Bourbon Festival Paraty: quarta edição aposta na diversidade musical, do jazz à MPB

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Começa nesta sexta-feira (1/6), a quarta edição do Bourbon Festival Paraty. A bela cidade histórica do litoral fluminense, com suas ruas de pedra e arquitetura em estilo colonial, volta a receber um elenco musical bem diversificado, que vai do jazz à MPB, do blues, do soul e do funk à música instrumental brasileira - retrato fiel da programação normal do paulistano Bourbon Street Music Club, que produz o evento.

Com três dias de programação gratuita, que oferece shows diurnos e noturnos ao ar livre, esse festival conta com dois palcos, além de performances musicais nas ruas do centro histórico da cidade. Desde o ano passado uma exposição de fotografia foi acrescentada às atrações musicais.


No palco principal, próximo à Igreja Matriz da cidade, a programação musical da noite de estreia destaca a cantora e pianista de gospel e soul norte-americana Cynthia Girtley, o quinteto do trombonista de jazz Delfeayo Marsalis (na foto abaixo) e a banda paulista de soul e R&B Reverendo Franklin. 


No sábado, apresentam-se o guitarrista de blues Roy Rogers e sua banda The Delta Rhythm Kings, o trompetista de jazz, funk e hip hop Shamarr Allen e sua banda The Underdawgs, além da banda São Paulo Ska Jazz, com participação da cantora Fernanda Porto.

O programa de domingo, destaca o trompetista de jazz Leroy Jones (na foto acima), com participação da cantora Yolanda Windsay, a cantora franco-israelense de jazz e pop Yael Naim e a cantora brasileira Zélia Duncan.

A programação do palco próximo à Igreja de Santa Rita oferece shows da cantora de soul e pop Honey LaRochelle, o tecladista de blues Donny Nichilo (no sábado) o duo de música instrumental brasileira Duofel e o guitarrista de blues André Christovam (no domingo).

Mais informações no site do evento: www.bourbonfestivalparaty.com.br

John Clayton: Baixista e arranjador de estrelas do jazz vem com seu grupo ao BMW Festival

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Ele fala com a mesma elegância e precisão que exibe há décadas ao dedilhar as cordas de seu baixo acústico. O nome do jazzista, arranjador e compositor americano John Clayton ainda não é reconhecido entre o grande público, mas se você é um apreciador do jazz, provavelmente, já o ouviu, acompanhando estrelas do gênero, como as cantoras Diana Krall, Natalie Cole ou Dee Dee Bridgewater.

Clayton será uma das atrações da segunda edição do BMW Jazz Festival, em junho, em São Paulo e no Rio de Janeiro. Virá ao país com o The Clayton Brothers, quinteto que criou com seu irmão saxofonista, Jeff Clayton, em 1977. “Quem for nos ouvir pode esperar por sons bem excitantes”, afirma o contrabaixista. “Não temos receio de tocar jazz com muito swing e um alto nível de intensidade. Mesmo quando tocamos algo mais romântico, não abrimos mão da intensidade sonora”.

Falando com exclusividade ao "Valor", por telefone, Clayton conta que tem boas lembranças de sua primeira visita ao país, em 2007, quando tocou com a banda da cantora e pianista canadense Diana Krall. “Tanto em São Paulo, como no Rio, pude ouvir música de excelente qualidade. Fiquei impressionado ao perceber como a música é tão importante no cotidiano dos brasileiros. Parece até que todo mundo dança e toca violão no Brasil. Foi uma viagem fantástica”.

Graças às amizades que construiu desde então com músicos brasileiros, como o violonista paulistano Chico Pinheiro ou o cantor e compositor carioca Ivan Lins (com o qual gravou um CD ao vivo, regendo a Metropole Orchestra, em 2009), Clayton vem se aproximando mais da música produzida em nosso país. “A convivência com esses amigos tem contribuído para que eu amplie meus conhecimentos sobre a música do Brasil, não só a música de hoje, mas a do passado também”, diz o jazzista americano. 



Nascido em Venice (Califórnia), Clayton tornou-se aos 16 anos aluno de Ray Brown (1926-2002), um dos maiores contrabaixistas do jazz, que passou a orientar sua formação, além de introduzi-lo no meio profissional. “Por meio dele conheci grandes músicos, como Milt Jackson, Henri Mancini, Monty Alexander e Count Basie. Ray foi como um pai para mim, talvez a figura mais importante do jazz na minha vida”, reconhece. Já na década de 1990 chegou a tocar ao lado de seu mestre no Superbass, grupo que também incluía o baixista Christian McBride.

Depois de viver cinco anos na Holanda, Clayton se radicou em Los Angeles, no final de 1984. Seu talento o levou a se tornar músico de estúdio, na concorrida área de trilhas sonoras para Hollywood. “Com o tempo, fui descobrindo que aquela vida não era ideal para mim”, admite. Na mesma época, criou com seu irmão saxofonista e o baterista Jeff Hamilton, a Clayton-Hamilton Jazz Orchestra. Com ela, passou a gravar e a fazer concertos ao lado de conceituadas cantoras, como Carmen McRae, Nancy Wilson e Gladys Knight.

“Gravar música para cinema era fantástico, mas não permitia que eu pudesse me expressar como músico. É por isso que costumo dizer que o jazz salvou minha vida. Talvez eu também pudesse me expressar em outro gênero, como a música clássica ou a música brasileira, mas para mim o jazz é a forma mais simples que eu tenho de me expressar”, diz o líder e contrabaixista.

Desde então, Clayton seguiu tocando com cantores – diferentemente de alguns de seus colegas mais radicais, nos círculos do jazz, que costumam depreciar a música dos intérpretes vocais. “O que realmente me atrai ao tocar com eles é, não só o som da voz do intérprete, mas também o fato de você poder se aproximar mais do significado de uma canção, por meio dos versos”, afirma. “Além disso, não quero apenas tocar em trio ou com os Clayton Brothers pelo resto da minha vida. Também quero fazer outras coisas”, comenta o arranjador, que se considera um discípulo de “band leaders”, como Duke Ellington, Quincy Jones, Gil Evans e Oliver Nelson.

Quem já teve a oportunidade de ouvir os discos do quinteto The Clayton Brothers, ou assistiu a alguma de suas apresentações, deve ter notado a comunicação quase telepática entre John Clayton e seu irmão Jeff. “Quando tocamos alguma coisa, não preciso dizer a ele o que estou procurando, porque ele já sabe. Se ele toca alguma coisa, é fácil para mim reconhecer a base daquilo, porque frequentamos a mesma escola, a mesma igreja, ouvimos nossa mãe tocando piano junto conosco. Acho que realmente pode existir algo parecido com telepatia entre membros de uma família”, reconhece.

Sobre a cena atual do jazz, Clayton tem uma visão bastante positiva. “Acho que este é um bom momento, com músicos jovens fazendo coisas interessantes, especialmente em termos rítmicos. Na área da performance, os músicos jovens sabem muito mais do que eu quando tinha a mesma idade deles”, compara. “Também acho interessante ouvir diferentes influências, como a do hip hop ou da música da Europa Central, nessa geração. Não pretendo, necessariamente, tocar esse tipo de música, mas gosto de ouvi-la”.

A segunda edição do BMW Jazz Festival será realizada de 8 a 10/6, no Via Funchal (São Paulo) e de 11 a 13/6, no Teatro Oi Casagrande (Rio). A programação destaca músicos de jazz de vários estilos e gerações. Entre os veteranos, o trio formado por Chick Corea (piano), Stanley Clarke (baixo elétrico) e Lenny White (bateria) promete resgatar clássicos da fusion dos anos 70 e 80. O quarteto liderado pelo saxofonista Charles Lloyd, reúne talentos mais jovens, como Jason Moran (piano), Reuben Rogers (baixo) e Eric Harland (bateria).

Revelação recente da cena jazzística de Nova York, o trompetista Ambrose Akinmusire virá com seu quinteto. O compositor e arranjador canadense Darcy James Argue, que trará sua orquestra, também se revelou há pouco. Formado no ano passado, o grupo Ninety Miles reúne músicos jovens e criativos: os americanos Stefon Harris (vibrafone) e Christian Scott (trompete), o porto-riquenho David Sánchez (saxofone) e o cubano Harold López Nussa (piano), que buscam aproximar o jazz da música cubana.

Mais perto da black music e do rock, o multi-instrumentista e vocalista Trombone Shorty é uma das surpresas recentes da cena musical de New Orleans. Já o saxofonista Maceo Parker, o trombonista Fred Wesley e o saxofonista Pee Wee Ellis mantém vivos o funk e o rhythm & blues de James Brown, de cuja banda fizeram parte. Única representante nacional, a dupla de acordeonistas Toninho Ferragutti e Bebê Kramer promete fazer um tributo à moderna sanfona brasileira. Outras informações no site do evento:
www.bmwjazzfestival.com.br

(texto publicado no caderno Eu & Fim de Semana, no jornal "Valor", edição de 25/5/12)

André Mehmari: pianista e compositor fala sobre 'Canteiro', seu álbum de canções

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                                       André Mehmari e a cantora Monica Salmaso / Photo by Fabiano Teles

Em “Canteiro”, décimo álbum de sua carreira e o primeiro dedicado exclusivamente a canções de sua autoria, você tem 11 letristas como parceiros. Como nasceram essas canções? Em geral, você compõe primeiro a melodia e a envia para o letrista?  

André Mehmari - De modo geral a música vem antes, mas há o caso dos poemas de Bernardo Maranhão, que me deu de presente seu livro de poemas "Rejunte" e carta branca para musicar quaisquer deles. As canções foram criadas sempre no piano ou no violão. Este, como se sabe, é instrumento-símbolo da canção. Eu me aproximei dele para me aprofundar ainda mais nesta tradição que tanto adoro e respeito. O piano é o meu instrumento principal. Justamente por isso às vezes é um problema ter tal domínio instrumental. Ele se impõe à natureza da canção, que busca outro tipo de síntese expressiva, de simplicidade direta, que não passa pelo idioma, este complexo gestual inerente a cada instrumento.

Você só compõe por inspiração? Ou é do tipo que trabalha bastante, que transpira para compor?
Mehmari - Eu trabalho bastante e sou muito prolífico. O trabalho me inspira e nutre, assim como o insondável e etéreo. Não acredito muito na imagem romântica da inspiração que vem de cima, de improviso, e chega passivamente. A inspiração existe, sim, e é um estado alterado de consciência, o qual se atinge através de muita procura e esforço. Portanto é um lugar muito bonito aonde se chega por meio de uma caminhada (transpiração) que pode ser inclusive plena de acidentes e erros... Não uma pomba misteriosa que desce dos céus com uma mensagem secreta e insondável destinada ao compositor sortudo que, por acaso, estava sentado no instrumento naquele momento (risos).

Seu processo criativo é o mesmo ao compor uma canção ou, por exemplo, uma extensa peça sinfônica?
Mehmari - São processos diferentes, pois essas criações têm naturezas diferentes. No caso de uma obra sinfônica de fôlego, há de sem pensar numa estrutura coerente e forte que sustente essa obra, além dos detalhes de cada compasso, cada movimento. A canção se aproxima muito mais do gênero conto, ao passo que a grande forma se assemelha mais ao romance.

Você é influenciado por outras artes ou linguagens? Pela literatura?
Mehmari - Leio muito e sempre sinto que gostaria de ter mais tempo para ler mais, pelo menos os clássicos. Adoro Calvino, Dino Buzzatti, Saramago, Guimarães Rosa, Rilke, Fernando Pessoa, Machado, Dostoivski... Também mantenho ativo o hobby da fotografia e este aspecto do imagético vira e mexe aparece bem evidente na minha produção. Até, eventualmente, na capa de um CD.

Até alguns anos atrás, era muito comum instrumentistas chamarem os cantores, pejorativamente, de “canários”. Esse preconceito tem diminuído no meio musical? A música instrumental tem se aproximado mais da canção?

Mehmari - Nunca compartilhei de tal 'poética' rústica. No meu cancioneiro, e nos de compositores que admiro, o instrumental abraça a canção de maneira harmoniosa. Tem sido assim em toda minha obra. Sempre tive grandes e importantes parceiros que têm a voz como instrumento, e são excelentes músicos. Muito melhores inclusive que esses que menosprezam a nobre função de dar vida a uma letra, a uma canção! Monica Salmaso e Ná Ozzetti são exemplos de cantoras geniais, inspiradas e inteligentes, que sabem muito bem o que querem da música e dos músicos com quem trabalham. Acho que há um certo machismo embutido nessa ofensa, sabendo-se da maioria feminina no canto brasileiro. Obviamente, esse tipo de atitude terá cada vez menos espaço em nossa sociedade, já que qualquer deslize é imediatamente reportado e espalhado pelas redes sociais.

Você já gravou vários estilos de valsa, recriou ao piano sucessos dos Beatles e dos mineiros do Clube da Esquina, fez com Hamilton de Holanda um tributo a Hermeto Pascoal e Egberto Gismonti, compôs peças eruditas para orquestra ou grupos de câmera. Que outro gênero ou que formato instrumental gostaria de experimentar em seus próximos discos?
Mehmari - Quero muito registrar minha obra orquestral e de câmara, que é muito extensa. Tenho também um projeto, Música Antiga Música Nova, que idealizei e já estreei no palco, que faz uma ponte entre música barroca e a canção brasileira moderna, sem nenhuma pretensão musicológica, claro. Ele deve ganhar espaço na minha discografia neste ou no próximo ano.

Em que fase está o disco com Chico Pinheiro e Sérgio Santos? Pode adiantar algum detalhe desse projeto?
Mehmari - O projeto está já em fase final de capa e masterização. Estamos felizes demais com essa tríplice parceria, que se mostrou muito frutífera e fluente. O aspecto que o torna bastante singular é o fato de termos composto juntos várias das 13 músicas do CD. A primeira faixa, por exemplo, é um choro canção, cuja primeira parte é minha, a segunda do Chico e a letra do Sérgio. Esse disco se chama “Triz” e será lançado ainda no segundo semestre. Já estamos fazendo planos para circular com esse trio.

(entrevista publicada parcialmente no “Guia Folha - Livros, Discos, Filmes”, em 28/4/2012) 


New Orleans Jazz Fest 2012: várias atrações desse evento vão se apresentar no Brasil

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                                                                            Donald Harrison / Photo by Carlos Calado

A chuva que caiu no meio da tarde do último domingo (6/05), pouco antes dos shows de Foo Fighters, David Sanborn, Bonnie Raitt e Rebirth Brass Band, não chegou a prejudicar o encerramento da 43ª edição do New Orleans Jazz & Heritage Festival, um dos maiores eventos musicais do mundo.

A produção do festival não divulgou números de público, mas calcula-se que cerca de 500 mil pessoas passaram pelos portões do Fairgrounds, o hipódromo da cidade de New Orleans, durante os dois disputados finais de semana.

Com quase 500 atrações musicais, esse eclético evento é, no fundo, uma combinação de vários festivais. Se decidir acompanhar as atrações de apenas um dos 12 palcos, o frequentador pode assistir a um festival de jazz moderno ou outro de jazz tradicional, um de blues ou outro de gospel, um de ritmos locais da Louisiana ou outro de música pop, e assim por diante. 


            Ben Jaffe (tuba) e Mark Braud (trompete), da Preservation Hall / Photo by Carlos Calado


Em número maior a cada ano, os turistas brasileiros puderam conferir previamente shows que virão ao Brasil neste ano. Como o do saxofonista, cantor e ator Donald Harrison, que mistura jazz moderno, funk e outros ritmos de Nova Orleans, com direito a vestimentas típicas dos blocos de índios do Mardi Gras, o carnaval local. Harrison será uma das atrações da 10ª edição do Bourbon Street Fest, em São Paulo e Rio, em agosto.

Outra atração desse festival brasileiro será a Preservation Hall Jazz Band, verdadeira instituição do jazz tradicional de Nova Orleans, que festejou seus 50 anos em três palcos diferentes do Jazz Fest, além de uma exposição de fotos, instalada na área fechada do hipódromo.


                           David Sanborn (sax alto) e Joey DeFrancesco (órgão) / Photo by Carlos Calado

Na sexta feira (4/05), o bem humorado trombonista Delfeayo Marsalis – atração confirmada do Bourbon Festival de Paraty (RJ), em junho – comandou a Uptown Orchestra, big band dedicada à tradição dançante do swing, mas que se abre para o jazz moderno, como no saboroso arranjo de "Señor Blues" (de Horace Silver).

Já o veterano saxofonista David Sanborn – escalado para o festival Rio das Ostras Jazz & Blues (RJ), em junho – foi uma boa surpresa, no programa de domingo (6/05). Ao lado do organista Joey DeFrancesco, Sanborn exibiu uma excitante sessão de soul-jazz e rhythm & blues, recriando clássicos como "Let the Good Times Roll" e "I've Got News for You", ambos do repertório de Ray Charles (1930-2004). 


                                                                    Herbie Hancock / Photo by Carlos Calado
 
Escalado como atração principal do palco de jazz, no sábado (5/05), o pianista e compositor Herbie Hancock recebeu a difícil missão de disputar a plateia com a veterana banda de rock Eagles. Talvez por isso tenha recorrido a seu repertório eletrificado dos anos 1970 e 1980, incluindo releituras dos hits "Watermelow Man" e "Chameleon". Em seu quarteto atual, destaca-se a guitarra inventiva do africano Lionel Loueke.

A baixista e cantora Esperanza Spalding também fez uma apresentação bastante concorrida, exibindo o criativo material de seu recém-lançado álbum "Radio Music Society". Porém, começar um show com 40 minutos de atraso, aparentemente por um problema com o baixo acústico, trocado no palco pelo elétrico, faz pensar se essa talentosa jazzista já não estaria "se achando" uma pop star. Ou sendo estimulada a agir dessa forma. 


                                                                                   Esperanza Spalding / Photo by Carlos Calado

Dois anos após a estreia da série de TV "Tremé", que retrata a reconstrução de New Orleans após a tragédia desencadeada pelo furacão Katrina (em 2005), já é evidente seu impacto sobre a cena local. Músicos que participaram de capítulos dessa série (produzida e veiculada pelo canal pago HBO), como Trombone Shorty, Kermit Ruffins, Donald Harrison e John Boutté, estão atraindo o interesse de plateias imensas que eles não tinham antes. É o chamado "efeito Tremé".

(texto publicado no site Folha.com, em 9/05/2012; Carlos Calado hospedou-se a convite do New Orleans Convention & Visitors Bureau)

 

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