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Jazzmeia Horn: cantora-revelação do jazz exibe seu talento em estreia brasileira

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                                                                  A cantora Jazzmeia Horn e o pianistaTadataka Unno 

Jazzmeia Horn não esperava uma reação tão calorosa da plateia brasileira. Ontem, em sua primeira apresentação no país, ao anunciar à plateia do Teatro Bradesco (em São Paulo) que iria iniciar o show com “Free Your Mind”, a jovem cantora norte-americana foi surpreendida por uma fã. Ao ouvi-la cantarolar a melodia dessa canção de sua autoria (que também abre o recém-lançado “Love and Liberation”, seu segundo álbum), Jazzmeia arregalou os olhos e abriu um sorriso.

Mas quem mais se surpreendeu na noite de ontem foram mesmo aqueles que, sem conhecer bem a música de Jazzmeia, estavam ali porque se animaram ao ver algum anúncio do show. Ou porque já a tinham ouvido na programação da Eldorado FM, rádio paulistana que tem tocado “No More” (de Hubert Laws e Jon Hendricks), canção de forte influência da soul music, que também estava no repertório do show.

Aos 28 anos, Jazzmeia é bem mais do que uma promissora cantora-revelação. Dona de uma voz privilegiada, cuja extensão cobre quatro oitavas, ela mistura em suas criativas improvisações influências de grandes cantoras do jazz (Sarah Vaughan, Betty Carter, Abbey Lincoln, entre outras), do R&B e do hip-hop (Erykah Badu, Ledisi), em meio a espetaculares exibições de “scat singing” (estilo de vocal improvisado a partir de sílabas sem sentido).   


Marcante também é a influência de Rachelle Ferrell, inovadora vocalista de jazz e R&B, que despontou na década de 1990 com um estilo muito original, mas nunca chegou a receber o reconhecimento que mereceria. Jazzmeia não esconde, em entrevistas (como a que fiz com ela para o jornal “Valor”, neste link), que Rachelle é sua favorita – algo evidente, aliás, nos efeitos vocais desenvolvidos por ela, que sua discípula reproduziu em vários momentos da apresentação de ontem.

Falante e bem-humorada, Jazzmeia introduz quase todo o repertório do show, contando causos ou dando detalhes sobre as canções. Antes de interpretar uma emotiva versão de “Green Eyes”, de Erykah Badu, comenta que ambas nasceram em Dallas, no Texas. Conta como sua relação com as duas filhas pequenas inspiraram a canção “When I Say”. Ou ainda revela como a mania de uma colega de quarto da universidade, que insistia em manter as janelas da casa abertas, levou-a a compor sua canção “Legs and Arms”.

Já quase ao final do show, sorrindo, ela avisa que vai “tentar” fazer um samba. Então surpreende mais uma vez a plateia, com um inusitado arranjo de “Night and Day” (de Cole Porter), alternando levadas de samba com outra mais jazzística. E ainda esbanja graça e leveza, de cima de seus altíssimos saltos, arriscando passos de samba.

Não deu outra: depois de aplaudir muito, a plateia a obrigou a voltar ao palco para o bis com a energética versão de “Tight” (de Beth Carter), outro luminoso clássico de seu repertório. Tudo indica que Jazzmeia tem um futuro brilhante à sua frente.

Como grandes cantoras costumam dividir o palco com instrumentistas de alto nível, ela não deixa por menos. Seu quinteto, formado por músicos jovens, destaca os talentos de Tadataka Unno (piano), Irwin Hall (sax alto e flauta), Adonis Rose (bateria) e Rashaan Carter (contrabaixo). Tomara que Jazzmeia e seus músicos retornem logo ao Brasil.

Jazzmeia Horn: cantora e compositora é herdeira de grandes vozes do jazz

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                                               A vocalista Jazzmeia Horn - Foto de Jacob Blickenstaff/Divulgação  

Os apreciadores do jazz ainda não tinham visto e ouvido, nesta década, uma vocalista jovem tão surpreendente e bem-dotada como ela. Depois de vencer a competição do conceituado Instituto Thelonious Monk, em 2015, a cantora Jazzmeia Horn vem excitando plateias com seus improvisos vocais. Na próxima semana, fará suas primeiras apresentações no Brasil: dia 10 (quinta), no Teatro Bradesco, em São Paulo; e dia 11 (sexta), no Theatro Municipal do Rio de Janeiro.

“Penso que estou dando continuidade a um legado, a uma tradição familiar”, diz a vocalista e compositora de 28 anos, que cresceu em uma igreja batista de Dallas, no Texas, cujo pastor era seu avô. Jazzmeia acredita que a avó, organista, lhe transmitiu o dom musical ao sugerir seu inusitado nome de batismo. Embora adorasse jazz e blues, a avó não pôde se dedicar à música não religiosa por ser a primeira dama da igreja.

Foi só na adolescência que Jazzmeia descobriu e se envolveu com o jazz. “Eu pensava que o jazz era música de gente velha, porque os jovens que eu conhecia só ouviam hip hop e r&b. Isso aconteceu porque as rádios americanas, com exceção de poucas emissoras especializadas, deixaram de tocar jazz. Se não tivessem discos de jazz nas casas de suas famílias, os jovens de minha geração não podiam ouvir jazz”.

Jazzmeia tinha 14 anos, quando recebeu de um professor um CD com gravações de diversos cantores e músicos de jazz. Fascinada pelos sofisticados vocais de Sarah Vaughan (1924-1990), passou meses ouvindo os discos dessa grande intérprete, para reproduzir seu “scat singing” (maneira improvisada de cantar, usando sílabas sem sentido). Com o tempo percebeu que ouvir solos de instrumentistas também poderia inspirá-la no desenvolvimento de seu próprio estilo vocal.

“Gosto de saxofonistas, mas tenho uma coisa especial com os trompetistas”, brinca a cantora, ao explicar que sua afinidade musical com o trompete tem a ver com o timbre e a sonoridade desse instrumento, além da extensão melódica. “Para mim é bem mais fácil cantar as mesmas notas de um trompete do que, por exemplo, cantar as notas de um saxofone. Além disso, adoro a liberdade e a fluidez que o trompete oferece para se improvisar”, afirma.

Depois da obsessão inicial por Sarah Vaughan, Jazzmeia ampliou suas paixões e referências vocais. Em seus dois álbuns, “Social Call” (2017) e o recém-lançado “Love and Liberation”, não é difícil perceber influências de outras grandes cantoras do gênero no passado, como Betty Carter, Ella Fitzgerald e Abbey Lincoln. Outra marcante influência vem de Rachelle Ferrell, cantora de jazz e R&B com um estilo vocal bastante original, que Jazzmeia não esconde ser a sua favorita.

“Quando a ouvi cantar pela primeira vez, fiquei chocada. Não só pela habilidade dela ao fazer tudo que consegue fazer com a voz, mas também pelo uso do corpo. Adoro sua presença no palco, a intimidade que ela estabelece com a plateia e a maneira como se comunica com seus músicos. Tudo isso em um pacote completo. Uma pena que Rachelle não tenha recebido todo o reconhecimento que merece. Ela me inspirou tremendamente”, afirma.

O repertório de Jazzmeia não se limita ao material mais clássico do jazz. Além de eventuais composições próprias, ela combina releituras bem pessoais de standards, como “East of the Sun (West of the Moon)” ou “I Remember You”, com pérolas de grandes jazzistas, como “Tight” (Betty Carter), “Moanin’” (Bobby Timmons) e “Afro Blue” (Mongo Santamaria). Ou ainda versões de sucessos da soul music e do r&b, como “People Make The World Go Round” (do grupo vocal Stylistics) ou “I’m Going Down” (da cantora Mary J. Blige).

“Quando seleciono uma canção, o que mais me atrai de imediato é o ‘feeling’ (sentimento). Nada a ver com os versos, nada a ver com a melodia, mas principalmente com o que eu sinto ao ouvi-la”, diz a cantora, justificando suas escolhas. “Se a canção me dá vontade de dançar, se ela é positiva ou transmite felicidade, é bem provável que eu a escolha na hora, mas isso varia. Às vezes alguma coisa especial na letra de uma canção também pode me estimular a cantá-la”.

Dizendo-se “muito feliz” por ter sua primeira oportunidade de conhecer o Brasil, ela surpreende ao revelar que pratica capoeira, além de ter feito parte de um grupo de maracatu durante três anos, no descolado bairro do Brooklyn, em Nova York. “Essa viagem é muito importante para mim, porque vou poder conhecer melhor a capoeira e o maracatu no lugar onde nasceram”, festeja a cantora, que já reservou alguns dias para conhecer a Bahia.

Jazzmeia Horn
Dia 10/10 (quinta), às 21h, no Teatro Bradesco, em São Paulo. Ingressos de R$ 50 a R$ 260
Dia 11/10 (sexta), às 20h, no Theatro Municipal, no Rio de Janeiro. Ingressos de R$ 80 a R$180

(Texto publicado no caderno cultural do jornal "Valor", em 4/10/2019)



Festival de Jazz de São Paulo, 1980: Cultura FM põe na web gravações do lendário evento

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                                        Betty Carter, no 2º Festival Internacional de Jazz de São Paulo, em 1980

A rádio Cultura FM (103.3) está prestando um precioso serviço de utilidade pública, em especial para os fãs do jazz e da música instrumental brasileira. A emissora paulista disponibilizou em seu site cinco compilações com áudios extraídos de shows do lendário Festival Internacional de Jazz de São Paulo, realizado em 1980. Esse material histórico inclui também álbuns de fotos dos artistas clicadas durante o evento.

Quem teve a sorte de estar na plateia do Palácio das Convenções do Anhembi, nas duas edições do evento realizadas em 1978 e 1980, sabia que jamais esqueceria daqueles festivais – até porque eventos desse gênero ainda eram novidade no Brasil. Também transmitido ao vivo para quase todo o país pela TV Cultura e afiliadas, esse festival permitiu que muitos brasileiros, especialmente jovens, abrissem os ouvidos para um gênero musical que ainda atingia apenas pequenos círculos de apreciadores. 

A parceria com o eclético Montreux Jazz Festival (realizado até hoje, anualmente, na Suíça) permitiu a vinda ao Brasil de um elenco de atrações de primeira linha, não só do jazz, mas também do blues, do R&B, do reggae, até do tango, como Dexter Gordon (na foto à esquerda), o grupo Mingus Dinasty, Betty Carter, Dizzy Gillespie, Chick Corea, Al Jarreau, George Duke, Larry Coryell & Philip Catherine, John McLaughlin, Ahmad Jamal, Stan Getz, Benny Carter, Taj Mahal, Etta James, Peter Tosh e Astor Piazzolla, entre outros. 

Marco na cena cultural paulistana, esse festival estimulou a formação de novas plateias, não só para o jazz e gêneros afins, mas também para a música instrumental brasileira, que vivia naquele momento uma fase de renovação e muita criatividade. Hermeto Pascoal, Egberto Gismonti, Mauro Senise, Hélio Delmiro, Gilson Peranzzetta, Nivaldo Ornelas, Toninho Horta, Paulo Moura, Maurício Einhorn, Márcio Montarroyos, Wagner Tiso, Nelson Ayres, Roberto Sion e os grupos Azimuth, D’Alma, Divina Increnca e Grupo Um estavam entre as atrações do evento. 

Parabéns a Vilmar Bittencourt, da equipe da Cultura FM, pela iniciativa de recuperar essas gravações. Aliás, tomara que a TV Cultura siga o exemplo e também disponibilize, em som e imagem, os registros daquelas noites inesquecíveis no Anhembi.

Este é o link para ouvir as gravações no site da Cultura FM:

http://culturafm.cmais.com.br/cultura-jazz/jazz-ao-vivo-na-rtc 






Jazz moderno: pacote Atlantic/Reprise reedita álbuns inéditos no Brasil

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Desde a grave crise que abateu a indústria fonográfica, no início deste século, edições de discos de jazz tornaram-se mais raras, no Brasil. Essa conjuntura só aumenta a surpresa pelo lançamento de um pacote de 10 álbuns do selos Atlantic e Reprise, com jazzistas do primeiro time.

Quase todos esses títulos são inéditos no mercado brasileiro, tanto no formato CD, como em vinil. Embalados em atraentes capas de papel (só faltaram encartes com reproduções dos diminutos textos das contracapas, para que o leitor não precise recorrer a uma lupa), os 10 discos exibem diversos estilos do jazz moderno, em gravações realizadas entre as décadas de 1950 e 1970.

“The Clown” (1957), de Charles Mingus, é o álbum mais antigo do pacote, mas “Haitian Fight Song”, sanguínea composição desse contrabaixista, soa como se fosse gravada ontem. Já na faixa-título, o irônico Mingus provoca seus colegas: com o auxílio de um narrador, compara-os a um palhaço que tenta agradar as plateias, sem sucesso. 


 Em “The Avant-Garde”, gravado em 1960, mas lançado só seis anos mais tarde, o saxofonista John Coltrane e o trompetista Don Cherry expressam admiração pela música livre do vanguardista Ornette Coleman. Com Charlie Haden (baixo) e Ed Blackwell (bateria), também integrantes do grupo de Coleman, tocam composições deste pioneiro do “free jazz”.

Os pianistas Keith Jarrett, Gil Evans e Joe Zawinul têm algo em comum, nos seus currículos, que muitos invejariam: foram parceiros do inventivo Miles Davis. No álbum “Svengali” (1973), à frente de sua orquestra compacta e eletrificada, Evans relê o elegante arranjo do clássico “Summertime”, que gravou com Miles, em 1958. Ao ouvir “Blues in Orbit”, fica fácil entender porque Evans é considerado um dos maiores arranjadores do jazz. 


Joe Zawinul também relembra sua parceria com Miles, na etérea “In a Silent Way”, em meio a outras composições próprias. Há quem aponte o álbum “Zawinul” (1971) como registro de nascimento da influente banda de jazz-rock Weather Report, da qual o pianista foi co-fundador, com o saxofonista Wayne Shorter e o percussionista Airto Moreira.

No álbum “El Juicio” (1975), Keith Jarrett exercita seu ecletismo, à frente do excelente quarteto com Paul Motian (bateria), Charlie Haden (baixo) e Dewey Redman (sax tenor). Diverte-se com o percussivo tema “Gipsy Moth”, reverencia a tradição do ragtime, em “Pardon my Rags”, e mergulha no jazz de vanguarda, em “Piece for Ornette”.

Lançado em 1963, “Afro-Bossa” traz 11 temas de Duke Ellington e de seu parceiro Billy Strayhorn, inspirados pelas turnês da orquestra por vários continentes. A faixa-título não tem nada a ver com bossa nova, mas “Purple Gazelle” e “Absinthe” são pequenas joias musicais.


Já sem seu popular quarteto dos anos 1950 e 60, o pianista Dave Brubeck surge, em “All The Things You Are” (1973), com uma formação inusitada que destaca dois saxofonistas: o moderno Lee Konitz e o vanguardista Anthony Braxton. E no repertório, nada de temas próprios – só “standards”.

O pacote inclui ainda três vocalistas. Em “Round Midnight” (1962), o vozeirão expressivo de Betty Carter brilha, em arranjos orquestrais de Oliver Nelson e Claus Ogerman. Trombonista de primeira linha, Frank Rosolino se mostra bem à vontade, ao cantar standards, em “Turn Me Loose!” (1962). Finalmente, em “Portrait of Carmen” (1968), Carmen McRae encara um repertório orientado para o pop, que não faz jus à sua bagagem jazzística. Várias dessas canções medíocres já viraram pó, mas Carmen será lembrada para sempre.


(Resenha publicada originalmente no "Guia Folha - Livros, Discos e Filmes", publicada em 29/03/2014)

 

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