Sonora Brasil: projeto do Sesc leva música do Brasil profundo a 114 cidades

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                                  As Cantadeiras do Sisal e os Aboiadores de Valente, no projeto Sonora Brasil
 
Você sairia de casa para ver uma apresentação de violeiros e cantadores de cidadezinhas do interior sobre os quais jamais ouviu falar? Se você não for fã de música sertaneja ou folclórica, é provável que a resposta seja negativa, assim como a de muita gente. Em geral, as pessoas costumam ir a shows de artistas que já conhecem, esperando ouvir canções de sucesso. 


Esse hábito adquirido tem muito a ver com o funcionamento e a estratégia comercial do mercado da música. Apenas alguns artistas são “eleitos” pelas gravadoras, rádios e TVs. À margem desse grande esquema comercial resta uma infinidade de manifestações musicais, especialmente aquelas que não se enquadram nos padrões e modismos definidos pela indústria e veiculados pela mídia. 


Na contramão dessa rotina limitadora e injusta do mercado musical, o Sesc (Serviço Social do Comércio) realiza há 18 anos, por meio de seu Departamento Nacional, o Sonora Brasil. Maior projeto de circulação musical pelo país, esse evento vai atingir 114 cidades de todas as regiões brasileiras, num total de 418 apresentações durante
este ano

A intenção maior é formar plateias para manifestações musicais que sobrevivem à margem do mercado. Desde 1998, o projeto já realizou cerca de 4.900 apresentações por todo o país, em cidades de médio porte, atingindo mais de 520 mil espectadores.


Diferentemente do que se vê na indústria musical, o Sonora Brasil não encara a música como produto comercial ou mero entretenimento. Dois temas são trabalhados por um período de dois anos –- Cantos de Trabalho e Violas Brasileiras foram os temas escolhidos para a atual edição –- no sentido de criar uma relação mais profunda entre o público e as obras dos artistas e grupos escolhidos para circularem pelo país.


Com essa intenção, é distribuído à plateia um livreto que vai além da função de programa dos concertos. Ele traz um texto analítico de um especialista, para que o espectador possa se aprofundar naquele universo musical. Por sinal, esses livretos são muito bem editados e impressos, com o alto padrão de qualidade que já se espera dos projetos do Sesc.


Revelando o Brasil profundo 

Pelas reações da plateia durante a noite de abertura da nova temporada do Sonora Brasil – anteontem, no Teatro Margarida Schivasappa, em Belém (PA) – já se pode antecipar que os concertos deste ano devem emocionar muita gente pelo país. 
 
Os violeiros Fernando Deghi (paulista de Santo André) e o carioca Marcus Ferrer abriram a noite demonstrando, por meio de obras de Guerra Peixe e Ivan Vilela, além de algumas composições próprias, que a viola caipira já conquistou seu merecido espaço nas salas de concerto, antes reservadas apenas à chamada música erudita. 

Em seguida, Ailton Aboiador e seu filho Ailton Jr. (ambos da região de Valente, no nordeste da Bahia) divertiram o público com suas toadas e aboios (cantos que ajudam a conduzir o gado), como “Não Quis Estudar”, que aborda o cotidiano de um boiadeiro. Também arrancaram gargalhadas ao se lançarem em um desafio improvisado.

Da mesma região do nordeste baiano, as seis artesãs do grupo Cantadeiras do Sisal encantaram a plateia, antes de tudo, pela simplicidade de suas danças e cantigas, criadas espontaneamente para acompanhar seu artesanato, como “O Tanquinho É Bom” e “Trabalhava no Motor”.


Aliás, a simplicidade desse concerto –- sem cenário ou adereços -– contribuiu para que a plateia se concentrasse nas belas melodias dos violeiros e nos versos emotivos dos aboiadores e cantadeiras. Não à toa os concertos do projeto Sonora Brasil são essencialmente acústicos: não há microfones, nem caixas acústicas no palco. Sem mediações tecnológicas, as vozes e os instrumentos desses representantes do Brasil profundo soam ainda mais verdadeiras e reveladoras. 


Mais informações no portal do Sesc: http://www.sesc.com.br/portal/cultura/musica/sonora_brasil/

(Viajei a Belém, para a estreia da nova temporada do Sonora Brasil, a convite do Sesc)




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