lá, mas eu ficava na minha. Acho engraçado quando as pessoas começam a se eleger, mas não porque eu quero reclamar algo para mim. Eu fazia música porque tinha vontade de fazer. Não me ligo nesse negócio de títulos. Toco sem a intenção de reivindicar algo.
Está contente com o crédito musical que recebeu até hoje?
Alf - Fico satisfeito, pelo menos não sou esquecido de todo. Minha música sempre foi considerada difícil. As gravadoras sentiam o valor da minha música, embora não tivesse o apelo comercial que elas gostariam.
É verdade que pensou em trocar seu nome artístico, nos anos 50?
Alf - Adquiri o apelido Johnny Alf quando tocava no Instituto Brasil Estados Unidos, no Rio. Pensei em trocá-lo por Alfredo José, meu nome verdadeiro, quando comecei a tocar na noite. Mas o pessoal já me conhecia por Johnny, até porque eu tocava muito jazz. Valeu a pena.
Chegou a enfrentar preconceito racial ou por ter influências norte-americanas em sua música?
Alf - Isso nunca aconteceu comigo, sempre fui bem recebido. As pessoas que freqüentavam os lugares em que eu tocava também tinham preferência pela música americana.
Você completa 80 anos em maio. Como encara essa idade?
Alf - Estou satisfeito, porque ainda sou bem conhecido e requisitado. Meus discos estão sendo relançados com sucesso. Estou no caminho que sempre desejei.
(entrevista publicada na “Folha de S. Paulo”, em 31/01/2009)
Johnny Alf: pioneiro da bossa nova retorna aos palcos
Marcadores: alaíde costa, Ary Barroso, bossa nova, Caymmi, Custódio Mesquita, jazz, johnny alf, leny andrade | author: Carlos CaladoPosts Relacionados:
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