6º Copafest: riqueza da música instrumental brasileira brilha em evento no Rio

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                                                                               O grupo instrumental Som Imaginário


Só por ter incluído em sua programação uma homenagem musical ao hoje quase esquecido maestro e arranjador paulista Erlon Chaves (1933-1974), o 6º CopaFest – que terminou na madrugada do último domingo, no salão do hotel Copacabana Palace, no Rio de Janeiro – já teria provado sua relevância cultural.

Assim como fez na edição de 2011, quando tirou o produtor e arranjador Lincoln Olivetti de um longo período de ostracismo, o CopaFest resgatou neste ano a original contribuição de um artista, que o preconceito racial e o moralismo quase extirparam da história da música popular brasileira, ainda nos anos 1970.

Durante o show-baile do sábado, o guitarrista e cantor Max de Castro (na foto acima) até poderia ter falado um pouco sobre o legado de Erlon Chaves, cuja obra certamente era desconhecida por parte da plateia. Max preferiu ser prático: antes mesmo de relembrar sucessos como “Cosa Nostra” ou “Eu Também Quero Mocotó” (de Jorge Ben), já tinha conquistado o salão com o suingue do maestro e pioneiro da black music brasileira.
 

À frente da afiada banda Esquerda Festiva, o elétrico guitarrista revisitou outros clássicos do repertório da Banda Veneno, veículo dos arranjos de Erlon, que misturam soul, jazz e a malandragem do samba, como “Vou Deitar e Rolar” (Baden Powell e Paulo César Pinheiro) e “De Noite na Cama” (Caetano Veloso). Não faltaram também arranjos da fase bossa nova do maestro, que trabalhou com Elis Regina e Wilson Simonal, representada por “Balanço Zona Sul” (Tito Madi). 

Dizendo-se emocionado por estar a uma quadra do lendário Beco das Garrafas, onde sua carreira emergiu de vez com a onda do samba-jazz, no início dos anos 1960, o veterano trombonista Raul de Souza (na foto acima com o baixista Glauco Solter) fechou a noite de sexta com inspiradas releituras instrumentais de “A Flor e o Espinho” (Nelson Cavaquinho) e “Céu e Mar” (Johnny Alf), entre outras.

Ainda nessa noite, a plateia também pôde se deliciar com a apresentação do octeto do pianista Tomás Improta, que recriou com muita sensibilidade pérolas da obra de Dorival Caymmi (1914-2008), como “O Mar”, “Rosa Morena” e “Você Não Sabe Amar”, incluindo a oportuna participação da cantora baiana Virgínia Rodrigues (na foto acima). Releituras tão belas, que merecem virar disco para serem apreciadas por um público mais amplo.

 
Na abertura do festival (31/10), foi emocionante ver o pianista mineiro Wagner Tiso novamente ao lado de seus antigos parceiros do grupo Som Imaginário, pioneiro nas fusões de rock progressivo, jazz e MPB, nos anos 1970. Clássicos da obra de Milton Nascimento, como “Milagre dos Peixes”, ou ainda a nostálgica “Casa no Campo” (de Tavito e Zé Rodrix), reviveram a trajetória do grupo, que hoje pode ser vista como uma seleção de craques da música instrumental, formada por Luís Alves (baixo), Robertinho Silva (bateria), Nivaldo Ornelas (sax), Tavito (violão e voz) e o recém-chegado Victor Biglione (guitarra). 
  
Ainda na noite de estreia, a apresentação do Duo Elo, vencedor de um concurso de novos talentos promovido pelo festival, assim como a jovem banda Bondesom (na foto acima), que fechou o baile-show de sábado, mostraram também que o CopaFest está certíssimo ao olhar tanto para o futuro, como para o presente e o passado de nossa música. Aliás, nem poderia ser muito diferente, em um país como o Brasil, onde se cultiva diariamente uma das músicas instrumentais mais originais e criativas do mundo.

(Resenha publicada na edição online da “Folha de S. Paulo”, em 4/11/2013)


 

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