8º Tudo é Jazz: festival de Ouro Preto promove tributo a Billie Holiday

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O cinquentenário da morte de Billie Holiday (1915-1959), maior cantora de jazz de todos os tempos, será lembrado em alto estilo, na cidade histórica de Ouro Preto, em Minas Gerais. Destaque da 8ª edição do festival Tudo É Jazz (de 18 a 20 de setembro), o concerto-tributo vai contar com os vocais de Madeleine Peyroux, assumida discípula de Billie, e da carioca Mart’Nália. Elas serão por uma banda de figurões do gênero, que inclui o baixista Ron Carter, o guitarrista Bucky Pizzarelli e o pianista Mulgrew Miller. Os arranjos são assinados pelo pianista e maestro israelense Oded Lev-Ari

Outros nomes de prestígio na cena do jazz estarão no elenco desse festival mineiro, como o grupo do baixista israelense Avishai Cohen, a Paris Jazz Big Band e o acordeonista francês Richard Galliano, este ao lado dos brasileiros Hamilton de Holanda e Jaques Morelembaum. O elenco destaca ainda os grupos de dois talentosos brazucas radicados em Nova York: o baterista Duduka da Fonseca e o baixista Leonardo Cioglia.

Considerado um dos melhores eventos do gênero no país, o Tudo É Jazz tem uma fórmula irresistível: combina música de alta qualidade com o charme das ladeiras e igrejas barrocas de Ouro Preto. Depois de perder seu principal patrocinador, neste ano marcado pela crise econômica, o Tudo é Jazz assume um novo formato nesta edição: todos os shows serão ao ar livre e gratuitos.

(publicado parcialmente na revista “Homem Vogue”, nº 25)

Nailor Proveta: uma coleção de belezas da música brasileira escritas para o saxofone

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Quem costuma associar o saxofone apenas ao universo do jazz, vai ter que rever seu ponto de vista depois de ouvir o novo álbum de Nailor Proveta. Em “Brasileiro Saxofone” (lançamento da Acari Records), o multiinstrumentista e compositor paulista alterna os saxofones tenor, alto e soprano para esboçar a trajetória desse instrumento na música brasileira do século XX.

Em parceria com os violonistas Maurício Carrilho e Paulo Aragão, que dividem com ele a direção musical e os arranjos do álbum, Proveta utiliza diversas formações (regional, quinteto de câmara, banda de coreto) para interpretar clássicos do gênero, como os choros “Ternura” (de K-Ximbinho) e “Saxofone, por que Choras?” (Ratinho) ou a valsa “Caminho da Saudade” (Radamés Gnattali). Resgata também pérolas menos conhecidas, como o sincopado samba-choro “Quem É Você?” (Pixinguinha) e “Stanats”, homenagem do maestro Moacir Santos ao saxofonista norte-americano Stan Getz. Uma verdadeira coleção de belezas instrumentais.

Além de Carrilho e Aragão (violões), ao lado dos saxofones de Proveta também aparecem Cristovão Bastos (piano), Rui Alvim (clarinetes), Luciana Rabello (cavaquinho),o quarteto de violões Maogani e o quarteto de cordas Ensemble SP, entre outros. Nem é preciso esperar dezembro, para se saber que este é um dos melhores discos do ano na música popular brasileira.



Nailor Proveta: "Se eu não fosse músico, gostaria de ter feito cinema"

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Em “Brasileiro Saxofone” (Acari Records), seu segundo álbum solo, o músico e compositor paulista Nailor Proveta, também líder da Banda Mantiqueira, traça um primoroso panorama desse instrumento de sopro na história de nossa música instrumental. A seguir, ele comenta o repertório que escolheu e as dificuldades que enfrentou para realizar esse projeto.

Como você chegou ao conceito de “Brasileiro Saxofone”?
Nailor Proveta
- Esse conceito nasceu de meu encontro com [os violonistas e produtores] Mauricio Carrilho e Paulo Aragão. A idéia era fazer um disco em homenagem ao saxofone, instrumento de sonoridade mais camerística, que esteve presente nos antigos recitais de choro, no princípio do jazz e também na música clássica. Mas, em vez de usar o saxofone apenas como solista, pensamos em criar pequenas orquestras, formações nas quais o saxofone nem sempre é solista. Um exemplo: ao tocar “Caminho da Saudade”, valsa do Radamés Gnattali, com quatro violões, precisei buscar no sax tenor uma sonoridade adequada, como se eu fosse um quinto violão. Foi uma experiência muito enriquecedora.

Em “Tocando para o Interior”, seu CD de 2007, você resgatou choros e valsas que tocava no coreto de Leme, sua cidade natal, como num filme de época. “Brasileiro Saxofone” revela uma abordagem semelhante...
Proveta –
Sim, a idéia é trazer a música de outras épocas para os dias de hoje, recriar aquelas ambiências, usando as mesmas medidas, os parâmetros sonoros daquelas épocas. Ouvindo esse CD, você vai ouvir, por exemplo, K-Ximbinho [apelido de Sebastião de Barros, maestro e compositor norte-rio-grandense, morto em 1980], tocando saxofone em um coreto. Depois ouve um regional mais puro ou um quarteto de cordas que remete a uma música mais urbana. Cada música desse disco tem uma cor. Elas funcionam como sequências de um filme. Aliás, se eu não fosse músico, gostaria de ter feito cinema. A idéia é a mesma.

Alguma dessas gravações tem uma história especial?
Proveta -
Oito anos atrás vivi uma de minhas maiores experiências como músico, ao gravar com Moacir Santos [maestro, compositor e saxofonista pernambucano, morto em 2006, depois de viver quatro décadas nos EUA]. No estúdio, eu ficava olhando para o Moacir e me perguntava por que ele tinha ido embora do país. Antes de morrer, ele me pediu que, quando eu fizesse um disco, gravasse “Stanats”, homenagem que ele fez ao [jazzista] Stan Getz. Consegui essa partitura com um amigo dele, o [baixista] Sizão Machado, que estava com o Moacir na noite em que essa música foi composta. Então pedi ao Sizão que fizesse um solo no arranjo que escrevi.

Num projeto tão abrangente como esse, gravar só 12 faixas não é pouco?
Proveta -
Na verdade, após a pesquisa que fizemos, teríamos material suficiente para gravar pelo menos outro disco. Além de composições minhas e do Maurício Carrilho, ficaram de fora músicas do Viriato Ferreira, do Domingos Pecci, do Abel Ferreira. Esse projeto deixou uma vontade enorme de tocar esses e outros compositores de forma mais consciente. Há muitos tesouros musicais por aí que precisam ser recuperados.

Você diria que o saxofone é tão valorizado no repertório da música brasileira como é no jazz?
Proveta -
Os músicos brasileiros foram muito estimulados, de forma geral, pelos jazzistas. Até hoje sou apaixonado por Johnny Hodges, Benny Carter, Charlie Parker, jazzistas que tocavam o saxofone de forma maravilhosa. A diferença entre o repertório no Brasil e nos EUA é muito grande e já começa pelas partituras. Lá você pode comprar qualquer partitura de jazz. Aqui, se você quiser uma partitura de choro ou de samba, não consegue. Nunca tivemos uma editora de música no Brasil. Mesmo nos museus que possuem partituras, você não consegue a liberação. Ainda encontramos muita dificuldade para tocar o repertório de nossos mestres por causa do controle autoral.

O que o levou a tocar sax?
Proveta -
Meu pai tocava saxofone, clarinete, acordeom e teclado. Lembro de quando ele me pôs no colo e pediu que eu tocasse o acordeom. “Você tem ritmo. Vou botar você para estudar música”, ele disse. Eu tinha 7 anos. O saxofone chegou às minhas mãos de forma natural: como a banda estava precisando de um saxofonista, o maestro escolheu o instrumento por mim. Ele acertou.


(publicada parcialmente no “Guia da Folha – Livros, Discos e Filmes”, em 28/08/2009)



Terence Blanchard: trompetista volta ao país com repertório do novo "Choices"

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Caso raro na cena musical de hoje, o trompetista norte-americano Terence Blanchard é tão bem sucedido como jazzista, quanto é respeitado como autor de mais de 40 trilhas sonoras para o cinema – grande parte delas compostas para filmes de Spike Lee, como “A Última Noite” (25th Hour), “O Plano Perfeito” (Inside Man) ou “Malcolm X”. Seu crescente prestígio ajuda a explicar o fato de suas vindas ao Brasil serem mais freqüentes, nos últimos anos. Desta vez ele se apresenta pela série Jazz All Nights, dias 9 e 11, no Bourbon Street, em São Paulo.

Comparações nem sempre são justas, mas é difícil não lembrar que Blanchard, ao contrário de seu conterrâneo e também trompetista Wynton Marsalis (ambos têm 47 anos), voltou a se radicar em New Orleans depois que sua cidade quase foi destruída pelo furacão Katrina, em 2005. Quem ouviu seu dramático álbum "A Tale of God's Will” (2007), percebeu seu profundo envolvimento emocional com essa tragédia.

Nesta turnê, Blanchard traz um repertório mais leve e dinâmico. À frente do quinteto que destaca Fabian Almazan (piano), Derrick Hodge (baixo) e Kendrick Scott (bateria), músicos que já o acompanharam na turnê de 2007, ele exibe faixas de “Choices”, seu álbum recém-lançado nos EUA. Jazz afinado com o seu tempo.

(Publicado parcialmente no “Guia da Folha”, em 4/09/2009)



 

Miles Davis: show na Alemanha, em 1987, mostra sua fase mais pop e eletrificada

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Melhor avisar logo de cara: o DVD "That's What Happened" (lançamento ST2/Eagle Vison) traz um show de Miles Davis (1926-1991), num ginásio de Munique (Alemanha), em 1987, que dificilmente vai agradar a seus fãs mais puristas, que preferem suas fases centradas no jazz acústico, seja o bebop dos anos 40, o cool da década de 50 ou as mesmo experimentações dos anos 60, em vez de suas incursões eletrificadas.

Aqui o trompetista norte-americano aparece num de seus períodos de maior popularidade à frente da banda que destaca o baixo elétrico de Darryl Jones, os saxofones de Kenny Garrett, a guitarra de Foley McCreary e os teclados de Adam Holzman e Bobby Irving. As releituras dos hits “Human Nature” (de Michael Jackson) e “Time After Time” (Cyndi Lauper) aproximaram Miles de um publico mais jovem, que cresceu ouvindo música pop. Outro sucesso do repertório desse show é "Tutu", tema que deu título a um de seus álbuns mais cultuados nesse período.

Comparada ao padrão atual dos DVDs, a qualidade das imagens deixa a desejar. Mesmo assim, a rara entrevista incluída como material extra, na qual Miles questiona o racismo e a atitude conservadora dos críticos, enquanto faz desenhos com canetas coloridas, pode interessar aos fãs de qualquer geração.

(resenha publicada parcialmente no “Guia da Folha – Livros, Discos & Filmes”, em 28/08/2009)


 

Yamandu Costa e Dominguinhos: saboroso encontro de gerações da música instrumental

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Anos atrás, uma parceria como esta pareceria improvável. Como imaginar que o jovem violonista gaúcho Yamandu Costa, conhecido na cena da música instrumental por seus improvisos exuberantes e repletos de notas, poderia se unir ao veterano pernambucano Dominguinhos, mestre da sanfona e discreto herdeiro de Luiz Gonzaga?

O próprio Yamandu relembra, em depoimento incluído neste DVD (lançamento Biscoito Fino), como ficou impressionado ao ouvir um solo sentimental e minimalista do sanfoneiro, evento que contribuiu para a formação da dupla, anos mais tarde.

Gravado no Auditório Ibirapuera, em 2007, este show reúne clássicos de diversos gêneros da música popular brasileira, do baião “Asa Branca” (Gonzaga e Humberto Teixeira) à bossa “Wave” (Tom Jobim), passando por choros (“Doce de Coco”, de Jacob do Bandolim; “Pedacinhos do Céu”, de Waldir Azevedo), valsas e canções sulistas de várias épocas (como a folclórica “Prenda Minha”). O humor de Yamandu e Dominguinhos, exibido entre alguns dos números musicais, só aumenta o prazer do espectador ao saborear este encontro.


(resenha parcialmente publicada no “Guia da Folha – Livros, Discos & Filmes”, em 28/08/2009)

Charles Mingus: concerto sinfônico em DVD exibe obra perdida do jazzista

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Este concerto, gravado em 3 de junho de 1989, em Nova York, é um dos eventos mais significativos dessa década, no universo do jazz. Afinal, tratava-se da estréia mundial de "Epitaph", obra orquestral de Charles Mingus (1922-1979), cujas partituras só foram reencontradas após sua morte. Regida pelo maestro Gunther Schuller, a pequena orquestra é uma seleção de craques do gênero, como George Adams e John Handy (saxofones), Wynton Marsalis e Randy Brecker (trompetes), Roland Hanna e John Hicks (piano), entre outros.

Não espere truques de câmera, entrevistas, nem qualquer material extra. O DVD (lançamento ST2/Eagle Vison) limita-se ao registro do concerto (com 2h10 de duração), que revela como o genial jazzista assimilou influências de eruditos do século 20, como Stravinsky, Bartok e Ravel. “Epitaph” soa mais próxima da música contemporânea do que do jazz transgressivo de Mingus, mas mantém a marca personalíssima de seu criador.

(resenha publicada no “Guia da Folha – Livros, Discos & Filmes”, em 28/08/2009)



 

"Cadillac Records": trilha sonora traz releituras de Muddy Waters, Etta James e Chuck Berry

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É compreensível que os criadores de “Cadillac Records”, filme que recupera a história do influente selo norte-americano de blues e rock’n’roll Chess Records, tenham preferido que os sucessos dessa trilha sonora fossem interpretados pelos próprios atores, em vez de dublados. Essa opção trouxe, sem dúvida, mais verossimilhança ao filme.

No entanto, é impossível não fazer comparações ao se ouvir as versões dos clássicos blues “I’m a Man” e “Hoochie Coochie Men” (hits de Muddy Waters, revivido por Jeffrey Wright no filme), das românticas baladas “At Last” e “I’d Rather Go Blind” (sucessos de Etta James, interpretada por Beyoncé) ou dos rocks “Nadine” e “Maybellene” (pérolas de Chuck Berry, recriado por Mos Def), entre outras. Por mais que os intérpretes e arranjadores tenham se esforçado no estúdio, as gravações originais sempre soarão melhores, mais convincentes.

Mesmo assim, quem não se importar com esse detalhe pode se divertir com os dois CDs dessa trilha sonora, lançada pela Sony BMG, que inclui algumas boas surpresas, assinadas pelo veterano bluesman Buddy Guy (em “Forty Days and Forty Nights”), pelo trompetista de jazz Terence Blanchard (“Radio Station”) e pelo cantor Raphael Saadiq, ex-integrante do trio Tony! Toni! Tone! (em Let’s Take a Walk”).

(resenha publicada parcialmente no “Guia da Folha - Livros, Discos & Filmes”, em 28/08/2009) 



 

"AfroBossaNova": Paulo Moura e Armandinho inserem ritmos afros em clássicos de Jobim

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A inusitada introdução de “Chovendo na Roseira”, faixa de abertura do CD que o clarinetista Paulo Moura e o bandolinista Armandinho gravaram ao vivo, em 2008, já antecipa as intenções desses mestres da música instrumental. Aqui não há lugar para versões convencionais. Nem o fato de as 11 composições gravadas em “AfroBossaNova” (lançamento Biscoito Fino) serem de Tom Jobim (1927-1994) impede a dupla de tratar esse material com muita liberdade, nos arranjos e improvisações.

A clássica “Águas de Março” é atravessada por um frenético batuque africano, que se transforma em maracatu, forró e carnaval baiano. A romântica “Luiza” ressurge em um inventivo solo a capela (sem acompanhamento) de Moura. O samba “O Morro Não tem Vez” abre espaço para a vibrante percussão de Giba Conceição, Gabi Guedes e Nei Sacramento. Sem falar nas citações insólitas que Moura e Armandinho fazem em vários momentos, durante seus solos. Homenagens musicais não precisam ser reverentes.

(resenha publicada no "Guia da Folha Livros, Discos & Filmes", em 28/08/2009) 


 

 

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