Festivais de jazz e blues: um circuito em expansão que incentiva o turismo no Brasil

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                       O guitarrista Lucky Peterson, no 11º Rio das Ostras Jazz & Blues Festival

Até a década de 1990, os brasileiros interessados em shows de jazz ou gêneros musicais afins, como blues, soul ou o r&b, tinham poucas opções. Se não pudessem viajar para os Estados Unidos ou para a Europa, onde centenas de festivais de música agitam o período do verão, tinham que se contentar com os raros eventos de jazz e blues realizados por aqui somente no eixo São Paulo-Rio.

Hoje, o cenário é bem diferente. A temporada de festivais desse gênero no país se estende por todo o ano, praticamente, e cobre quase todas as regiões brasileiras. Nos próximos meses, esse circuito destaca shows de músicos de renome na cena internacional, como Pat Metheny, Brad Mehldau, Cassandra Wilson, Esperanza Spalding, Trombone Shorty, Buddy Guy, James Cotton, Bob Mintzer, Stanley Jordan e Egberto Gismonti, entre outros.

“Os festivais de jazz estão proliferando pelo Brasil – alguns são mais ortodoxos, outros mais abertos. Não temos ainda um festival com o prestígio de um Montreux, de um North Sea ou do New Orleans Jazz Fest, mas estamos a caminho”, compara o produtor Edgard Radesca, que acaba de realizar a 5ª edição do Bourbon Festival Paraty. Com recorde de público nas três noites, o evento atraiu mais de 30 mil pessoas à cidade histórica do litoral fluminense. “Sem falsa modéstia, Paraty oferece todas as condições para um festival de prestígio internacional. Música de qualidade, num local paradisíaco, é uma combinação muito forte”.

Radesca já trabalha na preparação do 11º Bourbon Street Fest, com shows gratuitos em São Paulo, Brasília e no Rio, em agosto. “Recebemos solicitações para estendê-lo também a Salvador e Florianópolis, neste ano. Vamos aumentar as atrações dirigidas a plateias mais jovens, já que esta tem sido a tendência do nosso publico”, revela o produtor. No elenco, segundo ele, está confirmada a presença de Trombone Shorty, revelação da eclética cena musical de New Orleans (EUA), que hoje circula pelos principais festivais do mundo, assim como a banda Soul Rebels, que mistura funk, soul, r&b e rock.



                            A banda Soul Rebels, atração do 11º Bourbon Street Fest, em agosto

Outro festival que acaba de realizar sua 11ª edição, o Rio das Ostras Jazz & Blues, também no litoral fluminense, ofereceu cinco palcos, entrada franca e um elenco que não devia nada a festivais similares nos EUA, que destacou o baixista Stanley Clarke, o trompetista Christian Scott e os guitarristas Lucky Peterson, Vernon Reid e Scott Henderson, entre outros. “Muitos já admiram nosso festival lá fora. Confirmo isso pelos convites que recebo para palestras na Europa e nos EUA, e também pelos e-mails de empresários e músicos”, comenta o produtor Stenio Mattos, ressaltando que o evento tem crescido ano a ano.

“O mais importante é que o festival trouxe uma mudança de paradigma cultural: desenvolvimento turístico, novas escolas de música para a cidade, até em nível superior, e o envolvimento da população de Rio das Ostras com o projeto”, considera o produtor. Entre as novidades na estrutura da última edição, além de telões de última geração e um piso para evitar a lama provocada por chuvas eventuais, o evento contou com tendas que ofereciam aluguel de bicicletas para facilitar a locomoção entre os palcos espalhados pela cidade.

Até o final de julho, outros oito festivais serão realizados nas regiões Sudeste, Norte e Nordeste do país. O maior deles é o 3º BMW Jazz Festival, com shows em São Paulo (de 6 a 9/6) e Rio (de 8 a 10/6). Curador do evento, Zuza Homem de Mello destaca no elenco o trio do pianista Brad Mehldau e a big band da baixista e vocalista Esperanza Spalding, bem conhecidos entre os fãs do gênero no país, além do recém-criado quarteto James Farm, que inclui o saxofonista Joshua Redman.

“A atração para quem quer saber o que há de novo no jazz é o quinteto do baterista Jonathan Blake, que tem como surpresa o sax alto de Jaleel Shaw. Possivelmente será o grupo comentado pelos que estão atrás dos futuros ídolos do jazz”, observa Homem de Mello. Já o guitarrista Pat Metheny, artista de maior visibilidade nessa edição, receberá tratamento inédito em dezenas de festivais realizados pela Dueto Produções desde os anos 1980: noites exclusivas, cujos ingressos já estão esgotados. Para consolo dos que ficaram de fora, Metheny também fará um show gratuito ao ar livre, no dia 9/6 (domingo), às 17h, no parque do Ibirapuera, em São Paulo, além de outro pago, no Bourbon Street Music Club, na noite de 8/6 (sábado).


                          A cantora e baixista Esperanza Spalding, atração do BMW Jazz Festival, em junho

Pioneira na produção de festivais do gênero, Monique Gardenberg confirma a boa imagem do Brasil nessa área. “Acho que carregamos esse prestígio desde 1985, quando criamos com muita seriedade o Free Jazz Festival, para a Souza Cruz. Demos continuidade, em 2003, com a Tim, e agora, com a BMW, produzimos um festival dedicado exclusivamente ao jazz. Ao longo desses quase 30 anos estabelecemos uma relação de confiança com agentes de artistas do mundo inteiro”.

Logo após o BMW Jazz será realizada, em São Paulo, de 10 a 13/6, a primeira edição do Best of Blues Festival. O nome soa pretensioso, mas a programação desse evento inclui shows de quatro conceituados veteranos do gênero: os guitarristas norte-americanos Buddy Guy e Taj Mahal, o pianista e cantor Dr. John (de New Orleans), ou ainda o guitarrista e cantor britânico John Mayall. Outro destaque do evento é a primeira apresentação no país de Shemekia Copeland, ótima cantora de blues.

Com apenas um ano, o paulista Santos Jazz Festival (de 18 a 23/6) já revela crescimento na estrutura de sua segunda edição. “Teremos sete palcos contra três da edição anterior; seis dias de shows contra os quatro do ano passado”, compara Denise Borges, diretora executiva do evento, cujo programa destaca Egberto Gismonti, Banda Mantiqueira, o violonista Romero Lubambo, a cantora Leny Andrade e o trombonista Stafford Hunter.

Eventos já consagrados em várias edições, o 8º Festival Amazonas Jazz (de 23 a 28/7, em Manaus) e o 11º Savassi Festival (de 10 a 21/7, em Belo Horizonte) têm mais em comum do que o fato de estarem agendados para o mês de julho. Promovem atividades para aprimorar a formação dos músicos locais e privilegiam músicos conceituados que não aparecem com frequência em eventos do gênero. O festival amazonense contará neste ano com os saxofonistas americanos Bennie Maupin e Bob Mintzer, com o pianista português Mário Laginha e com o saxofonista cubano Felipe Lamoglia, entre outros.



Bruno Golgher, produtor do Savassi Festival, que prepara para setembro uma edição especial do evento em Nova York, considera que hoje os festivais brasileiros já recebem o mesmo tratamento que seus similares pelo mundo. “É impressionante como a música brasileira é respeitada, amada e tocada por músicos estrangeiros”, diz. Para efetivar essa primeira edição nova-iorquina, Golgher fechou parcerias com duas universidades locais, a Columbia e a New York. E já no próximo ano pretende trabalhar também com o Berklee College of Music.

“Hoje o Savassi Festival possui uma concepção artística ampla: partimos do jazz, tradicional ou não, e da música instrumental brasileira, mas trabalhamos nas interfaces com a música orquestral, com a música eletrônica, com o rock, o hip-hop, o choro e, a partir deste ano, com o folk”, explica o produtor, observando que, ao crescer, o festival viu seu cânone artístico se transformar. Entre os artistas já definidos para a próxima edição, destacam-se dois guitarristas dinamarqueses – Jacob Bro e Mikkel Ploug – escalados para colaborar com os músicos mineiros Anderson Noise e Pedro Durães.

A programação do 3º Jazz na Fábrica – festival produzido pelo Sesc Pompéia, em São Paulo – ainda não esta fechada, mas, segundo sua assessoria de imprensa, a próxima edição focalizará o jazz africano e o latino. Com um perfil musical que reflete a globalização desse gênero musical, o evento tem trazido atrações de diversos países e se estende por um mês – agosto, neste ano. As negociações para trazer a cantora norte-americana Cassandra Wilson, o pianista porto-riquenho Edsel Gomez e o trompetista franco-libanês Ibrahim Maalouf já estão em estágio avançado.


                      O trompetista Terence Blanchard, atração do Choro Jazz Festival, em dezembro

Com quatro edições realizadas na bela praia de Jericoacoara e em Fortaleza (CE), o Choro Jazz Festival também tem crescido, sem abrir mão de sua essência. “A educação musical está acima de tudo. É o que priorizo, cada vez mais, com oficinas ministradas por grandes mestres da música”, afirma o produtor Antonio Capucho, que criou a Escola Choro e Jazz Jericoacoara, em 2012. “Ela funciona durante todo o ano e é sustentada em parte pela produção do festival e pela boa vontade da comunidade”, explica. No elenco deste ano, já estão confirmados o saxofonista Terence Blanchard (na foto acima), o cantor João Bosco e a cavaquinhista Luciana Rabello.

Lançado na semana passada, com show do baixista Stanley Clarke, em Belo Horizonte, o 6º Vijazz & Blues Festival, que nasceu em Viçosa (MG), é sintomático do crescimento do circuito de festivais de jazz pelo país. “Esta edição será a maior de todas, com nossa expansão para as cidades de Ponte Nova, Juiz de Fora e Araxá. Também já temos convites para levar o circuito a outras cidades de Minas Gerais e dos estados de São Paulo e Rio”, comemora o produtor Sergio Lopes.


Programe-se com um roteiro dos principais festivais de jazz e blues, que serão realizados pelo país, nos próximos meses:
http://www.carloscalado.com.br/2013/01/festivais-em-2013-prepare-se-para.html

(versão integral da reportagem publicada no jornal “Valor Econômico”, em 5/06/2013)

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