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Hamilton de Holanda: em fase de alta produção, bandolinista lança três álbuns

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Se você ainda não conhece a música de Hamilton de Holanda, já está mais do que na hora. Esse bandolinista e compositor brasiliense, radicado no Rio de Janeiro, é hoje um dos mais criativos expoentes da música instrumental brasileira, reconhecido também em vários países da Europa e nos EUA, onde tem se apresentado. Hamilton costuma dizer que, para ser acessível sem perder a sofisticação, a música precisa ser simples. Um princípio estético que tem tudo a ver com sua personalidade.

Esta entrevista foi realizada, em Olinda (PE), durante a última edição do festival Mimo, onde Hamilton se apresentou ao lado do pianista italiano Stefano Bollani. 

Você tem lançado mais de um disco por ano e, nos últimos meses, saíram três novos álbuns seus: “O Que Será” (pelo selo ECM), com o pianista italiano Stefano Bollani; “Mundo de Pixinguinha” (selo Rob Digital), com diversos convidados; e “Trio” (selo Brasilianos), do seu grupo. Como você explica essa produção tão intensa?
 
Hamilton de Holanda - A vida é movimento. Eu me sinto num momento bem produtivo e não vou me podar, mesmo que isso possa até incomodar algumas pessoas. Já ouvi fãs reclamarem de não ter dinheiro para comprar todos os meus discos. Alguns dos meus CDs estão à venda em lojas ou no iTunes, mas outros estão em meu site, de graça. Daqui a dez ou vinte anos, quero poder olhar pra eles sem ficar pensando que poderiam ter ficado melhores. Quando termino um disco, costumo me desapegar dele. Tenho consciência de que fiz o melhor naquela época.

Como surgiu seu duo com o pianista Stefano Bollani?

HH - Quando eu morava na França, ganhei um disco do Bollani que tinha composições dele, bem diferentes e com harmonias muito bonitas. Na última faixa, ele cantava “Trem das Onze”, do Adoniran [Barbosa], em italiano. Aí pensei: um dia vou cruzar com esse cara e tocar com ele. Não deu outra: em 2009, fui tocar em um festival em Bolzano, na Itália, e participei de um show do Bollani. Tocamos uma do Baden [Powell] e uma do Egberto [Gismonti]. Desde então já fizemos mais de 50 shows juntos. Gosto muito de tocar com ele. Fora o grande musico que o Bollani é, além de todo o conhecimento que ele possui do instrumento, tem muito humor na música que ele faz.

Vocês sempre tocam o repertório desse disco nos shows?

HH - Nós até repetimos uma ou outra música, alguma dele, alguma do Pixinguinha, mas sempre tocamos outras diferentes. Assim o show sempre traz surpresas para o público, mas também gostamos de [criar] surpresas para a gente. “O Que Será” é a gravação do último show de um giro que demos pela Europa, no ano passado. Foi gravado em um festival na Antuérpia, que comemorou os 90 anos do gaitista Toots Thielemans, com umas 5 mil pessoas na plateia. Foi uma noite muito especial.

O álbum “O Que Será” foi lançado pelo ECM, um dos selos independentes mais cultuados na área do jazz e da música instrumental. Você também é fã dos discos do ECM? Como é que se deu esse contato?

 
HH - Sim. Todo cara, que gosta de jazz, gosta do “Koln Concert”, do Keith Jarrett, por exemplo. Ou dos discos do Egberto (Gismonti), do Naná (Vasconcelos) e do Jan Garbarek. O Bollani já tinha um disco lançado com o Chick Corea pela ECM – esse foi o nosso canal. Ele mandou a gravação para o Manfred Eischer [criador e diretor do selo], que adorou. Os dois foram para a Noruega e mixaram o disco em Oslo.

Em “Mundo de Pixinguinha” você toca em duos com um elenco internacional de convidados, como os pianistas cubanos Chucho Valdés e Omar Sosa, o acordeonista francês Richard Galliano, o trompetista norte-americano Wynton Marsalis e o próprio Bollani, entre outros. Como foi a produção desse trabalho?

HH - O processo de criação desse disco foi mais coletivo, até porque envolveu muitos convidados. É um projeto meu, com o meu empresário, o Marcos Portinari, e a produtora Lu Araújo. A ideia surgiu em Brasília, na inauguração de uma exposição sobre o Pixinguinha. O projeto inicial era gravar com três pianistas, mas, de repente apareceu o Wynton, e gravamos o Mário Laginha, quando estive em Lisboa. Depois pensamos que também tínhamos que convidar músicos brasileiros, então entraram o [pianista] André Mehmari, a [flautista] Odette Ernest Dias e o [saxofonista e flautista] Carlos Malta. Foi um processo bem trabalhoso, mas muito divertido. A ideia é justamente expandir um pouco o universo da música do Pixinguinha.

Alguma surpresa durante as gravações? 

 
HH - Eles [os convidados estrangeiros] ficaram encantados. Quando estávamos tocando “Lamentos”, o Chucho [Valdés] parou no meio da gravação, emocionado. O [Richard] Galliano me disse que a música do Pixinguinha pode ser antiga, mas, além de popular, é uma música elaborada, o que permite que ela possa soar eterna, atemporal.

Você tem tocado e gravado em duos, com frequência. O que atrai você nesse formato instrumental? 

 
HH - Eu aprendi a tocar com o meu pai, em casa. Então, mesmo que eu não pense nisso, o duo sempre vai estar presente na minha vida. Tocar em duo é uma relação muito íntima. Tocar sozinho é a intimidade no máximo, mas é uma coisa muito solitária. O duo mantém essa intimidade, mas com alguém. Existe uma cumplicidade muito grande no duo. Tocar em duo também permite dividir a música com outra pessoa. Tenho isso em mim desde pequeno. Meu pai dizia que, se você aprender a tocar um instrumento, vai fazer muitos amigos na vida.

(Versão completa da entrevista publicada no “Guia Folha - Livros, Discos, Filmes”, em 26/10/2013) 


10° MIMO: Macalé, Gil e um belo concerto de Hamilton de Holanda e Bollani, em Olinda

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                                         Stefano Bollani e Hamilton de Holanda, no Mimo, em Olinda

Bastava ver o nome de Gilberto Gil, no programa na 10ª edição do festival Mimo, em Olinda (PE), para se prever que a noite do último sábado seria a mais concorrida. Surpresa mesmo, para muitas das cerca de 20 mil pessoas que se espremeram na praça do Carmo, foi o irresistível show de Jards Macalé, autor de grandes canções dos anos 1970, como “Vapor Barato” (com Waly Salomão) e “Movimento dos Barcos” (com Capinan), que abriu a noite, no mesmo palco. 

Comandando a Let’s Play That, banda bem jovem e com pegada de rock, Macalé (na foto ao lado) conquistou logo a plateia. Foi seguido por ela, em “Eu Só Quero um Xodó”, na homenagem que fez ao sanfoneiro Dominguinhos, morto em julho. Mas o grande momento veio com “Canalha”, canção de Walter Franco resgatada por Macalé, que soa muito atual. Nem foi preciso mencionar os defensores de corruptos no Congresso, para que o grito furioso – “canalha!“ – explodisse.

Talvez um teatro fosse mais conveniente para o criativo show da Orquestra de Sopros da Pro Arte, baseado na obra de Gilberto Gil, que também já rendeu um DVD. Parte da plateia já estava bem inquieta, depois de ouvir arranjos instrumentais de canções como “Roda”, “Procissão” e "Amor Até o Fim”. Mas bastou que o compositor baiano entrasse em cena para que a tensão se dissolvesse. Sucessos como “Domingo no Parque”, “Expresso 2222” e “Parabolicamará” foram cantados em coro com Gil, que também dividiu o palco com o flautista Carlos Malta (na foto abaixo, à direita).


A melhor noite do Mimo em Olinda destacou também, na lotada Igreja da Sé, o belo concerto do acordeonista francês Richard Galliano com o Quinteto da Paraíba. No programa, “As Quatro Estações”, de Vivaldi, foram seguidas pelas “Estações Portenhas”, de Piazzolla, que emocionaram a plateia. Galliano (na foto baixo) e o conjunto de câmara, que também homenagearam Dominguinhos com o tango “Oblivion”, tiveram que voltar três vezes ao palco.

Na mesma Igreja da Sé, na sexta-feira, a plateia também não queria que o bandolinista Hamilton de Holanda e o pianista Stefano Bollani deixassem o palco. O virtuosismo do brasileiro e o humor inventivo do italiano brilharam nas releituras de “Lôro” (Egberto Gismonti), “Rosa” (Pixinguinha) e “As Rosas Não Falam” (Cartola), entre vários clássicos da MPB.

“Dizer que há uma grande empatia entre o Hamilton e eu parece retórica, mas tudo foi muito fácil desde a primeira vez que toquei com ele. Por serem dois instrumentos harmônicos, a relação entre o bandolim e o piano não é fácil, mas, ao tocar com o Hamilton, eu me sinto conversando com um amigo”, disse Bollani à "Folha", logo após o concerto. O primeiro álbum da dupla, “O Que Será” (ECM), acaba de ser distribuído no Brasil pelo selo Borandá. 


Depois de incluir as cidades de Ouro Preto e Paraty na programação, a produtora Lu Araújo, que criou o Mimo em 2004, diz que ainda não sabe se o evento vai se expandir mais, nos próximos anos. “Outras cidades históricas, como Mariana, Angra dos Reis e Amparo, já nos procuraram, mas, como o festival é artesanal, precisamos avaliar muito bem uma decisão como essa”, comenta.

Segundo ela, o fato de programar atrações mais próximas dos universos da canção e da música pop na programação deste ano, como o rapper carioca BNegão ou a banda francesa Nouvelle Vague, não descaracteriza o evento, que nasceu como uma mostra internacional de música instrumental. “A voz também é um instrumento. A música instrumental também pode soar como rock ou música eletrônica”, argumenta Lu Araújo.


(reportagem publicada na edição online da "Folha de S. Paulo", em 9/9/2013)

 

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