Cassiano: último álbum do pioneiro da soul music no Brasil retorna às lojas

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Sentado, com o violão na mão, terno e chapéu "vintage", ele mais parece um clássico cantor de blues dos anos 1930. Esta é a capa do álbum "Cedo ou Tarde", último disco oficial do lendário soulman brasileiro Cassiano, que acaba de voltar às lojas, em um pacote de raridades relançadas em CD pela Sony Music (mais informações no post anterior).

"Este disco representa tudo pra mim. É toda uma vida", disse Cassiano a este repórter, na entrevista que fiz com ele para a "Folha de S. Paulo", em julho de 1991, dois meses antes do lançamento do álbum. Não era à toa que o paraibano de Campina Grande, na época com 47 anos, não conseguia esconder sua emoção. Cassiano praticamente havia sumido da cena musical. Seu disco anterior era "Cuban Soul", lançado em 1976. Depois de ficar meses hospitalizado, em 1980, ele perdeu um pulmão. Sua última temporada de shows acontecera em 1983.

Idealizado pelo produtor Liber Gadelha, o retorno de Cassiano aos estúdios de gravação se deu em grande estilo. Para acompanhar o mestre do soul em releituras de seus sucessos foram convidados outros artistas com afinidade por esse gênero musical, como Claudio Zoli ("A Lua e Eu") e Sandra de Sá ("Primavera"), além de astros da MPB, como Djavan ("Coleção"), Luiz Melodia ("Djavan") e Marisa Monte ("Cedo ou Tarde"). Também entraram algumas inéditas do compositor, como o samba-soul "Know How" (cantada por Ed Motta) e o funk "Bye Bye" (com Karla Sabah).

"O que é rico não morre. O soul tem vida tão longa que só daqui a cem anos vai se poder entendê-lo melhor", comentou Cassiano, arriscando uma hipótese para explicar o relativo ostracismo enfrentado pela black music no Brasil da década de 1980, marcada pela predominância do rock nacional. "O movimento aqui ficou restrito a mim e ao Tim (Maia). Só agora, vinte anos depois, é que a semente brotou", completou o soulman, eufórico.

Talvez Cassiano tenha sido otimista demais ao analisar o potencial desse resgate por aqui, naquele momento. Mas quem tem acompanhado o grande interesse que o soul e a black music voltaram a despertar nos últimos anos, especialmente na cena dos festivais internacionais, sabe que o autor de pérolas negras, como "Primavera", "A Lua e Eu" e  "Coleção" (as duas últimas em parceria com Paulo Zdanowski), estava coberto de razão. Salve mestre Cassiano!

Se você também é fã das canções de Cassiano, mas ainda não o conhecia, vale a pena ver o pioneiro soulman num videoclipe (incrivelmente mambembe) exibido pela Rede Globo, em 1975, para "A Lua e Eu":


Raridades: série Caçadores de Música resgata discos de samba, soul, jazz e MPB

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Tentando diminuir o prejuizo crescente dos downloads na web, a gravadora Sony Music está distribuindo às lojas 51 CDs de vários gêneros musicais ´"garimpados" em seu arquivo. O elenco da série Caçadores de Música é eclético e cobre diversas épocas: da soul music brasileira de Cassiano ("Cedo ou Tarde") e Tim Maia ("Tim Maia", de 1985) às releituras jazzísticas da MPB  pela cantora norte-americana Sarah Vaughan ("O Som Brasileiro de Sarah Vaughan") e pelo gaitista belga Toots Thielemans ("The Brasil Project"), acompanhado por vários intérpretes brasileiros.

Aliás, a música popular brasileira ficou com a maior parcela do pacote, que inclui Pixinguinha ("Os Choros dos Chorões"), Ary Barroso ("Ontem e Hoje"), Martinho da Vila ("Tendinha"), Os Originais do Samba ("É de Lei"), João Bosco ("Galo de Briga" e "O Bêbado e a Equilibrista"), Sergio Mendes ("And the New Brasil 77"), Gal Costa ("Bem Bom" e "Profana") e Jackson do Pandeiro ("O Melhor de Jackson do Pandeiro"), entre outros.

Já a porção internacional da série destaca também o rhythm and blues da cantora Etta James ("Time After Time" e "Mistery Lady") e os vocais jazzísticos de Frank Sinatra ("Young Blue Eyes").

Corinne Bailey Rae: cantora volta mais sensual e emotiva após enfrentar tragédia pessoal

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Quem viu e ouviu a doce cantora inglesa Corinne Bailey Ray despontar na cena musical, em 2006, com o dançante hit “Put Your Records On” e canções leves logo rotuladas de neo-soul, vai notar a mudança da moça. Quatro anos depois, “The Sea”, seu segundo álbum (que acaba de sair no Brasil via EMI) mostra uma compositora e intérprete mais emotiva e madura, encarando algumas baladas tristes e temas mais adultos.

A guinada musical de Corinne, hoje próxima dos 31 anos, não foi planejada por nenhum produtor. Em 2008, quando já estava preparando o novo disco, uma tragédia na vida pessoal a derrubou: seu marido, o saxofonista Jason Rae, morreu em decorrência de uma overdose acidental de álcool e metadona. Assim é compreensível que várias canções do álbum “The Sea” façam alusões a essa fatalidade, como a pungente “I’d Do It All Again”, que foi composta pela cantora dois meses depois.





Outras faixas do disco também combinam beleza e melancolia, como a balada-rock "Are You Here", a romântica "Feels Like the First Time" ou a suave "I Would Like to Call It Beauty". Mas Corinne não permite que a tristeza embutida nessas canções deixe o álbum soar pesado. Canções como a dançante "Paris Nights/New York Mornings" ou a bela "The Sea", em que ela se despede literalmente de sua vida anterior, deixam uma sensação de otimismo. Outra canção "pra cima" é a sensual "Closer", soul music clássica na linha de Marvin Gaye e dos Isley Brothers, que tem tudo para se tornar um novo hit.




Depois de ser até comparada a Norah Jones ou mesmo à diva do jazz Billie Holiday, entre tantas bobagens que já foram escritas por aí, Corinne parece estar no caminho certo para afirmar sua personalidade musical. Para você que ainda não conhecia a voz doce dessa talentosa inglesinha, ou que gostaria de curtir de novo seu primeiro sucesso, fica aqui o clipe de "Put Your Records On". Deu pra sentir a evolução da garota?


Louis Prima: jazzista que não se levava a sério recebe homenagens em New Orleans

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Embora ele fosse um talentoso cantor e trompetista, seguidor do mestre e pioneiro do jazz Louis Armstrong, os críticos desse gênero musical jamais o valorizaram, talvez porque o próprio Louis Prima (1910-1978) não se levava muito a sério. Tente assistir a alguma de suas performances musicais selecionadas abaixo, sem dar ao menos um sorriso (se isso acontecer, procure um médico com urgência).

Prima formou sua concepção musical durante a hegemonia do swing, na década de 1930, quando o jazz ainda era encarado simplesmente como música para dançar e se divertir. Foi um showman brilhante, que sabia como poucos conquistar uma platéia. Descendente de italianos da Sicília que emigraram para os Estados Unidos, ele nasceu na efervescente New Orleans, no Estado da Louisiana. Fiel ao espírito de caldeirão cultural que identifica essa cidade, sua música era uma divertida e energética mistura de jazz tradicional, jump blues, boogie-woogie, rhythm & blues e tarantelas italianas.

Veja o que Prima e a cantora Keely Smith (sua quarta esposa e parceira musical durante a década de 50, auge de sua carreira) cometem nesta hilariante versão da clássica "I've Got You Under My Skin", de Cole Porter. Quem poderia imaginar esse cultuado standard do jazz com uma levada que lembra a introdução de "Aquarela do Brasil" em ritmo acelerado? 

 

Veja agora um dos grandes sucessos de Prima, "Just a Gigolo", vibrante jump blues que na década de 1980 foi regravada com sucesso pelo roqueiro David Lee Roth. Além da debochada Keely Smith, que costumava fazer caretas de tédio no fundo do palco enquanto o maridão se exibia cantando e dançando, destaca-se também o naipe de sopros comandado pelo lendário saxofonista Sam Butera, que morreu em 2009.


 
Neste ano em que se comemora o centenário de nascimento de Louis Prima, sua irreverência musical e sua verve humorística serão homenageadas em sua terra natal durante a 41ª edição do New Orleans Jazz & Heritage Festival, de 23 de abril a 2 de maio. A programação do evento inclui apresentações da hoje septuagenária Keely Smith e de Louis Prima Jr., cantor e trompetista como seu pai, além de tributos com músicos locais. Sem falar no pôster comemorativo com a imagem de Prima, que foi pintado especialmente para o evento pelo veterano cantor Tony Bennett.

Finalmente, outra pérola do repertório de Prima, que mostra como ele sabia utilizar sua origem siciliana para divertir a platéia. Com direito à citação da lírica "O Sole Mio" na introdução, "Oh Marie" inclui um impagável duelo do cantor com o sax de tenor de Sam Butera, em inglês macarrônico. Para aqueles que acham o jazz moderno excessivamente sério ou abstrato, os improvisos de Prima e seus parceiros podem ser uma alternativa dançante e descontraída para se aproximar desse universo musical.







 

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